A musica popular brasileira rita lee


Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceuCom a música popular brasileira?Todos falam sério, todos eles levam a sérioMas esse sério me parece brincadeiraBenito lá de Paula com o amigo Charlie BrownRevive em nosso tempo o velho e chato SimonalMartinho vem da Vila lá do fundo do quintalTornando diferente aquela coisa sempre igualUm tal de Raul Seixas vem de disco voadorE Gil vai refazendo seu xodó com muito amorDez anos e Roberto não mudou de profissãoNa festa de arromba ainda está com seu carrãoParei pra pesquisarAi, ai, meu Deus, o que foi que aconteceuCom a música popular brasileira?Todos falam sério, todos eles levam a sérioMas esse sério me parece brincadeiraO Odair José é o terror das empregadasDistribuindo beijos, arranjando namoradasAté o Chico Anísio já bateu pra tu batêPois faturar em música é mais fácil que em tevêCelly Campello quase foi parar na ruaPois esperavam dela mais que um banho de luaE o mano Caetano tá pra lá do TeerãDe olho no sucesso da boutique da irmãBilú, bilú, fafá, faró, faró, tetéiaSeverina e o filho da véiaA música popular brasileiraA música popularSou a garota papo firme que o Roberto falouDa música popularO tico-tico nu, o tico-tico cu, o tico-tico pá rá ráráMúsica popularOlha que coisa mais linda, mais cheia de...Música popularMamãe eu quero, mamãe eu queroMamãe eu quero a música popular brasilera

Pega, mata e come!


Composição: RITA LEE E PAULO COELHO

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A musica popular brasileira rita lee
Foto — Luiz Garrido / Arte — Hans Donner

Lançado em agosto de 1979 e mais conhecido como “Mania de Você”, o sétimo álbum solo de Rita Lee é, com o perdão do chavão, um divisor de águas na carreira da artista. Além de marcar uma notável mudança de sonoridade, saindo do rock para uma linguagem mais pop — com direito a apropriações de elementos de outros gêneros, como disco music e samba — , também representa formalmente o início da parceria entre a artista e o guitarrista Roberto de Carvalho, seu marido desde 1976. Embora Carvalho já figurasse na ficha técnica do álbum anterior, “Babilônia” (1978), é a partir deste momento que eles se tornam cada vez mais “Rita & Roberto”, para deleite do público geral e desgosto dos puristas e de parte da crítica. Ao mesmo tempo, por mais paradoxal que isso pareça, é a partir daí que Rita se torna ainda mais ela mesma, sem estar acompanhada de uma banda fixa.

O fato é que não há como dissociar a mudança sonora do encontro musical-amoroso de Rita e Roberto. Claro que a artista já questionava as “fronteiras” do rock desde a época do Tutti Frutti, como dito em 1977 a Ana Maria Bahiana, em entrevista transcrita por André Barcinski no livro “Pavões Misteriosos”: “Sabe que eu não gosto de ficar dizendo que faço rock? Sabe que isso não quer dizer nada pra mim? Aí eu já pego e escrevo r-o-q-u-e, com ‘q’ mesmo, já é outra coisa, não é ficar fazendo rock, rock, radicalmente. Isso é impossível, gente, a gente vive aqui, no Brasil, tem que se ligar nisso, falar das coisas daqui”. Ou como exposto em declaração registrada na reportagem “Rita Romântica”, publicada pelo Jornal do Brasil em 26 de agosto de 1979, por ocasião do lançamento do novo disco.

“Sabe, o pessoal que pensa que faz rock no Brasil tem um preconceito muito grande em relação ao samba, ao som tipicamente brasileiro. A turma do rock é chata, fechada, preconceituosa, do mesmo jeito que é essa turma que defende a música popular brasileira contra a invasão das guitarras elétricas e dos sintonizadores [sic]. O rock não aconteceu nada no Brasil justamente por esse tipo de preconceito. Eu resolvi abrir. Há lugar para tudo, dá para fazer tudo, sem esse ranço, sem essa coisa chata, com muito samba. (…) Mas, sobretudo, é feito dentro da linguagem do rock, com muita guitarra, com muito sintetizador, com muita coisa elétrica, apesar de não ter preconceito contra os instrumentos acústicos”.

Na mesma reportagem, Rita ainda diz que o álbum de 1979 representa sua “abertura musical”, sem deixar de refletir a fase apaixonada. “Nunca fiz música romântica, porque nunca me vi envolvida com o tema para fazer. Agora, eu casei, estou apaixonadíssima por meu marido, por meus filhos. (…) Ele [o disco] registrou muito bem a fase que estou passando agora”.

Já Roberto, em depoimento a André Barcinski, define a mudança de sonoridade como um “movimento completamente orgânico, decorrente de uma fusão musical resultante de uma convivência amorosa intensíssima, de uma evolução musical e artística espontânea. O amor provavelmente gera uma musicalidade mais harmônica, melodiosa, doce, belas baladas, temática romântica, ou seja, pop”.

Claro que essa nova sonoridade também se insere, intencionalmente ou não, no zeitgeist do cenário musical da época. No final da década de 1970, como resultado da perda de espaço da MPB nas paradas de sucesso, da influência da música pop norte-americana — ainda na esteira da disco music, que perdia fôlego gradativamente— e do peso cada vez maior das rádios FM, os artistas brasileiros passaram a se aproximar cada vez mais de uma sonoridade pop “universal”.

Em meio a todo esse processo, Lincoln Olivetti, que já havia aparecido como instrumentista no álbum “Babilônia”, ganha maior destaque como arranjador e produtor nos créditos do álbum — como passaria a constar nos dois discos subsequentes —, além de ter sido peça fundamental para a formatação daquele que ficou conhecido como o som típico da década seguinte. Nesse novo contexto criativo, teclados, sintetizadores e recursos eletrônicos estão lado a lado com os tradicionais instrumentos acústicos, como descrito por Rita mais acima.

Na opinião de Roberto de Carvalho (apud BARCINSKI, 2014), ter Olivetti e seu grupo representava um “upgrade musical”: “As gravações eram orgânicas, no primeiro take já estava tudo lá, sem muito playback. De um bom gosto a toda prova”. Alguns dos fiéis escudeiros do arranjador já marcavam presença no álbum, como Robson Jorge (guitarra), Jamil Joanes (baixo) e Márcio Montarroyos (trompete). No entanto, a ficha do disco também trazia velhos conhecidos de Rita Lee, como Lee Marcucci (baixo elétrico) e Naila Skorpio (percussão).

Com tanta novidade em todas as esferas, não é difícil compreender o quão profunda foi a transformação do som daquela que já era considerada a rainha do rock brasileiro.

O rock além do rock

O disco é aberto por “Chega Mais” (Rita Lee/Roberto de Carvalho), descrita pela própria artista, em sua autobiografia, como “uma dance music com pegada brasileira” e um primeiro ensaio do que ela passaria a chamar de “rockarnaval”. O som do Oberheim, sintetizador analógico muito em voga naquela época, é a principal “marca registrada” de Olivetti presente no arranjo. Em reportagem para a extinta revista Música, Suely Aguiar descreveu a faixa como “uma disco-carnaval com uma letra bem simples e um ritmo contagiante”.

O rock em seu estado mais puro — a ponto de não ter qualquer teclado ou instrumento eletrônico no arranjo, como desejam os puristas — surge em “Papai Me Empresta o Carro” (Lee/Carvalho), mais uma letra inspirada e bem-humorada de Rita. Narrando a odisseia de todo adolescente com hormônios à flor da pele em busca de um lugar mais “privado” para dar vazão aos seus desejos, a música teve alguns problemas com a censura. “Não por proselitismo político, mas porque os censores acharam a música muito forte, falando muito em sexo”, como descrito na reportagem do Jornal do Brasil.

A terceira faixa, “Doce Vampiro”, única do disco assinada somente por Rita Lee, é uma balada composta ainda nos idos de 1977, quando Rita cumpria pena de prisão domiciliar por porte de drogas e estava grávida do primeiro filho, Beto. A romântica canção é, ao lado de “Mania de Você” (Lee/Carvalho), um dos megahits do disco. Vale aproveitar para falar logo desta última, adiantando um pouco a tracklist. Em sua autobiografia (e em muitas outras ocasiões), Rita Lee contou que a faixa foi “composta em cinco minutos com o inspiradíssimo script de uma recém-trepada perfeita”.

“Sem pudores, o casal se mostrava de corpo e alma, oferecendo a trilha sonora da sexualidade elegante para motel cinco estrelas nenhum botar defeito”. (LEE, 2016, p. 171)

Em termos de arranjo, tanto “Mania de Você” quanto “Doce Vampiro” contam com a presença do baixo sintetizado e do Oberheim de Lincoln Olivetti, além das flautas tocadas pela própria Rita e do toque folk-acústico-romântico do violão ovation. Falando em violão, cabe registrar que em “Mania de Você” há a participação de Sérgio Dias Baptista, aquele mesmo dos Mutantes, no violão de 12 cordas. Segundo a própria Rita contou a Nei Duclós em reportagem para a IstoÉ de 5 de dezembro de 1979, isso só foi possível com a mudança de banda: “No tempo do Tutti Frutti eu não podia convidar o Serginho, uma pessoa que eu adoro, só porque provocava uma ciumeira danada. Ninguém admitia concorrência”.

Outra questão importantíssima a ressaltar é que “Mania de Você” foi, de certa forma, revolucionária para sua época. Ali estava uma mulher falando de sexo e prazer feminino, tão claramente quanto possível em tempos de ditadura, quebrando tabus. Ainda que 1979 fosse o ano da tão sonhada abertura política e da anistia aos presos e exilados, criando (teoricamente) um contexto favorável a manifestações sobre sexualidade, a sociedade brasileira era — como hoje ainda é — careta. E a censura ainda existia, como citado acima no caso de “Papai Me Empresta o Carro”.

Pouco depois do lançamento do LP, Rita cedeu “Mania de Você” para uso em uma peça publicitária da coleção primavera-verão da grife Ellus. A repercussão do anúncio televisivo foi uma das provas de que o puritanismo ainda estava à solta, apesar da abertura política.

A musica popular brasileira rita lee
“Com Mania de Rita Lee” — Nei Duclós — Revista IstoÉ, 5/12/1979

Quarta faixa do disco, fechando o lado A, “Corre-Corre” (Lee/Carvalho) foi definida por jornalistas como um “disco-rock”. Em sua autobiografia, Rita diz gostar muito dessa música, definida por ela como uma faixa com “levada beat-disco a la Donna Summer, um refrão chiclete e letra atemporal resumindo a mesmice de todo final de ano quando fazemos um balanço da vida” (p. 170). De fato, a cada ano sempre há uma nova dose de cicuta para engolir como se fosse um suco de fruta.

No lado B, após “Mania de Você”, o enérgico rock “Elvira Pagã” (Lee/Carvalho) adianta a temática posteriormente tratada na música sob encomenda “Cor de Rosa Choque”: a condição feminina em meio à dicotomia santa/vadia. A letra deliciosamente satírica aborda aspectos e chavões do machismo cotidiano de ontem e de hoje.

A musica popular brasileira rita lee
“Rita Lee Voltando a Arrombar a Festa” — Suely Aguiar — Revista Música, 08/1979

A penúltima faixa do disco é uma das joias subestimadas de Rita Lee. “Maria Mole” (Lee/Carvalho), mais uma pérola bem-humorada, foi compreendida à época como a “caricatura de um reggae” (revista Música, 09/1979) voltada para crianças. De fato, as referências escatológicas da letra soam um tanto pueris e divertidas e dialogam com o arranjo, com direito a modulações do baixo sintetizado fazendo alusão a sons de “pum” e som de lambida após os versos “e quando eles se beijam, os dois se engolem”. Mas, de acordo com Rita, a personagem da faixa é inspirada em uma amiga que era chegada em uns “remedinhos”.

“‘Maria Mole’, personagem inspirada naquela minha amiga-mala melecada de Mandrix ao enrolar a língua para dizer que estudava ‘amdinistação dimpêsa’”. (LEE, 2016, p. 170)

Algumas páginas antes, Rita narra um episódio constrangedor envolvendo a “musa inspiradora” da música. Durante uma reunião particular na casa do executivo André Midani, com a presença de Eric Clapton e Pattie Boyd, a amiga “ricaça gente boa, persona non grata do high society paulistano”, já “alegrinha de birita y otras cositas más”, nas palavras de Rita, resolveu batucar um samba nas costas do violão prateado do rockstar. O constrangimento foi geral. O episódio é narrado com mais detalhes nas páginas 130 e 131 do livro.

“Todos falam sério” e Rita segue com o deboche

O disco é encerrado por “Arrombou a Festa nº2” (Rita Lee/Paulo Coelho), que atualiza a canção lançada dois anos antes como single. Antes de falar da nova faixa, vale analisar a primeira. Segundo Rita conta em sua autobiografia, a letra tinha o objetivo de “escandalizar os bons costumes da MPB” e era inspirada no hit da Jovem Guarda “Festa de Arromba” (Roberto Carlos/Erasmo Carlos).

“Tirando Elis, não poupamos ninguém. A letra citava celebridades em evidência na época, de uma maneira pra lá de deseducada, tudo o que hoje o politicamente correto se arrepiaria de indignação”. (LEE, 2016, p. 159–160)

Alguns nomes são citados de forma mais “neutra” ou até mesmo positiva, como Odair José (“O Odair José é o terror das empregadas / distribuindo beijos, arranjando namoradas”), Martinho da Vila (“Martinho vem da Vila lá do fundo do quintal / tornando diferente aquela coisa sempre igual”) e Gilberto Gil (“E Gil vai refazendo seu xodó com muito amor”). Já outros são alvo de ironia, como Roberto Carlos (“Dez anos e Roberto não mudou de profissão / na festa de arromba ainda está com seu carrão”).

Há, ainda, os que são esculachados sem dó nem piedade. É o caso de Benito di Paula, recém-surgido no cenário musical com seu assim denominado “samba joia”, marcado pelo uso do piano nos arranjos. Na letra de “Arrombou a Festa”, é dito que Benito “revive em nosso tempo o velho e chato Simonal”, talvez em uma alusão aos sucessos do artista da Pilantragem, cujos arranjos suingados também tinham como característica a presença do piano.

Outro alvo é o humorista Chico Anysio, que à época havia lançado, junto a Arnaud Rodrigues, dois discos do grupo fictício “Baiano & os Novos Caetanos”, surgido no programa humorístico Chico City como uma sátira a Caetano Veloso, aos Novos Baianos e ao tropicalismo. “Até o Chico Anysio já bateu pra tu batê / pois faturar em música é mais fácil que em tevê”, diz a letra, citando um dos maiores sucessos do primeiro disco do grupo, “Vô Batê Pá Tu”.

Ao final da música, há citações à marchinha “Mamãe Eu Quero”, ao sucesso da Jovem Guarda “Garota Papo Firme”, ao standard bossanovístico “Garota de Ipanema”, ao choro “Tico Tico no Fubá” e a um dos clássicos da MPB-protesto dos anos 60, “Carcará”. Quase ninguém passa incólume.

O compacto vendeu mais de 250 mil cópias, foi direto para o topo das paradas e levou a reações não muito agradáveis: como registrou a imprensa na época, houve quem fizesse pichações em retaliação ao tom debochado da letra contra os artistas da MPB.

A musica popular brasileira rita lee
Revista Pop, julho de 1977

“A primeira ‘Arrombou a Festa’ foi gravada há uns três anos, num compacto. A intenção era de fazer uma brincadeira com o clima de festa, onde as pessoas dão beijinhos mas falam mal por trás. O curioso é que as pessoas, de tanto serem reprimidas, passaram a repressoras e, diante desta minha brincadeira, reagiram de forma muito estranha: houve alguém que dissesse que eu não podia falar nada porque era americana e tal. Outras acharam que eu não podia gozar Roberto Carlos e aí por diante. Ora, fiz uma música leve, usando uma forma bem brasileira de humor na base da auto-gozação e deu tanta polêmica. Acho inclusive que seria muito bom que essa abertura que está aí sirva também para abrir a cabeça das pessoas”.

— Rita Lee em depoimento a Dirceu Soares — Folha de S. Paulo, 17 ago 1979

Eis que, dois anos depois, Rita atualiza a letra com as novidades do cenário musical brasileiro. A versão de 1979, que encerra o álbum analisado neste texto, aborda o recente modismo disco citando duas cantoras de sucesso efêmero (“na onda discotheque da América do Sul / Lenilda é Miss Lene, Zuleide é Lady Zu”), além de mencionar Fafá de Belém (“além de muita voz, ela também tem muito peito”) e Alcione (“é boa de piston, mas bota a boca no trombone”), expoentes da nova geração feminina. Sidney Magal é alfinetado sem dó (“cigano de araque, fabricado até o pescoço”) e no final sobra até para a própria Rita Lee, que inclui doses generosas de autoironia na letra (“e a Rita Lee parece que não vai sair mais dessa / pois pra fazer sucesso arrombou de novo a festa).

Além das mudanças na letra, “Arrombou a Festa nº2” traz novidades no arranjo. Se a primeira era roqueira e “de boas”, com andamento lento e ligeiramente suingado, a segunda é um pouco mais acelerada, meio “disco-rock”, seguindo a tendência do álbum.

As citações musicais ao final também são outras: dessa vez Rita parodia Roberto Carlos e sua “Lady Laura”, canta zombeteiramente o “Parabéns A Você”, evoca “O Meu Sangue Ferve Por Você”, sucesso na voz de Sidney Magal, e usa “Le Freak”, do grupo norte-americano Chic, como base para um delicioso deboche: “fricote / eu fiz xixi / na música popular brasileira”.

“Às vezes as pessoas acham que eu fiz uma crítica à música popular brasileira, mas é o contrário. Eu fiz uma homenagem, só que tinha um lado satírico, um lado irônico”.

- Rita Lee em entrevista ao Video Show, TV Globo, 2002

A primeira de muitas novidades

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Revista Música — set 1979

No geral, a reação do público e da crítica ao disco foi boa. Claro que houve certo estranhamento natural em relação à “popificação” do som da artista. Walmir de Medeiros Lima, da revista Música, não deixou de elogiar o trabalho, principalmente em relação às letras, mas afirmou que o LP “não tem o mesmo pique rítmico de ‘Babilônia’”, álbum anterior.

Já segundo Tárik de Souza, em crítica publicada no extinto Jornal da República, Rita “fez as pazes” com o samba ao incluir “uma discreta batucadazinha” em “Chega Mais” e o álbum é o “aprimoramento constante de uma divisa simplista: ‘resolvi continuar brincando, mas através da brincadeira vou dando meus toques, falando de uma porção de coisas’”.

“Em rocks ou baladas (Doce Vampiro lembra os Beatles do LP Abbey Road) que mais parecem jingles de tão colantes, Rita nada mais faz do que bulir travessamente na mitologia do show-bizz como uma retardatária e deslumbrada Alice no país das maravilhas (Arrombou a Festa II). Ao contrário da múltipla fábula de Lewis Caroll [sic], no entanto, a personagem encarnada por Rita Lee é literal e uníssona, como acontece na frequente superposição de suas vozes monocórdias no disco”.

— Tárik de Souza — Jornal da República, 13 set 1979

Quanto às vendagens, não havia do que se queixar, já que foram centenas de milhares de cópias. Ao álbum de 1979, seguiram-se dois grandes sucessos que formam, junto com este, a grande trilogia pop rock arrasa-quarteirão de Rita Lee: “Rita Lee” (1980), conhecido como “Lança Perfume”, e “Saúde” (1981). Ambos os discos contam com a assinatura de Lincoln Olivetti nos arranjos e foram decisivos para a consolidação dessa nova sonoridade da rainha do rock brasileiro.

Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello são responsáveis por uma das melhores definições da importância do álbum de 1979 para a carreira de Rita Lee — e, por tabela, para a música brasileira.

“Considerando o seu trabalho anterior, vinculado ao rock, Rita Lee realizou na ocasião praticamente um crossover em sua carreira, ampliando a faixa etária de seu público nas duas extremidades, a das crianças e a dos quarentões. Daí a subida de patamar, à qual Roberto de Carvalho deu base e sustentação indispensáveis ao acabamento sofisticado de seu novo estilo”. (SEVERIANO e MELLO, 1998)

Mas também podemos ficar com uma citação da própria Rita Lee, em sua autobiografia, para fechar este texto.

“Nada mais ‘mutante’ do que desfilar por quaisquer avenidas musicais”. (LEE, 2016, p. 177)

Os trechos de matérias de revistas e jornais vieram do blog Velhidade, do blog euamoritalee e do acervo da Biblioteca Nacional.

Referências bibliográficas

BARCINSKI, A. Pavões misteriosos: 1974–1983 — a explosão da música pop no Brasil. São Paulo: Três Estrelas, 2014.

LEE, R. Rita Lee: uma autobiografia. São Paulo: Globo, 2016.

SEVERIANO, J.; MELLO, Z. H. A Canção no Tempo: 85 anos de músicas brasileiras. Vol. 2: 1958–1985. São Paulo: Editora 34, 1998.