Sem conexão "Já estou atrasado. Não tenho outro partido, espero que esse mês eu resolva", afirmou o presidenteIsac Nóbrega / Presidência da República/DivulgaçãoEm negociação para retornar ao PSL, partido pelo qual se elegeu em 2018, o presidente Jair Bolsonaro colocou o fim de abril como prazo para definir seu futuro político. — Já estou atrasado. Não tenho outro partido, espero que esse mês eu resolva — afirmou o presidente na manhã desta segunda-feira, 19, em conversa com apoiadores na entrada do Palácio da Alvorada. O chefe do Poder Executivo tem falado desde o segundo semestre do ano passado que conversa com integrantes do PSL para voltar a ser um deles, mas também negocia com outras legendas. No mês passado ele afirmou que estava "namorando" um partido para ser "dono". — Abril está bom (como prazo para definir). O duro foi quando eu me candidatei (em 2018), que eu acertei em fevereiro, março (do ano da eleição), em cima da hora — disse o presidente. Bolsonaro deixou o PSL em novembro de 2019 após desavenças com o presidente da sigla, o deputado Luciano Bivar (PE). O principal motivo foi o controle do cofre da legenda, que se tornou uma superpotência partidária ao eleger 54 deputados, quatro senadores e três governadores na esteira do bolsonarismo. Com isso, a ex-sigla do presidente deve ter a maior fatia dos recursos públicos destinados a partidos políticos neste ano, de R$ 103,2 milhões. Deputados podem ser expulsosO Estadão ouviu de membros da cúpula do PSL que, para voltar à legenda, o presidente cobrou um "alinhamento ideológico" e a expulsão de deputados que têm feito críticas mais fortes a ele, como Júnior Bozzella (PSL-SP), Julian Lemos (PSL-PB), Joice Hasselmann (PSL-SP) e Delegado Waldir (PSL-GO). Integrantes do PSL afirmam que as conversas para o retorno ao partido pelo qual se elegeu presidente em 2018 estão na fase de aprofundamento e que Bolsonaro "namora" o partido. Para o chefe do Executivo, é importante ter uma legenda com um bom tempo de televisão e acesso à verba partidária e eleitoral, até mesmo para poder fazer frente a uma eventual candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O projeto de reeleição de Bolsonaro também visa o comando de diretórios estaduais do partido no Nordeste. Hoje há rivais do presidente em estados nordestinos, como os deputados Julian Lemos (PSL-PB) e Heitor Freire (PSL-CE), que coordenam os diretórios partidários de seus Estados. Também é o objetivo de Bolsonaro retomar o comando do partido no Rio de Janeiro e em São Paulo, que antes do racha eram chefiados respectivamente pelo senador Flávio Bolsonaro, hoje no Republicanos, e pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filhos do presidente. A ponte entre Bolsonaro e o PSL é feita pelo advogado Antonio Rueda, vice-presidente nacional da sigla e coordenador do diretório do Distrito Federal. A última vez que Rueda e Bolsonaro conversaram foi há um mês, quando o presidente reforçou a vontade de voltar ao partido e foi discutido um panorama geral sobre o cenário político brasileiro. O vice-presidente do PSL tenta conciliar a vontade de Bolsonaro com a da ala do partido que é crítica a ele. O Estadão apurou que as divergências são tratadas por Rueda com naturalidade e que a tarefa dele tem sido conversar para resolver os atritos e abrir caminho para a filiação. "Muito pequena" a chance de Aliança pelo Brasil sair em 2022, diz BolsonaroO divórcio com a legenda começou em outubro de 2019, quando Bolsonaro disse para um apoiador "esquecer" o PSL e foi desencadeada a crise que culminou no racha do partido e na consequente saída do presidente da República da legenda. Ato contínuo à decisão, bolsonaristas articularam a criação de uma nova legenda, que seria batizada de Aliança Pelo Brasil. No entanto, a criação da sigla tem patinado e os articuladores têm enfrentado dificuldades para reunirem as assinaturas necessárias para conseguir o registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). "Aliança pelo Brasil? Quase... Muito pequena a chance de sair. Já estou atrasado, já, não tenho outro partido, espero que esse mês eu resolva", declarou o presidente nesta segunda. Deputados aliados de Bolsonaro no PSL acreditam que é possível que o presidente volte ao partido. — Tudo é possível, mas ainda não está decidido — declarou a deputada Carla Zambelli (PSL-SP), uma das mais fervorosas apoiadoras bolsonaristas. Luiz Lima (PSL-RJ) segue a mesma linha e crê em um retorno do presidente. — Vejo uma enorme possibilidade, sempre lutei por isso e não tenho dúvida que é a melhor escolha. O deputado Carlos Jordy (PSL-RJ) concorda com a ideia de Bolsonaro de expulsar os membros do PSL que têm sido críticos ao presidente. — Há possibilidade de reatar, possibilidade real. As conversas estão nesse sentido, mas há um impasse que é a questão dos traíras. Existe ali uns oito ou dez no máximo que têm que sair do partido para que a gente possa restabelecer o PSL como o partido do presidente. Eu acredito que deva avançar. Eles sabem que mais importante para o PSL é a vinda do presidente do que ficar um bando de íngua que não ajuda em nada, não contribui com nada — afirmou Jordy.
Crédito, REUTERS/Adriano Machado Legenda da foto, 'Esquece o PSL. Tá ok?', disse o presidente a apoiador sobre seu próprio partido O presidente Jair Bolsonaro (PSL) tornou pública nesta terça-feira (08) uma crise com o comando do partido pelo qual se elegeu no ano passado. Ele também está mal com o presidente nacional da legenda, o deputado federal Luciano Bivar (PE). Segundo pessoas ligadas ao presidente da República, congressistas da sigla e assessores, a irritação de Bolsonaro se deve a uma disputa pelo controle do PSL e ao controle dos R$ 103 milhões que o partido receberá do Fundo Partidário ao longo de 2019. O grupo próximo ao presidente diz que ele quer "refundar" a legenda, melhorando as práticas de transparência e combate e adesão a políticas contra a corrupção. Já congressistas ligados a Bivar agora acusam o grupo do presidente de agir de forma autoritária e de desejar o controle total do PSL. A crise ficou pública na manhã de terça-feira (08/10), quando Bolsonaro foi abordado por um jovem simpatizante de Recife (PE), em frente ao Palácio da Alvorada. O garoto diz a Bolsonaro que é filiado ao PSL em Recife e pede para gravar um vídeo. Bolsonaro (ao ouvido do jovem): Esquece o PSL. Tá ok? Tá? Esquece. Simpatizante (olhando para a câmera do celular): Eu, Bolsonaro e (o deputado federal e presidente do PSL, Luciano Bivar). Juntos por um novo Recife. Aêêê! Bolsonaro (com expressão de chateado): Ô cara, não divulga isso não. Ele (Bivar) tá queimado pra caramba lá… tsc. Entendeu? Vai queimar meu filme também. Esquece esse cara. Simpatizante: Eu vou esquecer, vou esquecer. Bolsonaro: Esquece o partido. A fala do presidente repercutiu no Congresso ao longo do dia, e os congressistas do PSL que falaram sobre o assunto se mostraram surpresos. "Só posso dizer que fiquei perplexo. Não sei qual é a motivação. O presidente pode esclarecer a manifestação dele. Eu conversei com o Bivar e o (deputado federal pelo PSL-PB) Julian (Lemos) e estou tentando falar com o ministro (Luiz Eduardo) Ramos (Secretaria de Governo) para saber qual o sentido ou intenção. Nenhum de nós sabe", disse o líder do partido no Senado, Major Olímpio (SP). Crédito, Câmara dos Deputados Legenda da foto, Bivar preside o PSL desde 1998 e seu mandato tem prazo para novembro deste ano Já o líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO), lembrou que a família do presidente também enfrenta investigações de corrupção. "Como você fala do quintal alheio se o seu quintal está sujo? As candidaturas em Minas Gerais e Pernambuco estão sendo investigadas. Mas o filho do presidente (o senador Flávio Bolsonaro, do PSL-RJ) também", disse. Waldir refere-se ao fato de que, em Pernambuco, Bivar é investigado pelo Ministério Público por supostas irregularidades na campanha de 2018. Em Minas, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, é alvo de apurações pelo mesmo motivo. "Bolsonaro não está algemado no PSL, não. Aqui não tem ninguém amarrado. Candidatos majoritários, como o presidente, governadores e senadores, têm liberdade para trocar de partido quando quiserem", disse. Na tarde de terça-feira, o deputado federal Júnior Bozzella (PSL-SP) disse que reuniria assinaturas de congressistas do partido para um manifesto em defesa de Bivar, cujo mandato atual à frente do PSL termina em novembro deste ano. De fato, a coleta de assinaturas começou durante um jantar de deputados e senadores do partido com o ministro da Justiça Sergio Moro, do qual Bivar participou. O encontro foi no tradicional restaurante Lake's, na Asa Sul de Brasília. "Os Deputados Federais e Senadores do PSL infra-assinados vêm apoiar em solidariedade a V. Exª. (Bivar), diante das ameaças antidemocráticas de vossa destituição sumária da Presidência, trazidas pela mídia nacional, que também dão conta da suposta fragmentação do partido e falta de comando", diz o trecho inicial do manifesto. Segundo a advogada de Bolsonaro, Karina Kufa, o rompimento entre Bolsonaro e Luciano Bivar aconteceu na semana passada, depois de o pernambucano ignorar pedidos do presidente da República. Em junho, o presidente da República recebeu a advogada e o chefe do PSL para uma reunião. Nesse encontro, Bivar teria concordado com demandas apresentadas por Bolsonaro — principalmente, ceder poder no Diretório Nacional do PSL, mas também adotar medidas para melhorar a transparência da legenda, e para evitar casos de corrupção. "O Bivar foi lá, apertou a mão do presidente, disse que não teria problema. E aí depois eles mudaram de ideia. Talvez dar transparência e trazer um processo democrático para dentro do partido não soou depois tão interessante quanto ele tinha se comprometido", diz a advogada, que esteve com Bolsonaro na segunda-feira (07/10). "Foram pedidas algumas coisas, algumas providências. E eles (PSL) não cumpriram, foram enrolando. Até que o presidente apertou e falou 'olha, você vai cumprir ou não vai?' E aí eles simplesmente recuaram, mostraram que não tinham interesse nenhum de abrir as contas, de trazer transparência", diz ela. Crédito, Fabio Pozzebom / Agência Brasil Legenda da foto, 'Bolsonaro não está algemado no PSL, não. Aqui não tem ninguém amarrado', diz Delegado Waldir A assessoria de Bivar disse à BBC News Brasil que a versão apresentada por Karina Kufa não é verdadeira, e que ela não tem autoridade para falar em nome do presidente da República. Bivar decidiu não comentar o caso. "O PSL era um partido de um deputado só. Virou um partido grande. Então, o que seria legítimo? Mudar toda a diretoria, fazer uma refundação do partido com base nessa construção nova. Mas o Bivar nunca quis perder o poder, a direção. Ele é presidente desde 1998. Que democracia é essa, com um presidente eterno?", diz Kufa à BBC News Brasil. Kufa diz ainda que, hoje, Bivar controla a maioria dos integrantes do Diretório Nacional do partido. E que é virtualmente impossível que ele seja derrotado na disputa marcada para novembro. Júnior Bozzella, que decidiu coletar assinaturas para o manifesto em defesa de Bivar, disse à BBC News Brasil que as mudanças mencionadas por Kufa são apenas uma tentativa de mudar a direção da legenda em novembro. "Com o interesse macro de ter o controle do Fundo Partidário", disse. "Só que esse não era um processo legítimo de democracia, de discussão interna. É o maior partido no Brasil, tem governadores, senadores, deputados federais. Então, você monopolizar o partido, é muito estranho. Porque a gente vai correr o risco que o PT correu", diz ele. "O (ex-presidente) Lula quis fazer do partido a extensão do Palácio. E vice-versa. E aí foi todo aquele esquema de corrupção que a gente assistiu para um plano de perpetuação do poder. E nós não queremos que o PSL vá pelo mesmo caminho", compara o deputado. Bozzella — que entrou para o PSL antes da chegada de Bolsonaro, a convite de Bivar — diz que o pernambucano cedeu ao presidente em vários pontos: permitiu que seus filhos Flávio e Eduardo controlassem o partido no Rio e em São Paulo, respectivamente; e até anuiu com a expulsão do deputado federal Alexandre Frota (SP), hoje no PSDB, atendendo a um pedido de Bolsonaro. "O Bivar fez todos os gestos possíveis. O Eduardo (Bolsonaro) é presidente do partido no maior Estado da federação (em população), que é São Paulo. Ele não respeita nenhum dos 15 deputados que ali está, nem os 15 estaduais e nem os 10 federais, e nem o senador. O Flávio Bolsonaro é o presidente no Rio de Janeiro. Tem uma série de queixas e reclamações dos deputados que ali se encontram", disse ele à BBC News Brasil. "Apoiamos o governo, queremos que o país dê certo, mas acho que da maneira como têm sido disparadas essas ofensivas contra o presidente Bivar, ele ofende toda a instituição e consequentemente a nós deputados", diz. Crédito, FERNANDO FRAZÃO/AGÊNCIA BRASIL Legenda da foto, Convenção do PSL que oficializou candidatura de Jair Bolsonaro em 2018; crise do presidente com seu partido foi tornada pública nesta terça-feira Em março de 2018, quando Bolsonaro filiou-se ao PSL para disputar a eleição de 2018, levou com ele alguns deputados que migraram na "janela partidária" daquele ano. Em 2018, o PSL elegeu a segunda maior bancada para a Câmara, atrás apenas do PT: 52 deputados. Até o ano passado, o partido tinha um desempenho eleitoral pífio. Elegera um deputado federal em 2010, e também um único em 2014. Com o aumento da bancada, veio o aumento exponencial das verbas públicas recebidas pela sigla: este ano serão cerca de R$ 103 milhões do Fundo Partidário. No ano que vem, a sigla receberá quase R$ 360 milhões em dinheiro público (R$ 245,2 milhões do Fundo Eleitoral e mais R$ 113,9 do Partidário). Mas o que acontece se Bolsonaro realmente sair da sigla e levar vários deputados federais junto? De acordo com a advogada especialista em direito eleitoral Lara Ferreira, os recursos permanecerão, a princípio, com o PSL — isto é, os deputados que saírem não levarão suas fatias nos Fundos Eleitoral e Partidário. A questão é definida pela Lei dos Partidos Políticos, de 1995, diz ela. A fatia de cada partido nos Fundos é calculada hoje com base nos votos dos partidos na disputa pela Câmara. "Tanto no caso do Fundo Partidário, quanto do Fundo Eleitoral, o momento de aferição dos votos é a eleição anterior. As migrações posteriores (de deputados) não vão impactar pelo menos nesse primeiro momento a distribuição, nesse primeiro ciclo eleitoral. Para o próximo ciclo (as eleições de 2020 e 2022), como regra geral, isso não vai impactar", diz ela, que é professora da Escola Superior Dom Helder Câmara, em Belo Horizonte (MG). Ela faz uma ressalva: em anos recentes, algumas decisões do STF em Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) alteraram um pouco este entendimento. Por exemplo: durante alguns anos, deputados que saíram de suas legendas para partidos novos levaram consigo os recursos do Fundo Partidário — o que mudou com uma lei de 2015. Por isso, diz Ferreira, alguns casos não seguem a regra geral da Lei dos Partidos.
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