Por que a pessoa mente

Por que a pessoa mente
Por que a pessoa mente

De acordo com o dicionário Michaelis, mentira significa o ato ou efeito de mentir; afirmação que se opõe à verdade; informação enganosa ou controvertida; aquilo que dá falsa ideia; o que ilude; ou opinião sem fundamento.

Logo permaneceria a pergunta: – Por que as pessoas mentem? Por isso, vamos apresentar uma definição relacional, a partir do conceito de comportamento verbal. Beckert (2004) propõe que mentiras, promessas não cumpridas e omissões podem ser compreendidas quando se investiga a relação entre o comportamento verbal e o que se faz.

Por isso, o comportamento verbal, habilidade altamente desenvolvida, que nos distingue de outras espécies animais, permite solução mais rápida para problemas comuns à espécie ou ao grupo e possibilita transmissão de práticas culturais.

Por comportamento verbal, entendemos todo comportamento de uma pessoa que produz efeitos noutra pessoa antes de produzir efeitos no meio.

As pessoas tendem a descrever o mundo e construir afirmações sobre o funcionamento das coisas. Sobretudo, sobre os seus próprios comportamentos ou comportamentos de outras pessoas, além de acontecimentos de uma forma geral. Essas descrições e afirmações são produtos da interação com o mundo e passam a fazer parte do cotidiano quando aproximam pessoas, geram “assunto” e possibilitam a comunicação.

Dessa forma, observa-se, então, que descrições ou regras formuladas por uma pessoa afetam o comportamento do outro. O exemplo citado trata de descrição coerente com fatos. Mas, e se um marido infiel disser algo como: “Eu juro que não te traí. Você é a única mulher da minha vida!” Essa descrição não se mostra coerente com os fatos. Por quê? É quase irresistível dar respostas como “porque ele é um mentiroso” ou “porque ele é um canalha”. Mas dizer que alguém é mentiroso ou canalha não diz muito sobre os motivos da mentira.

Por que as pessoas mentem?

Há uma área de pesquisa em psicologia que se chama “correspondência entre o fazer e o dizer”, que investiga as variáveis relacionadas ao que se pode chamar de “dizer a verdade” ou “contar mentira”. Estudos (Paniagua, 1989; Lima, 2004) têm investigado situações geradoras da apresentação de relato coerente (verdade) ou relato incoerente (mentira). Os parágrafos a seguir estão baseados numa interpretação dos achados desses autores.

Pode-se dizer que há uma dicotomia, que seria falar a verdade. Ou seja, descrever de forma coerente fatos acontecimentos comportamentos ou contar mentira, que seria apresentar uma afirmação pouco adequada ou incompatível com o que, de fato, ocorreu.

Tanto falar a verdade quanto contar uma mentira, são comportamentos verbais aprendidos e mantidos pelas conseqüências que produzem, em primeiro lugar, para aquele que fala. Assim, se alguém é beneficiado por contar uma mentira, tal comportamento pode ser aprendido. Se mentir mais vezes trouxer “vantagens”, ele será mantido em alta freqüência.

É importante, ainda, considerar que o comportamento de mentir pode afastar ou adiar conseqüências desagradáveis. Como no exemplo do marido infiel que insiste em dizer à sua mulher que não cometeu traição. Assim sendo, mentir também seria aprendido e mantido.

As crianças mentem com freqüência para seus pais. Quando estes costumam repreendê-las pelo que fazem; quando punem deliberadamente seus relatos sobre o que consideram ser errado ou quando limitam muito as possibilidades sobre o que as crianças podem fazer.

É necessário diferenciar o comportamento de mentir enquanto relato em desacordo; do relato impreciso sobre algo pela falta de habilidade em descrever. Na mentira, uma pessoa tem consciência de que (sabe que) sua descrição não é coerente com o que fez.

Você quer que as pessoas digam a verdade?

Os psicoterapeutas procuram ter, na relação com seus clientes, uma audiência não-punitiva. Isso significa ouvir e não julgar, ouvir e não criticar, ouvir e não punir. Tal contexto é que torna possível o relato do cliente sobre coisas que não seriam ditas nem para os bons amigos.

Como foi afirmado anteriormente, pode-se mentir para ter acesso a alguma vantagem ou evitar “mal maior”. Assim sendo, as pessoas têm maior probabilidade de dizer a verdade diante de contextos em que o que elas dizem não é julgado, não é criticado, nem punido. Se um pai pune o filho quando ele relata que assistiu TV quando deveria estudar, é importante observar que ele puniu o comportamento do filho ter feito o que não devia, mas, puniu principalmente o comportamento de dizer a verdade. Pense, após ter sido punido por dizer a verdade, você a diria novamente?

É claro que nem sempre se pode aceitar a verdade sem que algum tipo de sanção seja administrada. Mas, se todo relato de alguém sobre o que fez ou como agiu diante de uma situação passa a ser criticado, julgado ou o relato passa a ser motivo para uma discussão, é provável que esse relato não ocorra mais ou que passe a ser um relato que apresente algo diferente do que ocorreu.

Outra forma de diminuir a probabilidade de dizer mentiras é enaltecer os momentos em que a verdade é dita. Por isso, elogiar; enaltecer e gratificar relatos mais próximos da experiência estabelece condição para a aprendizagem do “dizer a verdade”.

Inpa – Instituto de Psicologia Aplicada, Asa Sul, Brasília – DF, Brasil.

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