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Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e

ferramentas de investigação

Fabiany de Cássia Tavares Silva1

ORCID: 0000-0002-7106-690X

Resumo

Este texto expõe os fundamentos teóricos e as ferramentas de investigação de um

programa de pesquisas que toma, como objeto e fontes de estudos, documentos curriculares

(reconhecidos como currículo prescrito) produzidos para os espaços da educação básica,

nas etapas da educação infantil, ensino fundamental e na modalidade de educação especial.

Os fundamentos teóricos e as ferramentas de investigação não se constituem em uma

simples apresentação, mas no reconhecimento de seus papéis estratégicos na retomada

das discussões metodológicas sobre a comparação no desenvolvimento de pesquisas em

educação, bem como no registro dos resultados em uma escrita mais rigorosa e menos

híbrida, no campo dos estudos de currículos prescritos. Entendemos dar forma a uma versão

da comparação fortemente deslocada para um plano teórico e metodológico, nominada

estudo comparado. Tal plano inscreve-se em uma perspectiva local, isto é, determinada

por uma localização geográfica reconhecida pelos estados e municípios, na investigação

dos processos educativos e dos sentidos dos fenômenos curriculares nesses processos.

Utilizamos a noção de versão por recorrermos ao cruzamento da educação comparada,

da história comparada da educação e das ciências sociais comparadas. Em conclusão,

o estudo comparado sobre documentos curriculares explicita processos de relativização

cultural e ideológica no campo dos estudos curriculares, promotores de novas formas de

escrita de outra história sobre/da prescrição.

Palavras-chave

Estudo Comparado – Programa de Pesquisa – Documentos Curriculares – Currículo.

1- Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande (MS), Brasil. Contato:

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1678-4634201945193081

SEÇÃO: ARTIGOS

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Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Fabiany de Cássia Tavares SILVA

Comparative study: theoretical foundations and

research tools

Abstract

This text exposes the theoretical foundations and the research tools of a research program

that takes, as an object and sources of studies, curriculum documents (recognized as

prescribed curriculum) produced for the spaces of basic education, in the stages of early

childhood education, elementary school and in the special education modality. The theoretical

foundations and the research tools do not constitute themselves in a simple presentation,

but in the recognition of their strategic roles in the resumption of the methodological

discussions about the “comparison” in the research development in education, as well as

in the results record in a more rigorous and less hybrid writing, in the field of the studies

of prescribed curricula. We comprehend to form a comparison version highly shifted to

a theoretical and methodological plane, named comparative study. Such a plane is part

in a local perspective, that is to say, determined by a geographical location recognized

by the states and municipalities, in the investigation of the educational processes and

of the meanings of the curricular phenomena in these processes. We use the notion of

version by resorting to the intersection of comparative education, comparative history

of education, and comparative social sciences. In conclusion, the comparative study on

curriculum documents clarifies processes of cultural and ideological relativization in the

field of curricular studies, promoting new forms of writing of another history about / of

the prescription.

Keywords

Comparative study – Research program – Curriculum documents – Curriculum.

Introdução

Este texto expõe os fundamentos teóricos e as ferramentas de investigação de um

programa de pesquisas que toma, como objeto e fontes de estudos, documentos curriculares

(reconhecidos como currículo prescrito) produzidos para os espaços da educação básica,

nas etapas da educação infantil, ensino fundamental e na modalidade de educação

especial. Fontes e objetos, por serem:

[...] entendidos como impressos, que selecionam, legitimam e distribuem conhecimentos, mobilizam

discursos na produção das verdades do processo de escolarização. E, nesse sentido, operam na

seleção e distribuição dos conhecimentos que chegam às escolas e no modo como estes devem ser

recebidos. Esse entendimento permite a análise de sua materialidade, isto é, suporte material da

3Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

construção de práticas nos espaços educativos. […] particularmente escritas e dialógicas, ocupam,

de um lado, espaço privilegiado de reconstituição das ideologias ou mentalidades educativas

subtraídas a uma projeção particular, oficial; e, de outro, diferenciam-se de outras fontes por

contemplar propósito muito particularizado, isto é, o cumprimento de funções determinadas

pela difusão e o desenvolvimento prático dos processos de escolarização, com base em uma rede

de intertextualidades que se alimenta da política educativa ao desenvolvimento dos processos

educativos nas escolas e nas salas de aulas, respectivamente. (SILVA, 2016, p. 214).

Os espaços são apreendidos de duas formas: a) como instâncias de formação escolar,

com objetivos educativos explícitos e ação intencional institucionalizada, estruturada

e sistemática; e b) como uma possibilidade de produção, seleção e distribuição do

conhecimento nas estruturas curriculares do ensino tradicional.

Os fundamentos teóricos e as ferramentas de investigação, nos limites deste texto, não se

constituem em uma simples apresentação, mas no reconhecimento de seus papéis estratégicos

na retomada das discussões metodológicas sobre a comparação no desenvolvimento de

pesquisas em educação, bem como no registro dos resultados em uma escrita mais rigorosa

e menos híbrida2, no campo dos estudos de currículos prescritos. Tal escrita é apreendida

como um ensaio de crítica ao questionamento acerca da importância da pesquisa com/sobre

o currículo prescrito, visto que ele parece circunscrever-se à simples imposição dos grupos

dominantes sobre os grupos dominados e menos favorecidos da sociedade.

Dessa forma, desconstruímos certa configuração discursiva acerca da relevância de se

pesquisarem documentos curriculares prescritos para o sistema formal de ensino, uma vez

que materializam projetos de escolarização, transmitem conhecimentos, socializam valores,

normas e padrões culturais do grupo ou da classe dominante, isto é, ‘‘um conteúdo prefigurado,

previsto e controlado por uma força externa preexistente’’ (WILLIAMS, 2010, p. 45).

Dito de outro modo, pesquisamos documentos curriculares prescritos, interessados

em reafirmar que a relação entre conhecimentos, escolas e indivíduos, descritos em seu

interior, também informa sobre a ‘‘inesgotabilidade da prática e da intenção humana’’

(WILLIAMS, 2011, p. 59).

No processo de objetivação dessa reafirmação, circunscrevemos os documentos

curriculares na perspectiva de “documentos-problema”3 que, de algum modo, ampliam as

possibilidades de identificação dos possíveis contrastes (e também dissensos) na apreensão

da prescrição, como parte de nossa noção de liberdade contingenciada no campo dos

estudos curriculares.

2- Tal escrita é tomada como enfrentamento de análises que se colocam intencionalmente contrárias à noção de método e ao ordenamento

sistemático da exposição. Para tanto, aproximamo-nos dos termos propostos por Bakhtin (2003), de uma possível interpenetração de diversas

esferas associadas a determinados gêneros do discurso que, ao se imbricarem, geram complicações para a sua definição, assim como para o

claro estabelecimento de categorias de leitura.

3- Referência direta à história-problema, pela possibilidade de recusa da forma narrativa, porque exige a “conceptualização dos objetos de sua

investigação”, a sua integração “numa rede de significações”, tornando-os, portanto, “se não idênticos, pelo menos comparáveis num dado período

de tempo” (FURET, s./d., p. 84).

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Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Fabiany de Cássia Tavares SILVA

Fundamentação do exercício de exposição das

ferramentas de investigação

No meio acadêmico e nas pesquisas em educação, o reaparecimento dos estudos

comparados, na última década do século XX, parece estar centralmente determinado pela

investigação da política educacional, com diferentes propósitos e alinhamentos teórico-

metodológicos. Tal centralidade já se verificava nos séculos anteriores, com o uso precoce

de diários de viagem como meio de troca de informações sobre práticas educativas, bem

como o envio de funcionários do governo e especialistas em educação para outros países,

a fim de observar outros sistemas educacionais, com o objetivo de prestar apoio a um

sistema já existente.

Na proposição de melhoria dos sistemas educativos, encontramos em Hans (1961)4

observações acerca das condições para o desenvolvimento de tal processo, fundado na

concepção de estado nacional e na compreensão das diferenças entre valores existentes

nas mais diversas constituições sociais, culturais, geográficas e sobre as tradições das

crenças da Europa, que influenciam processos educativos e formas de institucionalização.

Tais constatações acerca da educação comparada preocupam-se com as configurações

existentes no período pós-guerra, desde as formações dos Estados e suas responsabilidades

na proposição de novas políticas públicas e as relações entre essas políticas e os sujeitos.

No Brasil, o conhecimento das comparações de Hans (1961) está acompanhado

da leitura da obra de Lourenço Filho5, no estudo das súmulas descritivas de sistemas de

ensino de dez países, apontando diferenças e semelhanças constitutivas. As dimensões

analíticas dessas súmulas são objetos de uma compreensão mais vinculada à psicologia.

Enfatiza-se o que se identifica como os fundamentos da educação comparada, isto é,

conceito, método e tendências.

Partimos do pressuposto de que tanto o pensamento de Hans quanto o de Lourenço

Filho, na escrita e na divulgação de suas respectivas proposições de estudos comparados,

contêm a intencionalidade de delimitar o campo disciplinar da educação comparada e,

consequentemente, elencar referências racionalistas para os estudos educacionais.

A essas perspectivas de comparação, consideradas consensualistas por perenizarem

o poder de controle dos países desenvolvidos, geralmente as antigas potências coloniais,

sobre os países menos adiantados, Carnoy (1974), Noah (1984) e Malet (2004) propõem o

comparatismo crítico como uma ruptura ideológica. Esses estudos estabelecem-se como

uma reação contra:

a) as condições objetivas e fechadas dos fenômenos educativos e culturais que o funcionalismo

tende a promover;

b) as perspectivas de evolucionismo social que, cegadas por uma concepção continuísta da

história e uma abordagem pragmática dos fatos educativos, tendem a descuidar dos processos

de mudança social;

4- O livro foi publicado no Brasil, em 1961, pela Companhia Editora Nacional, baseado na 2ª edição inglesa de 1951.

5- Educação Comparada e Testes ABC, publicado pela Editora Melhoramentos em 1961.

5Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

c) o consensualismo, que impede a empreitada científica de questionar seus fins, o que constitui o

melhor meio de elidi-los, sobretudo quando os espaços de intervenção ultrapassam as fronteiras

nacionais. (MALET, 2004, p. 1311).

No atual contexto, a perspectiva parece incidir sobre diferentes unidades e objetos,

determinados pela cultura e pelo discurso, o que, para Schriewer (2009), é indicador de

que a análise:

[...] transforma-se em argumento explanatório na medida em que ela consegue identificar por

meio de reconstruções conceitualmente informadas, soluções de problemas historicamente

realizados como realizações particulares daquilo que nos diferentes cenários – ou configurações

– socioculturais é estruturalmente possível. (SCHRIEWER, 2009, p. 95).

Para compreendê-la dessa forma, temos assistido a um processo de construção de

configurações que colocam em tela a perspectiva do cruzamento entre teorias do conflito

e do consenso, abordagens descritivas e conceituais (cf. NÓVOA, 2009), teoria da reflexão

ligada à reforma e teoria científica ligada à compreensão das diferenças entre sistemas

educativos (MADEIRA, 2009) e/ou diferenças e semelhanças no encontro do sentido para

os processos educacionais (FERREIRA, 2009).

O que parece mais significativo, nesse processo, é a capacidade de o estudo

comparado instituir-se em uma pluralidade de perspectivas, abordagens e metodologias

e, ao mesmo tempo, indicar limites para a compreensão dos fatos ou dos fenômenos

educativos que compara, impondo-se como relevante instrumento de conhecimento e

análise da realidade educativa. No caso dos limites, as críticas estão constituídas a partir

de um processo que identifica

A implantação de toda uma série de mecanismos para corrigir e pausar o fluxo de tempo, de modo

que um objeto de corte transversal possa ser estabilizado e discernido - para ser equilibrado com

o reconhecimento de que esse trabalho analítico ocorre dentro desse fluxo contínuo de tempo,

um fluxo que é marcado por transformações, continuidades e descontinuidades entre passados,

presentes e futuros possíveis.6 (SOBE, 2013, p. 95, tradução nossa).

Na esteira das críticas, deparamo-nos com a proposição de Warde (2013) acerca do

conceito de rede intelectual

[...] como alternativa à ideia de influência e a aplicação de procedimentos resultantes dessa

utilização, o que implica, pelo menos, relações unidirecionais, constantes no espaço e no tempo,

entre indivíduos, grupos e até mesmo entre sociedades inteiras; mais do que isso, a ideia da

influência trazida a partir das ideias mais antigas baseia-se no pressuposto (psicológico) de que

6- “[…] the deployment of a whole series of mechanisms to fix and pause the flow of time so that a cross-sectional object can be stabilized and

discerned—all to be balanced with the recognition that this analytic work takes place within this ongoing flow of time, a flow that is marked by

transformations, continuities and discontinuities between possible pasts, presents and futures” (WARDE, 2013, p. 95).

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Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

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um polo é superior ao outro. O primeiro polo é adulto, desenvolvido e civilizado e o outro é

infantil, subdesenvolvido e primitivo. (WARDE, 2013, p. 113, tradução nossa)7.

Tal alternativa parece ser ignorada pelos pesquisadores em educação que utilizam a

comparação, uma vez que, nos estudos de transferência, permanece a ideia de influência8,

afastando-os da originalidade. Parte dessa permanência está delineada na premissa de que

o pensamento atua sobre o pensamento, a maneira pela qual os objetos se transformam

mutuamente, o que cada um deles instiga analiticamente e o que cada um deles recebe de

análise, ou melhor, o efeito do perpétuo intercâmbio entre a universalidade e as particularidades.

A escrita histórico-social do currículo passa a ser tomada como parte de um universo

discursivo que existe, conforme Peters (2006), sob duas formas necessariamente articuladas:

a) como um espaço objetivamente estruturado de relações entre agentes diferenciadamente

posicionados segundo uma distribuição desigual de recursos materiais e simbólicos, isto é,

de capitais múltiplos, que operam como meios socialmente eficientes na concorrência pela

apropriação de bens materiais e ideais escassos, ainda que bastante diversificados, nos casos

das sociedades altamente diferenciadas, em vários “campos” de atividade que caracterizam o

Ocidente moderno;

b) como um conjunto de esquemas simbólicos subjetivamente internalizados (via socialização) de

geração e organização da atividade prática mental e corporal dos agentes individuais, esquemas

que tomam a forma de disposições ou modos potenciais socialmente adquiridos e tacitamente

ativados de agir, pensar, sentir, perceber, interpretar, classificar e avaliar. (PETERS, 2006, p. 53-54).

Assim, criam e recriam lugares, estabelecendo um mundo educacional, econômico

e social por meio de um conjunto organizado de significados e práticas, relacionado a um

processo central, efetivo e dominante desses significados, desses valores e dessas ações,

vividas no e pelo acesso ao conhecimento.

Do discurso e da prática de comparação

O diálogo com as humanidades, particularmente a História e as Ciências Sociais,

tem configurado o que chamamos de guinada crítica, uma vez que excedemos o campo da

educação comparada. Tal ampliação está fundada na perspectiva de que a proposição de

qualquer estudo, em comparação, necessita considerar, na explicação de qualquer fato ou

fenômeno educativo, as relações com as convicções políticas, econômicas e/ou filosóficas

da sociedade a que servem, no sentido histórico do período em que se deram.

Diante disso, temos constituído discursos e práticas de pesquisas alimentadas por

escolhas teórico-metodológicas, que assumimos como uma versão intitulada estudos

7- “[…] which implies, at least, unidirectional relations, steady in space and in time, between individuals, groups and even entire societies; more

than that, the idea of influence brought from the most ancient history of ideas is based on the (psychological) assumption that one pole ascends

the other. The first pole is adult, developed, and civilized, and the other one is infantile, underdeveloped, and primitive” (WARDE, 2013, p. 113).

8- Eliot (1989) produziu reflexão sobre os conceitos de influência, para a qual delineava a ideia de que tradição não é reprodução, mas uma

representação dialética, que envolve um senso histórico permeando o passado e o presente.

7Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

comparados, fortemente deslocada para um plano metodológico. Tal plano inscreve-se

em uma perspectiva local, determinada por uma localização geográfica reconhecida pelos

estados e municípios, na investigação dos processos educativos e dos sentidos dos fenômenos

curriculares nesses processos.

Utilizamos a noção de versão por recorrermos ao cruzamento da educação

comparada, da história comparada da educação e das ciências sociais comparadas. A

educação comparada é tomada como resultado de um duplo movimento. De um lado, é

marcado por uma presença crescente das questões educativas na criação de identidades

escolares, definidas não tanto sob uma perspectiva geográfica, mas no sentido de pertença

a certas comunidades discursivas. De outro, deslocando-se da referência tradicional

interpaíses para dimensões simultaneamente intra e extranacionais, isto é, centradas nas

comunidades disciplinares, formadas por agentes locais e nos processos de regulação em

níveis nacional e internacional.

Apreendemos o primeiro movimento como produto de interesses político-educativos,

apresentados por repertório de argumentos da ordem da globalização, da mundialização

e da internacionalização, para os quais as análises dos contextos educativos produzem os

desenvolvimentos institucionais desejados. A comparação justifica reformas educativas,

inovações curriculares e modernização do capital humano.

As inovações, hipoteticamente organizadas com as reformas educacionais,

desenvolvidas no período de 1980 e 1990, destacam o cunho conservador, que combate

o declínio educacional e social promovido por educações progressistas (APPLE, 2005).

Tais reformas estão assentadas na perspectiva de libertar a escola para a sua entrada

no mercado competitivo e, ao mesmo tempo, recompor a cultura tradicional e revisitar

valores considerados fundantes da sociedade (ética, moral, disciplina). Afasta-se, assim,

do Estado, a unidade mais comum de análise e recupera-se a centralidade de um Deus

nos direcionamentos da vida cotidiana, inclusive no espaço escolar, aguçando estratégias

de influências recíprocas e limítrofes entre contextos religiosos, de controle do processo

educativo, por meios mais rigorosos de regulamentação e avaliação.

Dessa maneira, as reformas inauguram um novo momento para o desenvolvimento

curricular9, delineado por novos formatos para os processos de seleção e distribuição

de conhecimentos, ancorados em decisões macropolíticas influenciadas pela lógica do

mercado do mundo globalizado. As decisões macropolíticas repercutem em micropolíticas:

“[...] que se realizam no cotidiano das escolas, nas salas de aula, nas relações entre os

diferentes sujeitos que interagem no espaço escolar e no espaço circundante à escola”.

(APPLE, 2005, p. 10).

O desenvolvimento curricular, sob a perspectiva prescritiva, parece reorganizar

o processo de releitura, ou modernização, da teoria do capital humano, ancorado na

lógica da formação de sujeitos flexíveis para a empregabilidade. Tal modernização alça

a educação, ou o processo de escolarização, ao lugar de protagonista na formação do

cidadão eficiente e competente.

9- No caso brasileiro, materializado por meio da implantação de uma política curricular, objetivada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para a

Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) e Diretrizes Curriculares para Educação Básica, com documentos oficiais

orientados para o trabalho escolar.

8

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Fabiany de Cássia Tavares SILVA

As investigações que desenvolvemos, a partir da educação comparada, buscam

instrumentos analíticos que permitam, além da hipotetização da relação entre o poder

e o conhecimento, como expressão da educação do final do século XX e início do

XXI, a apreensão do processo de autolegitimação do conhecimento escolarizado e do

poder educativo. Isto é, o poder reconhece as formas de produção e disseminação do

conhecimento e utiliza-o para o seu exercício.

Além disso, o conhecimento propicia o exercício do poder pela perspectiva da sua

capacidade de resolução dos problemas, tensões e conflitos sociais. Esse exercício define

os valores distintivos, cuja especificidade se concretiza no frequente consumo de saberes

e de práticas culturais em seus diversos segmentos de produção, entre eles, a escola. Dito

de outra forma, embora o conhecimento escolar seja disponibilizado aos diferentes grupos

sociais, o acesso a ele não implica a igualdade ou a qualidade de consumo ou uma plena

compreensão dos conteúdos que agregam.

Dessa forma, concebemos que:

[...] a ideia de conhecimento poderoso possa ser o início de um recurso para a comunidade

educacional tanto na construção de novos currículos, em nível nacional e escolar, como também

para persuadir os governos de todos os partidos sobre as condições necessárias para que o

princípio do “direito ao conhecimento para todos” se torne realidade. (YOUNG, 2016, p. 4).

Nesse ideário, a reinstituição de um passado se faz necessária, sob a perspectiva da

história comparada da educação ou, como diriam Eckstein e Noah (1969), a insistência na

indagação do contexto histórico-cultural de cada sistema educativo.

A busca da inteligibilidade que almejamos com nossas práticas assenta-se na

reconciliação entre a história e a comparação, no esforço de organizar uma investigação

baseada em fundamentos históricos, pelos referentes do método histórico. Esse método tem

levado-nos a buscar as diferenças e semelhanças do/no particular, a partir dos processos

históricos amplos (compreender a história como processo), e reconstruí-las como parte

de uma determinada realidade, que é sempre complexa e aberta às transformações, sob a

ação dos sujeitos sociais (utilizando a história como método).

Contudo, a busca das diferenças e semelhanças, como adverte Groux (1997),

não caminha para a consideração dos conceitos como universais, ou a coleta de dados

apartada da análise que os relacione ao seu contexto. O visível e o explícito constituem

somente uma parte da realidade; a história da educação comparada, como modalidade

historiográfica, incursiona pelo exame recíproco de dois ou mais recortes de tempo e

espaço de produção e consumo do produto (nesse caso, os documentos curriculares).

A esse propósito, acessamos as ideias de Zimmermann e Werner (2003) acerca da

História Cruzada, que:

[...] ambiciona tratar objetos e problemáticas específicas que escapam às metodologias

comparatistas e aos estudos de transferências. Ela permite apreender fenômenos inéditos a

partir de quadros renovados de análise. Assim fazendo, ela fornece a ocasião de sondar, por um

viés particular, questões gerais como escalas, categorias de análise, relação entre sincronia e

9Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

diacronia, regimes de historicidade e de reflexividade. Enfim, ela coloca o problema de sua própria

historicidade a partir de um triplo procedimento de historicização: do objeto, das categorias de

análise e das relações entre o pesquisador e o objeto. (ZIMMERMANN; WERNER, 2003, p. 90-91).

Ao anotarmos esse procedimento de historicização, voltamo-nos à ferramenta

metodológica proposta, para a qual nossas fontes e objetos materializam um campo novo

de análise, isto é, não só da prática de comparação, mas daquilo que toma forma nas

discussões, tidas como necessárias, sobre o currículo, seus estudos e suas verdades. Isto

é, como atuam os sistemas de ensino, como são influenciados pelas políticas educativas

nacionais, internacionais e locais, como influenciam todas essas políticas e como reagem/

adaptam-se às mudanças.

Ressaltamos que, na busca por tais discussões, não nos aproximamos somente da

história, sob a perspectiva dos setores dominantes, tampouco incursionamos pela busca

do hegemônico ou do uniforme. Ao contrário, interessa-nos outra história. Ou seja, não se

trata de reconstruir um outro currículo, mas dar lugar ao outro do próprio currículo. Tal

interesse apoia-se na premissa da figuração, a qual, segundo Elias (1980, p. 142):

[...] serve como instrumento conceitual para modificar a visão antagônica e contraposta

de indivíduo e sociedade; entendido como um padrão mutável no jogo das relações, cuja

interdependência entre os atores sociais, forma um entrelaçamento flexível e com tensões.

Isso favorece o reconhecimento da relação entre indivíduo e sociedade como uma

relação reciprocamente determinada e determinante de complexos processos sociais que

definem, sob uma perspectiva de longa duração, a direção das diferentes sociedades

humanas.

Ao introduzirmos o conceito de figuração, escapamos das dicotomizações que opõem

indivíduos e sociedades, ao mesmo tempo em que expomos a importância de transitar por

três tempos historiográficos: o tempo das mudanças socioeducacionais ou curriculares de

longa duração; as tendências de médio prazo, que definem um determinado período da

história do currículo, à época; e o curto prazo, que determina as escolhas atuais.

Assim, aproximamo-nos do processo de apreensão das dinâmicas, das transições e

das relações socioculturais como diferentes textos, que levam à compreensão dos discursos

que alimentam situações de dependência e lógicas de discriminação construtoras de

maneiras de pensar e de agir. Esse exercício, próprio das ciências sociais comparadas,

vincula-se a uma espécie de Sociologia Histórica, apontada por Pereyra (1990) como um

dos instrumentos promissores na construção de conhecimento crítico acerca da realidade

educacional.

A realidade educacional em comparação operacionaliza a descoberta, ou não, de

regularidades, a percepção de deslocamentos e transformações, a construção de modelos e

tipologias e a identificação de continuidades e descontinuidades, semelhanças e diferenças,

explicitando as determinações mais gerais que regem os fenômenos sociais.

Tal descoberta, nos limites da descrição do que chamamos versão particular, salienta

as características do que pretendemos em uma ferramenta de investigação, assumidamente

10

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Fabiany de Cássia Tavares SILVA

uma metodologia mista, mas que ainda incorre na tentativa de superação das críticas

apresentadas às pesquisas que utilizam a comparação como método, a saber: mecanismos

que corrigem e interrompem o fluxo de tempo para que um objeto de corte transversal

possa ser estabilizado e discernido (SOBE, 2013) e/ou a manutenção da ideia de influência

(WARDE, 2013).

Parece consenso entre os autores da educação, história da educação e ciências sociais

comparadas, a ideia de que, para a construção do conhecimento considerado científico,

a comparação é fundamental e inerente ao processo epistemológico. Isto é, não seria

possível produzir conhecimento sem o emprego da comparação, pois:

[...] desenvolvemos nossas interpretações tendo em mente uma série de problemas específicos

ou de questões pré-existentes – não de dados – às quais queremos responder. A iluminação

da resposta – ou das respostas – não é o resultado de um ‘experimento’ nem das propostas

de interpretação e explicação que fazemos, senão que ‘experimento’ e ‘teoria’ se constroem

mutuamente. (PEREYRA, 1990, p. 45, tradução nossa).10

Dessa forma, estamos diante de uma nova epistemologia do conhecimento, de

cunho sócio-histórico, que define perspectivas de pesquisa centradas não apenas na

materialidade dos fatos educativos, mas também nos mercados simbólicos que os

descrevem, interpretam e localizam em um dado espaço-tempo (cf. POPKEWITZ, 1998).

Tais mercados são habitados por grupos que produzem e/ou fazem circular discursos que

podem ou não implicar uma política de não isenção na escrita da história, o que, para

Fendler (2013), significa que são dadas, aos historiadores educacionais,

[...] a oportunidade e a obrigação de questionar todas as variáveis como potenciais candidatas

para a análise historiográfica minuciosa. Afinal, como podemos isentar de nossas investigações

históricas as ferramentas históricas de pesquisa e as linguagens que utilizamos para escrever

a história? Todos os nossos cuidados metodológicos, processos de avaliação, classificações

analíticas e tradições narrativas são infestadas por, vinculadas a, e (até certo ponto) dependentes,

implacavelmente, das flutuantes contingências históricas de tempo, espaço e poder. (FENDLER,

2013, p. 228, tradução nossa)11.

O que se deseja, em última instância, é a possibilidade de “fazer ver e fazer crer”

como parte da construção da realidade, ou melhor, do poder simbólico (BOURDIEU, 1989).

Essa possibilidade per se gera tensões internas, pois interessa, sob essa perspectiva, a

percepção que os agentes sociais têm do mundo social. Para eles, a nomeação contribui

10- Elaboramos nuestras interpretaciones teniendo en mente una serie de problemas específicos o de cuestiones preexistentes -no de datos- a

las que queremos dar respuesta. La iluminación de la respuesta -o de las respuestas- no es el resultado de un ‘experimento’ ni de las propuestas

de interpretación y explicación que hagamos, sino que ‘experimento’ y ‘teoría’ se construyen mutuamente. (PEREIRA, 1990, p. 45).

11-- “[...] an opportunity and obligation to question all variables as potential candidates for historiographical scrutiny. After all, how can we exempt

from our historical investigations the very historical research tools and languages we use to write history? All of our methodological safeguards,

processes of evaluation, analytical classifications, and narrative traditions are haunted by, tied to, and (to some extent) dependent upon, relentlessly

fluctuating historical contingencies of time, space, and power”. (FENDLER, 2013, p. 228).

11Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

para constituir a estrutura desse mundo, de uma maneira um tanto mais profunda quanto

mais amplamente reconhecida (isto é, autorizada).

A investidura consiste em sancionar e em santificar uma diferença, fazendo-a conhecer e

reconhecer, fazendo-a existir enquanto diferença social, conhecida e reconhecida pelo agente

investido e pelos demais. (BOURDIEU, 2008, p. 99).

Ademais, os espaços-tempos históricos que materializam a diferença são abordados

como portadores de uma lógica própria, uma lógica social que os transforma em um lugar

em que se manifestam as intenções humanas. Se antes, no modelo marxista, a sociedade

constituía o espaço de referência, no modelo liberal parece não se configurar como tal,

uma vez que se torna um componente, entre outros, de um sistema global de regulação do

capital financeiro, intelectual, cultural e educacional (cf. CASTELLS, 1996).

No âmbito dos estudos comparados, especialmente os envolvidos com o campo

educacional, questionamos a validade da materialidade das diferenças, principalmente

porque o estabelecimento de diferenças e semelhanças sobre contextos históricos marcados

por características econômicas, sociais, políticas e culturais distintas tem-se mostrado um

procedimento de pesquisa muito pouco fecundo na produção de conhecimento.

Em primeiro lugar, ancoramo-nos nas categorias espaço e tempo como pressupostos

dos estudos de caráter histórico, por considerarem os contextos específicos nos quais

transcorrem os seus respectivos processos educativos. Outro cuidado é não buscar, pelo

estudo do outro, soluções para problemas que se enfrentam, nos limites das nossas

proposições de análise, isto é, neste ou naquele estado ou município, ou considerar que

o outro seja melhor. Isso porque as interdependências mútuas acabam por definir a

especificidade e o nível de complexidade das figurações que os indivíduos e/ou grupos

sociais, pertencentes a limites geográficos, estabelecem entre si, exprimindo os nexos das

diferentes tensões, em constante mudança.

Da ação política aos valores e às explicações sobre os documentos curriculares,

essa ferramenta metodológica evidencia como eles promovem a reinstituição de práticas

de ensino e aprendizagem, como parte de um instrumental de processos regulatórios

específicos, que adquirem sentido nos desenhos das reformas curriculares. Reformas

propostas pelo Estado aos entes federados, a partir de mecanismos de interdependência e

inter-relação que sustentam um novo padrão de escolarização.

Áreas de comparação: unidades de análise

A procura por inteligibilidades do estudo comparado, nos limites desta versão,

assenta-se, além do cruzamento entre educação e história-social, no esforço de organizar

uma abordagem comparada baseada em fundamentos históricos que representem, segundo

Schriewer (1992), o melhor instrumento para a separação analítica entre o geral e o

particular, necessária a uma interpretação histórica portadora de sentido.

Assim, demos forma às áreas de comparação eleitas por determinação de sua

configuração, intimamente ligada ao movimento de investigação conjuntural e estrutural

12

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Fabiany de Cássia Tavares SILVA

dos documentos curriculares, que parecem fundamentar às prescrições, seguidas de

orientações pedagógicas.

Entendemos a investigação conjuntural ligada ao aprendizado das dificuldades

expressas pelas histórias de cada região do país, alimentadas pelo reconhecimento dos

conflitos, interesses e anseios ligados à arquitetura curricular, a partir de ideias reformistas

dos anos 1990, com a qual o sistema educativo parece assumir novas finalidades em

novas práticas e contornos destinados ao processo de distribuição de conhecimentos. Em

relação à investigação estrutural, a publicação do conjunto de documentos curriculares

(parâmetros, referenciais e diretrizes) assume extrema relevância, sob a perspectiva de

organização e qualificação dos processos de escolarização ou de acesso aos conhecimentos

considerados valiosos.

Contudo, retomamos duas perguntas enunciadas por Valensi (1990, apud

HAUPT, 1998, p. 211): Que escala de comparação adotar? E por que comparar? Nessa

retomada, exploramos uma segunda razão, para a projeção das áreas de comparação,

no caso deste estudo, uma vez que não se limitam à descrição, mas intencionam expor

argumentos relacionados aos conceitos teóricos, hipóteses ou modelos explanatórios,

pelos quais escolhemos estabelecer a comparabilidade entre os movimentos investigativos

anteriormente referendados.

Para o encontro de respostas a tais questões, desenvolvemos procedimentos de

categorização e análise de temas identificados, com o propósito de revelar os múltiplos

enfoques e perspectivas dos documentos estudados. A primeira das tarefas, organizada

pelo procedimento de categorização, é o exame das informações disponíveis, a partir

do exercício de rastreamento, e a identificação das informações sobre as condições de

produção12, não limitadas a uma série de fatos observáveis, mas idealizadas de forma

elaborada, segundo a qual, na ação da comparação, se detectam modelos de explicação.

Tomamos esses modelos como expressão dos conceitos de campo e habitus. O campo

é espaço de relações objetivas, que têm lógica própria, “cuja necessidade se impõe aos

agentes que nele se encontram envolvidos” (BOURDIEU, 2008, p. 50). O autor continua

afirmando:

[...] no interior do qual os agentes se enfrentam, com meios e fins diferenciados conforme

sua posição na estrutura do campo de forças, contribuindo assim para a conservação, ou a

transformação de sua estrutura (BOURDIEU, 2008, p. 50).

As áreas de comparação, quando eleitas, são compreendidas na inter-relação dos

campos educativo, social, simbólico e cultural. Assim, encontram-se inseridas em um

espaço relacional permeado por lutas de conservação e transformação das suas estruturas.

São encaradas como estratégias e táticas e não apenas como expressão da repetição de

um discurso simplesmente reproduzido, mas como conjunto de disposições que vem sendo

12- As recuperações históricas dos anos 1980 e 1990 apontam uma latente preocupação do governo brasileiro com a economia nacional,

como consequência do processo de pertencimento aos padrões dos processos de globalização ditados pelas economias de primeiro mundo, para

os quais o crescimento econômico era central.

13Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

recriado, atualizado e, portanto, continuamente re-produzido (produzido de novo) no

decorrer dos estudos sobre documentos curriculares.

O conceito de campo está ligado ao de habitus, definido como:

[...] sistemas de disposições duráveis, estruturas estruturadas predispostas a funcionar como

estruturas estruturantes, isto é, como princípio gerador e estruturador das práticas e das

representações que podem ser objetivamente “reguladas” e “regulares” sem ser o produto da

obediência a regras, objetivamente adaptadas a seu fim sem supor a intenção consciente dos fins

e o domínio expresso das operações necessárias para atingi-los e coletivamente orquestradas, sem

ser o produto da ação organizadora de um regente. (BOURDIEU, 1983, p. 61, grifos no original).

O conceito de habitus mostra-se como uma ferramenta teórica capaz de responder

à questão central em relação às áreas de comparação, isto é, disposições estruturadas e

estruturantes, que atuam como matrizes de percepção e ação, continuamente recriadas no

decorrer das análises, constituindo doxas (um ponto de vista particular, o ponto de vista dos

dominantes, que se apresenta e se impõe como ponto de vista universal) e nomos (avalia,

rege e regula o que se faz), que orientam as análises curriculares. Dessa forma, as áreas de

comparação podem ser concebidas como um habitus incorporado pelos agentes do campo

em questão, que orienta as estratégias dos agentes nas relações de força desse campo.

As áreas de comparação passam a ser tomadas como parte da caracterização de

um universo discursivo que, de um lado, representa a posição diferençada dos agentes

segundo uma distribuição desigual de recursos materiais e simbólicos e, de outro, um

conjunto de esquemas simbólicos, que tomam a forma de disposições ou modos potenciais

socialmente adquiridos e tacitamente ativados de interpretar, classificar e avaliar.

Dessa forma, tornam-se estratégias e táticas no encontro de respostas às necessidades

criadas pelos discursos do outro, aqui, especificamente, o do Estado que, em resposta aos

Organismos Internacionais e às necessidades impressas em seus relatórios, publica Diretrizes,

Parâmetros e/ou Orientações curriculares, entendidas como documentos curriculares.

Isso, per se, cria o argumento da comparação, que equivale ao enriquecimento de sua

consistência lógica e empírica para transformar as análises e atender a um recorte mais

específico, as microrrealidades ou dimensões culturais, para a superação do predomínio

do fator econômico na construção dos documentos curriculares.

Nexos possíveis na pesquisa com documentos

curriculares

A proposta de utilização dos estudos comparados como ferramenta de investigação

não se assenta em uma pretensão de busca de diferenças e semelhanças entre os

universos de análise, ao mesmo tempo que não incorre em microrrealidades educativas,

na perspectiva de construir macro conclusões, neste caso, de estudos curriculares.

Isso porque nos aproximamos de contextos históricos distintos, de contradições e

complexidades inerentes a esses contextos, que sustentam a comparação como uma

espécie de renovação metodológica.

14

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Fabiany de Cássia Tavares SILVA

Renovação, aqui, significa ancorar-se na determinação de que os estudos comparados

são interpretativos, voltados para uma defesa ideológica, baseados em problemas, incorrendo

na busca por resultados e respostas às demandas socioeducativas. Operamos com:

[...] dois tipos de questões norteadoras das análises buscadas, de um lado, de que forma a lógica

de dominação social na sociedade avançada e os mecanismos por onde ela se disfarça estão

profundamente ancorados nas especificidades do sistema de classes, da cultura e da diferença?;

e de outro, como o currículo constituído como um dispositivo com marcas de controle, de

reprodução e de promessas de inovação, pode responder contra hegemonicamente às necessidades

demandadas pela estrutura social? (SILVA, 2016, p. 216).

Levamos em conta os contextos históricos distintos, as contradições e complexidades

inerentes a esses contextos, como o primeiro passo do estudo comparado. Na sequência,

consideramos o processo de renovação mundial dessa metodologia, tal como analisam

Cowen e Kazamias (2012), ao focalizar a crise de identidade pela qual ela passou nos

anos 1960, colocando em discussão as visões idealistas, românticas e anti-históricas que

predominaram nessa área desde a sua constituição.

Além da renovação teórica, a comparação, nas últimas décadas, renovou-se em

termos de temas, já que, desde o fim do século XIX, esteve orientada pelo/no estudo

dos sistemas educacionais, nos Estados Nacionais e suas falhas. Hoje, de acordo com

essa renovação, alcançamos o estudo comparado como ferramenta de investigação de

documentos curriculares, produzidos em estados e municípios, considerando outros

protagonistas, como agências internacionais e nacionais, redes de pesquisadores e

associações científicas.

Nesse universo, reconhecemos, além das forças culturais e do ambiente social, o

pressuposto dialético dentro/fora da construção desses documentos, sob a perspectiva

do que determinados conhecimentos representam para o desenvolvimento intelectual de

crianças e jovens na escola (os poderes do conhecimento e da ampliação da compreensão

do mundo, em bases distintas daquelas que essas crianças e jovens já possuem, construídas

nas experiências mais imediatas do cotidiano).

Contudo, o discurso dos grupos que constroem esses documentos, nas diferentes

redes distribuídas pelo Brasil, elucida-se pelo/no enfrentamento das desigualdades

escolares, ainda que proposto em tempos de tentativas de apagamento dos vestígios

ideológicos do/no processo de escolarização13. Essas desigualdades, per se, dão forma ao

processo de reorientação curricular brasileiro, cujas condições de elaboração retratam uma

combinação de fatores, entre eles os direitos individuais postulados para todos (o direito

à aprendizagem), os conflitos em torno do que venha a ser conhecimento legítimo e as

dimensões da formação escolar, problematizadas e/ou defendidas por uma escolarização

básica, entendida/apreendida como reforma de estado, incrementada nos mesmos moldes,

isto é, em meio a políticas de reajuste econômico, entre outras.

Os discursos curriculares, nesse território, orientam-se por noções de capital escolar,

portanto, simbólico e social, cujo lucro (simbólico) pedagógico arquiteta uma situação

13- Ver, por exemplo, o Movimento Escola Sem Partido.

15Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

de comunicação no desenvolvimento escolar. Evidenciamos que tal desenvolvimento se

expressa na escolha de conhecimentos oficiais, como meio de operacionalizar o propósito

da escola básica e de dar forma às orientações reformistas. Tais orientações fundamentam-

se em um conjunto de competências pessoais e sociais, cognitivas e comunicativas, como

o conhecimento mobilizado, operado e aplicado em situação, cujo limite está administrado

por uma leitura da psicologia do desenvolvimento comprometida com a aprendizagem, o

ensino e a avaliação.

Recorremos a Santos (2002, p. 347) para enfatizar que “um currículo, mesmo

quando elaborado por um grupo que compartilha ideias comuns, representa sempre um

consenso precário em torno de algumas ideias”. Percebemos que, em sua forma prescrita,

representa uma linguagem veiculada por um grupo (das Secretarias de Educação), isto é,

uma linguagem autorizada, investida da autoridade desse grupo.

Os mercados simbólicos e seus sistemas de formação de preços delineados nos

documentos curriculares estabelecem os parâmetros para analisarmos as primeiras

estratégias de comunicação, como dependentes de uma relação de poder desigual, para

apreendermos, como poder simbólico, um tipo de poder capaz de fazer coisas com

palavras, neste caso, sobre o desenvolvimento curricular. Enfatizamos que, na prescrição,

não encontramos apenas trocas de mensagens, mas relações de autoridade, de atribuição

de valor, de valorização ou desvalorização dos diversos discursos, que marcam a distância

entre o discurso oficial (currículo oficial prescrito) e a sua incorporação nas proposições

das redes de ensino e na organização curricular de cada instituição escolar (currículo

moldado e currículo real).

Notas finais

Investigar documentos curriculares, em um programa de pesquisa, coloca-

nos, per se, diante da relação entre as etapas e modalidades da educação básica, bem

como dos componentes disciplinares e dos conhecimentos científicos selecionados e

distribuídos. Acresce-se a isso a identificação dos objetivos, que definem as expectativas

de aprendizagem dos conteúdos escolares, assim reconhecidos por estarem submetidos à

didatização ou ao como ensinar e que, por fim, materializam a avaliação, na perspectiva

da sala de aula e em larga escala. Isto posto, formalizam o elenco de metas, das mais

genéricas às mais específicas, acompanhadas da perspectiva de sancionar e/ou santificar

o desenho curricular em comparação, fazendo-o conhecer e reconhecer-se como objeto de

diferença social, conhecida e reconhecida pela/na investidura do pesquisador.

Contudo, destacamos que, no campo do currículo no Brasil, o cruzamento de

fronteiras não remete à comparação, e sim ao estabelecimento de diálogos sobre

temáticas. Um exemplo disso são os diálogos curriculares formulados entre o Brasil e o

México (2014), travados com o propósito de compreender que os significantes circulam

e produzem sentidos, discursos e práticas de subjetivação. Esse entendimento incorre no

compromisso com o aprofundamento do conhecimento pedagógico e a construção de

novas possibilidades de pensar a educação.

16

Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Fabiany de Cássia Tavares SILVA

Surgem novas possibilidades que, em outras fronteiras, dão forma à comparação

como princípio metodológico, alimentando-a de perspectivas histórica, cultural e

sociológica, delineadoras dos contextos econômicos, políticos e educativos nacionais e

globais, para apreender o currículo como manifestação da identidade nacional, a partir de

um enfoque internacional e interdisciplinar.

A par disso, aproximados do estudo comparado, identificamos pontos de consenso e

de dissenso ligados, fundamentalmente, à questão do grau de interiorização da dominação

política, econômica e social na produção dos documentos. Isso porque as condições

formativas dos agentes diretamente envolvidos no processo de seleção e legitimação dos

conhecimentos científicos incorrem, ou não, na superação das ortodoxias, dos interesses e

das defesas de cada área disciplinar. Agregam-se a isso as artimanhas da razão neoliberal,

que esvaziam o debate acerca dos determinantes intrínsecos aos processos de seleção e

distribuição dos conhecimentos científicos, parte da identidade dos documentos curriculares.

Dessa forma, os documentos curriculares retratam as intenções políticas e

normativas do futuro desejado para a escolarização, ao mesmo tempo que perfilam

as técnicas para o governo sobre as práticas educativas/formativas. Tal governo está

fundado na individualização como procedimento para criar indivíduos flexíveis para o

mercado de trabalho; nas competências como as destrezas e os conhecimentos necessários

ao tratamento da mercadoria; e nas avaliações como parte da racionalidade curricular,

expressa na clara relação entre os indivíduos e a responsabilidade por seus atos.

Por consequência, ou pela própria razão neoliberal, os processos de seleção e

distribuição de conhecimentos, materializados em documentos curriculares, contextualizam

os modelos de referência, isto é, o individualizado, o competente e o bem avaliado, uma

vez que as escolhas parecem ser expressas por indicativos em vez de imperativos. Dito

de outro modo, a existência dessa distinção remete-nos à ideia de que não aprendemos

explicitamente; operamos de acordo com os interesses dos interessados na escolarização

dos conhecimentos.

Exemplificando essa identificação, apresentamos alguns estudos e análises (na forma

de dissertações e teses) construídos sobre três documentos curriculares prescritos para a

Educação Básica, organizados/publicados pelas redes de ensino estadual de Mato Grosso

do Sul (2012) e municipal de Campo Grande (2008 e 2012), que resultam em escritas sobre:

o componente Matemática, particularmente para as etapas dos Ensinos Fundamental e

Médio; a presença das noções de democracia, cidadania e inclusão social como parte das

possibilidades, ou não, de construção da justiça curricular; os princípios, formatos e/ou

vestígios da política de distribuição de conhecimentos, como forma de interpretação da

melhoria do ensino e de adequação às novas demandas e exigências sociais, assim como

a necessidade de repensar o trabalho (ensino aprendizagem) e de introduzir modificações

necessárias (avaliação).

Quanto ao estudo comparado do componente Matemática nos documentos

curriculares, por meio das áreas de comparação Competência matemática e Estudos de

Números, de Geometria e de Medida, conclui-se que os conhecimentos selecionados se

traduzem nas competências matemáticas necessárias, no desenho do tipo de aluno a ser

formado e, em última instância, dão forma aos conhecimentos dos poderosos, próprios

17Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45, e193081, 2019.

Estudo comparado: fundamentos teóricos e ferramentas de investigação

daqueles que dominam a Matemática. No tocante à construção da justiça curricular

por meio do estudo comparado das noções de democracia, cidadania e inclusão social,

transformadas em áreas de comparação, os documentos curriculares não registram a

defesa de um projeto curricular emancipador, ou um currículo contra hegemônico, porque

dotam-nas da condição de conteúdos escolares, presentes nos componentes disciplinares

de História, Geografia, Língua Portuguesa e Arte. E, engrossando esse contexto, as análises

sobre os princípios, formatos e/ou vestígios da política de distribuição de conhecimentos,

desenhadas pelas áreas de comparação escola, desenvolvimento curricular e avaliação,

informam que as prescrições sobre a reestruturação das escolas pelo/no desenvolvimento

curricular, alimentada por defesas neoliberais, neoconservadoras e neogerenciais,

disciplinam a forma e a prática de avaliação pelas lógicas do mercado e do capital.

Por fim, essas análises, construídas nos limites do programa de pesquisa, tornam-

se reveladoras do alcance de uma escrita mais rigorosa e menos híbrida, determinada

pelo estudo comparado, ao mesmo tempo que registra a funcionalidade do recurso ao

local como um instrumento de legitimação das opções assumidas na construção de um

conhecimento contextualizado, fruto da reestruturação do trabalho científico de pesquisa

com documentos curriculares.

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Recebido em: 18.03.2018

Revisões em: 15.06.2018

Aprovado em: 07.08.2018

Fabiany de Cássia Tavares Silva é pós-doutora em educação pela Universidade Federal de

São Paulo (Unifesp). É professora na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e

bolsista produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq).