INFORMAMOS QUE ESTA É UMA PRIMEIRA VERSÃO DO TEXTO APROVADO
PARA PUBLICAÇÃO. ESTE ARTIGO AINDA PASSARÁ PELA FASE DE REVISÃO E
DIAGRAMAÇÃO.
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ID: 2198
DOI: //doi.org/10.30962/ec.2198
Recebido em: 16/06/2020
Aceito em: 30/09/2020
Roleta interseccional: proposta metodológica para análises em
Comunicação
Fernanda Carrera
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
Resumo: Ao reconhecer a relevância do conceito de interseccionalidade como
ferramenta metodológica no domínio do Direito, este artigo propõe articular e
aprofundar sua valência nos estudos em Comunicação. O método interseccional
em Comunicação carece de aparatos conceituais próprios, em diálogo com suas
origens, para que não reduza sua capacidade analítica a estudos descritivos dos
sujeitos, materialidades e suas estruturas. Intenta-se, aqui, portanto, construir um
quadro metodológico, denominado “roleta interseccional”, admitindo que a
observância das matrizes de opressão que atravessam os corpos e os sujeitos é
fundamental para a compreensão dos efeitos comunicacionais por eles
engendrados.
Palavras-chave: Interseccionalidade. Comunicação. Metodologia. Feminismo.
Interseccionalidade: origem, diálogos e fundamentos
Arquitetado no domínio jurídico e dos direitos civis pela professora Kimberlé
Crenshaw (1989; 1990), o conceito de interseccionalidade surge após amplo e complexo
debate no campo dos movimentos sociais. Precedido pela “liberdade indivisível” de June
Jordan (1992, p. 190), dos lugares fronteiriços da resistência latina de Gloria Anzaldua
(1987), da articulação tríplice entre “mulher, raça e classe”, de Angela Davis (1981) e da
perspectiva feminista poética de Audre Lorde (1984), o conceito adquire potência e
articulação em torno da justiça social antes de ser integrado aos espaços acadêmicos de
legitimação. Mulheres ativistas, então, elaboraram as bases do ideal interseccional a partir
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de suas vivências, desejando a criação de “políticas emancipatórias de fora das
instituições sociais poderosas, assim como essas ideias têm sido retomadas por tais
instituições” (COLLINS, 2017, p. 7). É na instituição acadêmica, portanto, que a ideia é
traduzida para a linguagem da visibilidade e da validação intelectual.
Munida desta substância de luta social, Crenshaw cunha o termo
interseccionalidade na tentativa de apontar para as injustiças em sistemas jurídicos, que
não contemplam os múltiplos eixos de subordinação que acometem, sobretudo, mulheres
negras. Ao considerar que a doutrina jurídica em torno da discriminação de gênero e raça
é definida pelas experiências de mulheres brancas e homens negros (CRENSHAW,
1989), sua proposta reconhece que há, no contexto das mulheres negras, a criação de outro
“locus de enunciação” (BERNARDINO-COSTA; GROSFOGUEL, 2016, p. 19), isto é,
há a gênese de um sistema de opressão articulado pelo encontro de duas ou mais estruturas
discriminatórias, cujo resultado é mais complexo que a soma das suas origens de
desempoderamento. Constituídas por experiências diversas daquelas vividas por
mulheres brancas e acometidas por violências diferentes daquelas sentidas por homens
negros, mulheres negras falam de um lugar de subjugação apartado e muitas vezes
ignorado. Nesse sentido, “a proposta de Crenshaw nos instrumentaliza neste campo de
justiças mediadas” (AKOTIRENE, 2019, p. 113).
Entender o conceito de interseccionalidade a partir de sua origem epistêmica é
questionar perspectivas que consideram outros caminhos metodológicos, como o conceito
de “consubstancialidade das relações sociais” (KERGOAT, 2010), como semelhantes ou
comparáveis, uma vez que o direcionamento sobre noções de classe e “sexo” deste último,
advindo do feminismo materialista, diferem vigorosamente da visão interseccional sobre
estas categorias sociais. Além de optarem pela crítica ao conceito de gênero e
argumentarem pela noção de “relações sociais de sexo” (CISNE, 2014) – o que revela a
tentativa de centralizar a figura da mulher nos estudos de gênero e recair sobre
perspectivas muitas vezes transfóbicas (MACHADO, 2017) - autoras que defendem a
substituição do conceito de interseccionalidade por consubstancialidade argumentam que
a classe é negligenciada nos estudos interseccionais, que trariam de forma hierarquizada
e potencializada as problemáticas de raça e gênero (HIRATA, 2014; KERGOAT, 2010,
CISNE, 2014; DELPHY, 1981). No entanto, uma vez que a criação do conceito já
demarca que a interseccionalidade pode fornecer os meios para lidar com outras
marginalizações, é explícito em estudos sobre interseccionalidade a negação da hierarquia
de opressões, resumida pela ideia de avenidas identitárias: “Errôneo argumentarmos a
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favor da centralidade do sexismo e do racismo. Já que ambos, adoecedores e tipificados,
são cruzados por pontos de vistas em que se interceptam as avenidas identitárias
(AKOTIRENE, 2019, p. 44).
No entanto, é evidente que o berço epistêmico nas duas perspectivas influencia
diretamente na alocação de esforços teóricos a respeito das categorias identitárias
colocadas em problematização. Enquanto a noção de consubstancialidade nasce sob a
lógica marxista das relações de produção, compreendendo a raça como mais um lugar de
disputa material e ideológica dentro das estruturas de classe, o conceito de
interseccionalidade emerge como fundamento metodológico para dar visibilidade às
opressões vividas por mulheres negras. Nesse sentido, para o feminismo negro, é preciso
negar a primazia da classe para a compreensão de quaisquer fenômenos em torno da
violência, da injustiça e da opressão, como historicamente foi o direcionamento das
ciências sociais, isto é, assim como gênero, sexualidade e outras avenidas identitárias
também são, “raça é a maneira como a classe é vivida” (DAVIS, 2011). A visão marxista
ortodoxa, portanto, não prevê o alargamento da concepção sobre exploração para além do
ponto de vista econômico, negligenciado os “brancos sem propriedade dos meios de
produção que recebem seus adventos do racismo” (GONZALEZ, 2018, p. 19). O conceito
de interseccionalidade, assim é “sobre a identidade da qual participa o racismo
interceptado por outras estruturas” (AKOTIRENE, 2019, p. 48).
O projeto de construção do termo interseccionalidade, portanto, emerge do
reconhecimento destas diversidades dentro dos grupos raciais e de gênero, sobretudo,
sendo articulado por mulheres racializadas e, especialmente, pelo feminismo negro. A
reivindicação principal da proposta reside na compreensão de que não há, para os sujeitos,
hierarquia de opressões, mas uma sinergia de múltiplos sistemas de poder (COLLINS,
2017, p. 11). Sendo assim, embora tenha sido alicerçado pelas demandas de raça e gênero,
o projeto não se resume a estas categorias, mas “adota coalização e solidariedade políticas
em prol dos oprimidos por classe, sexualidades ou território, dentre diferentes marcações”
(AKOTIRENE, 2019). Dentro dessa perspectiva, a teoria interseccional é aplicável para
outras categorias sociais e não busca identificar o sujeito que, de forma aditiva, reúne
mais dinâmicas de subjugação. Ao contrário, “nós precisamos ir além da questão ‘qual
grupo está em pior situação’ para especificar as formas distintivas de opressão
experimentadas por aqueles que intersectam identidades (CARBADO, 2013, p. 813)
“we need to move beyond the question of ‘whose group is worse off ’ to specify the distinctive forms of
oppression experienced by those with intersecting subordinate identities” (no original)
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Uma vez que fornece “os meios para lidar com outras marginalizações”
(CRENSHAW, 1990, p. 1299), o conceito de interseccionalidade vem sendo alicerce para
estudos em diferentes áreas do conhecimento, embasando reflexões sobre opressão
cruzada, por exemplo, de idade e gênero (CALASANTI; KING, 2015); gênero e
sexualidades (TAYLOR; HINES; CASEY, 2010); raça, gênero e deficiência (SHAW;
CHAN; MCMAHON, 2012); raça, classe e migração (ANTHIAS, 2012); assim como
nacionalidades e religião (SALEM, 2013). No entanto, embora esta ampliação contextual
possa trazer perspectivas importantes para o campo das análises interseccionais, também
pode “se perder na tradução” (COLLINS, 2017) e permitir debruçamentos meramente
descritivos e superficiais sobre os sujeitos e suas peculiaridades, isto é: reconhecer as
diversidades identitárias não é suficiente para a teorização (ANTHIAS, 2012).
Dentro dessa perspectiva, o cerne do projeto interseccional, isto é, seu “ethos de
justiça social” (COLLINS, 2017, p. 15) é imprescindível para o empreendimento de
qualquer esforço científico em torno da interseccionalidade. Reconhecer diferenças é uma
das etapas do processo analítico, mas este reconhecimento se torna a base para o
enfrentamento de injustiças e opressões estruturais. Assim, qualquer delineamento
metodológico para pesquisas em interseccionalidade, se ajustado à teoria fundamental e
às suas bases sociais, deve ser comparativo, complexo e emanar ares de manifesto e
denúncia, porque seu princípio é, irremediavelmente, o da justiça social. Nesse sentido,
embora tenha conexão com a noção de “marcadores sociais da diferença” (SAGESSE et
al, 2018), o conceito de interseccionalidade, de fato, propõe um olhar para além da
diferença, mas para o que fundamenta, a partir da diferença, a opressão
. Assim, é uma
perspectiva conceitual em prol da marcação das desigualdades e, dentro dessa estrutura,
também dos privilégios. A diferença, então, seria a materialidade visível de um sistema
desigual que sustenta certa fixidez identitária e coletividade, sobretudo quando esta serve
à discussão política e pragmática sobre as injustiças socioculturais (BHABHA, 1992;
FANON, 1970; HALL, 2009).
Sendo assim, se o campo da Sociologia e do Direito se debruçam sobre as
interseccionalidades estruturais e políticas que expõem as avenidas de opressão que
definem dinâmicas criminais, de violência e de políticas públicas, o olhar da
Nesse sentido, embora perspectivas críticas à noção de interseccionalidade pensada por Crenshaw, como
a de Piscitelli (2008), apontem para uma visão da diferença deslocada da desigualdade, aqui é proposto
como ponto de partida o projeto conceitual do termo em sua origem, isto é: o esforço analítico
interseccional, aqui no campo da comunicação, que visa à demarcação de injustiças sociais.
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Comunicação pode ter como foco a “interseccionalidade representacional”
(CRENSHAW, 1990, p. 1245), isto é, a construção cultural e os sentidos marginalizantes
que circulam sobre estes sujeitos. Estes sentidos, inclusive, transcendem o campo
midiático e operam no âmbito das relações sociais, inclusive, acadêmicas, que também
costumam compor objetos de estudo em comunicação. Espaços de construção científica,
como as universidades e os lugares de debate sobre práticas educacionais, são importantes
lugares de representação, legitimação e invisibilização, carecendo de iniciativas teórico-
metodológicas, como aquela representada pelo conceito de interseccionalidade, que retira
autores e autoras das margens e reconhece sua intelectualidade (ANZALDUA, 1987;
HOOKS, 1995; GONZALEZ, 2018).
Constituindo-se como mais uma fonte de desempoderamento, os espaços de
representação, então, são formas potentes de expor e reforçar as percepções enviesadas a
respeito de determinados grupos sociais. Nesse processo de contínua suplementação das
dinâmicas de discriminação, estes olhares subjetivos se tornam imbricados nas minúcias
das interações, nos discursos, nas conversações e, por fim, na própria constituição deste
corpo e de tudo que a ele é associado. Nesse sentido, não se discute aqui as
intencionalidades das ações discriminatórias, uma vez que as opressões não são
necessariamente produzidas deliberadamente, mas podem ser seguidamente “a
consequência da imposição de um fardo que interage com vulnerabilidades preexistentes
para criar mais uma dimensão de destituição de poder” (CRENSHAW, 1990, p. 1249).
Os espaços midiatizados, assim como os ambientes interacionais e de
conversação, constantemente colocados sob os holofotes das pesquisas em Comunicação,
são lugares emblemáticos para o debate sobre matrizes de opressão e dinâmicas
discriminatórias. Reduzidos muitas vezes a depreciações de sentido e importância,
relegados a uma suposta futilidade que se atribui às atividades recreativas, estes espaços
estão dominados pelas mesmas estruturas simbólicas e materiais que subjugam indivíduos
marginalizados e perpetuam de forma violenta suas impossibilidades sociais. É por meio
destes lugares que são postas em circulação imagens e são construídos, por conseguinte,
imaginários; sendo assim, é necessário lembrar que “longe de serem neutras ou
simplesmente estéticas, as imagens têm sido uma das principais armas para reforçar e
combater a opressão social” (BENJAMIN, 2019, p. 102-103)
“far from being neutral or simply aesthetic, images have been one of the primary weapons in reinforcing
and opposing social oppression” (no original)
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É dentro dessa perspectiva que este trabalho tenta propor um olhar metodológico
interseccional para os estudos em Comunicação, ao compreender que há especificidade
constitutiva nas “interseccionalidades representacionais” e estas carecem de escrutínio
científico próprio. A potência comunicacional das fotografias, dos materiais audiovisuais,
dos produtos culturais em torno da música, das artes visuais e plásticas; a força das
conversações diárias e das interações face a face e os modos de interação assíncrona
propostos por tecnologias digitais; os ambientes de sociabilidade contemporâneos, que
ora se fundamentam pela produção de novos mecanismos, dispositivos e práticas, ora são
meros resgates e ressignificações de práticas passadas; e os produtos jornalísticos,
publicitários e da mídia massiva, cujos lugares de poder não se pode negligenciar: todas
estas manifestações e seus aparatos são objetos de análise comuns em estudos da
Comunicação e, também, estão sujeitos à reprodução e reforço de dinâmicas de opressão
interseccionais. É sob a égide desta acepção que é proposto aqui um caminho
metodológico inicial, denominado roleta interseccional; uma ferramenta discursivo-
operacional que pretende identificar os rastros da interseccionalidade nas diversas
expressões e experiências comunicacionais, sem perder de vista, é claro, sua motivação
elementar: a reivindicação pela dignidade.
Delineamentos conceituais: diálogo interdisciplinar
O empenho pelo pensamento interseccional já é uma realidade no campo da
Comunicação, sobretudo nos seus contatos com outras áreas do conhecimento. No
entanto, se muitos destes estudos pensaram na teoria como método para análises de seus
objetos midiáticos, como talk shows (CRAGIN, 2010), telenovelas (YILDIZ-SPINEL,
2013; DE SOUZA e DRUMMOND, 2018), reality shows (CHOW, 2011), campanhas
presidenciais (PINDERHUGHES, 2008) e publicitárias (CORRÊA, 2019); como
arcabouço teórico-metodológico para estudos em comunicação oral e textual (BAGGA-
GUPTA, 2012); assim como para análises das interações em ambientes digitais
(COTTOM, 2016) e das humanidades digitais em geral (RISAM, 2015), muito poucos se
interessaram pela discussão epistemológica do método diante das demandas específicas
do campo (CORRÊA et al, 2018; NIELSEN, 2011).
No entanto, embora seja possível identificar a abordagem comunicacional dos
estudos, sobretudo pelos seus objetos de análise especialmente midiáticos e interacionais,
não se pretende aqui entender a Comunicação como independente de suas influências
interdisciplinares. Na verdade, a discussão sobre a “situação incômoda do suposto objeto
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da Comunicação, apontado como heteróclito e diversificado” (BORGES, 2019, p. 27) não
é o foco aqui, embora se reconheça o caráter fluido e transitório da sua constituição, como
afirma Muniz Sodré (2014, p. 14): “a comunicação seria o conjunto das placas tectônicas
sob a superfície do comum. Elas, como suas congêneres geológicas, são essenciais, mas
não eternas em constituição ou em alinhamento”. Sendo assim, aqui são consideradas
demandas específicas do campo aquelas que se alinham aos interesses e perspectivas
consolidadas na área da Comunicação e que, aliás, já foram continuamente construídas
em torno do diálogo com outras disciplinas. Essa interdisciplinaridade, por muitos
trabalhada como um problema de pesquisa (LOPES, 2001; FRANÇA, 2001; BORGES,
2019), aqui é o ponto de partida para a construção de um esboço teórico-metodológico
para o pensamento interseccional em Comunicação.
O trabalho de Nielsen (2011) é uma das poucas iniciativas de pensar a
interseccionalidade para as pesquisas em Comunicação. Embora não tenha proposto um
modelo analítico específico para a área, Nielsen se inspirou em uma matriz metodológica
da ciência política (HANCOCK, 2007) para sugerir o projeto interseccional nas pesquisas
em comunicação de massa. Com foco neste teor midiático e massivo, sua proposta tem
como base o estudo dos enquadramentos em textos jornalísticos, mostrando como
abordagens interseccionais podem trazer resultados mais complexos sobre os sujeitos em
destaque. Sua principal crítica sobre os estudos em Comunicação reside na continuidade
das análises binárias (mulher/homem ou negros/brancos), mesmo naqueles que têm como
base os estudos feministas, ou seja, há, ainda, uma constante homogeneização das
categorias sociais em pesquisas que propõem avaliar processos de representação. Em
análises interseccionais, portanto, nas quais é possível estudar como modos de exclusão
trabalham conjuntamente, “scholars may evaluate whether mass communication
messages are acknowledging institutional biases” (NIELSEN, 2011, p. 7)
.
Ao analisar o enquadramento noticioso de uma mulher latina em dois jornais de
grande circulação, Nielsen mostra como análises unitárias (com foco em uma categoria
social) ou até mesmo múltiplas (com foco em mais de uma categoria separadamente) são
frágeis em relação às abordagens interseccionais (que examinam múltiplas categorias de
forma combinada). Entender, por exemplo, os contextos de personagens com base em
interseccionalidade é reconhecer que as experiências de vida não são fragmentadas e,
consequentemente, estas pessoas não sofrem opressão ora por serem imigrantes, ora por
“pesquisadores podem avaliar se as mensagens de comunicação de massa estão confirmando vieses
institucionais” (tradução nossa)
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serem racializadas, ora por serem mulheres, mas sempre em uma combinação de todas
estas estruturas, formando um bloco identitário relativamente autônomo. Nesse sentido,
Nielsen deixa claro a diferença de entender a interseccionalidade como método e como
teoria: enquanto como ferramenta metodológica o conceito serve à construção das
perguntas pelo pesquisador, como teoria ela serve à explicação do processo nocivo da
fratura das identidades sociais (NIELSEN, 2011).
Corrêa et al (2018), por sua vez, analisa a potência de se pensar a comunicação
midiática a partir do olhar interseccional e das contribuições de intelectuais negras. Dessa
forma, mostra que os processos comunicacionais e interacionais são diretamente
influenciados pelas estruturas de opressão que definem quem detém ou não do poder de
voz. O espaço midiático, portanto, é um lugar de contínua disputa de experiências, no
qual sujeitos subalternizados reivindicam a interrupção da sua percepção de exterioridade
e o domínio de suas próprias narrativas; neste espaço, muitas vezes marcado por
invisibilização, este sujeito “luta por ser contado como sujeito social dotado de cidadania
e autonomia, um sujeito relacional com acesso à fala, à visibilidade e à aparição na cena
pública” (CORRÊA et al, 2018, p. 166).
Embora estes trabalhos introduzam questionamentos importantes para o
pensamento interseccional em dinâmicas comunicacionais, há ainda uma lacuna na
produção de um método explícito e preciso para o campo da Comunicação. Assim, no
percurso pela proposição destes operadores, admite-se aqui a necessária articulação com
outras áreas do conhecimento, sobretudo aquelas que já dialogam com objetos de análise
em comum. Se, portanto, a Antropologia oferece a riqueza das coletas de dados
etnográficos em grupos sociais; a Psicologia Social e a Sociologia são fundamentais na
definição dos processos de identificação e de construção de alteridade nas interações
cotidianas; a Análise do Discurso, pode, por fim, ser mobilizada como inspiração para o
debruçamento do analista sobre os textos e as práticas comunicacionais.
Do campo sociológico, são caros à proposta metodológica aqui apresentada a
perspectiva identitária não essencialista, mas estratégica e contingencial, pensada por
Stuart Hall (2009) e Avtar Brah (1996); o apontamento, construído por Gayatri Spivak
(2010), sobre a obscuridade e a mudez relegadas àqueles destituídos de poder; assim
como as noções conectadas à Psicologia Social de George Mead (1969) e Erving Goffman
(2002; 2012) a respeito dos gerenciamentos de si em meio aos constrangimentos das
estruturas, dos papeis sociais e das microssituações do cotidiano. Se muitos destes
panoramas teóricos já percebem os sistemas sociais a partir da discussão racial e de
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gênero, outros, embora contribuam com suas percepções generalistas sobre o todo social,
podem ser repensados e reparados sob a égide destas problemáticas e de outras
subalternidades.
Do mesmo modo, o olhar etnográfico da Antropologia Social é relevante para as
pesquisas em Comunicação, uma vez que propicia análises aprofundadas sobre as
realidades culturais e interacionais dos grupos, suas vivências, artefatos e definições
identitárias (DOUGLAS, 2002; HINE, 2000). No entanto, o diálogo com esta
metodologia não omite sua história de “racismo epistêmico” (GROSFOGUEL, 2016),
colocando culturas e indivíduos não-brancos sempre como aqueles que deveriam ser
estudados, isto é, “meros objetos de estudos ou incapazes de produzir conhecimento
acerca de sua experiência social” (AKOTIRENE, 2014, p. 30). Reivindicar o papel de
sujeito do esforço epistemológico e não apenas a representação do corpo para análises
embranquecidas é construir conhecimento a partir de experiências pessoais e vividas
subjetivamente, assimilando-as ao processo de análise científica: princípio fundamental
da epistemologia feminista negra de Collins (2002).
Assim, na proposta de uma etnografia interseccional, há o momento necessário de
demarcação do locus de enunciação ou lugar de fala do pesquisador, questionando os
limites da trajetória pessoal que podem regular os resultados das suas análises. Essa
marcação é fundamental para a construção de uma metodologia baseada em princípios
decoloniais (FAUSTINO, 2013), pois assinala o lugar ocupado pelo sujeito pesquisador
em vez de considerá-lo, como acontece historicamente, um sujeito universal: “Não se
trataria de afirmar as experiências individuais, mas de entender como o lugar social que
certos grupos ocupam restringem oportunidades” (RIBEIRO, 2019, p.61). Além disso, se
é essencial demarcar pontos de partida analíticos, é imprescindível acionar prioridade a
vozes antes silenciadas no campo acadêmico e científico, construindo caminhos para
conter o histórico epistemicídio atrelado às narrativas de indivíduos racializados
.
Constituída nos estudos linguísticos, a Análise do Discurso, por sua vez, sobretudo
aquela de vertente francesa, já é antiga aliada nas pesquisas em Comunicação
Novamente, é preciso demarcar que se leva em conta aqui a proposta original do conceito de
interseccionalidade, entendendo-o como passível de ampliação e não negação ou substituição. A necessária
demarcação do lócus de enunciação do pesquisador, portanto, em diálogo com essa proposição, não nega a
possibilidade de perspectivas críticas advindas de sujeitos diversos nem se coloca como restrita a
perspectivas “identitárias”, mas reconhece os limites interpretativos decorrentes das vivências como
marcações necessárias em resultados de pesquisa. Não há, portanto, nenhuma indicação teórica que restrinja
a aplicação da análise interseccional à militância, embora Crenshaw deixe claro que o seu pensamento,
assim como a base do pensamento feminista negro, sejam oriundos dos movimentos sociais feministas e
antirracistas.
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(MAINGUENEAU, 2001; ORLANDI, 2012; BRANDÃO, 1998; CHARAUDEAU,
2006). Ao se debruçar sobre textos escritos, orais, midiáticos, imagéticos, essa proposta
teórico-metodológica sobre o estudo da língua e das suas manifestações discursivas
pretende não somente identificar as nuances da linguagem, “mas o que há por meio dela:
relações de poder, institucionalização de identidades sociais, processos de inconsciência
ideológica” (MELO, 2009, p. 3), ou seja, a conexão entre a enunciação e o lugar da qual
ela emerge (BRANDÃO, 1998).
A AD, portanto, é cara aos estudos em Comunicação quando oferece aparatos para
as análises, por exemplo, dos silenciamentos, das formações discursivas, dos implícitos e
pressupostos, do ethos e das imagens de si, que se alicerçam no discurso, midiático ou
não, e nas suas materialidades. No entanto, embora fundamentada pelas análises de
contexto social, histórico, político e ideológico, a Análise do Discurso assume somente a
luta de classes (PÊCHEUX, 2006; 1988) como argumento para estas definições
conjunturais na constituição dos sujeitos e dos objetos. Inspirada por ideias marxistas, a
AD admite que o discurso se fundamenta em lógicas de classe, mas negligencia outras
estruturas, como as que são prioritariamente mobilizadas aqui: raça e gênero. Nesse
sentido, se é compreensível esta lacuna ao posicionar quem são os principais
pesquisadores mobilizadores desta teoria, isto é, homens, brancos, do norte global
(MENESES, 2008), pode-se afirmar que esta insuficiência precisa ser reparada.
Nesse sentido, assim como se propõe aqui pensar, principalmente, nestas
perspectivas teóricas agora para a construção de um método interseccional para estudos
em Comunicação, demarca-se aqui que estes diálogos serão em prol de olhares
etnográficos racializados, perspectivas interacionais e identitárias com base em estruturas
de raça e gênero, bem como novos pontos de partida para análises de discursos, sobretudo
alicerçados a marcações raciais, sexuais, de gênero e de outras ordens de opressão. Dentro
dessa perspectiva, o cerne da proposição metodológica reside, também, no
questionamento dos princípios epistemológicos historicamente hegemônicos (SPIVAK,
2010), destacando os “saberes produzidos por grupos que foram subalternizados em
territórios coloniais” (RIBEIRO, 2019, p. 72).
A roleta interseccional: quadro metodológico para pesquisas em Comunicação
A perspectiva metodológica aqui apresentada busca transcender a descrição do
conceito de interseccionalidade e aprofundar o debate ao pensar em operadores analíticos
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e ferramentas epistemológicas para o entendimento das dinâmicas comunicacionais dos
sujeitos e dos objetos. O objetivo fundamental é identificar as marcas, os rastros destas
avenidas de opressão que se revelam nas interações cotidianas, na comunicação midiática
e nas representações discursivas. É mostrar, também, como a comunicação se constrói
também a partir destas estruturas interseccionais. Baseada e completamente atrelada à
iniciativa de Crenshaw (1989), cujo princípio era a busca por igualdade em sistemas
jurídicos, aqui se busca perceber como opressões interseccionais rasuram a subjetividade,
os discursos, os produtos e espaços comunicacionais, e podem ser fundamentais para a
composição dos sujeitos e dos seus comportamentos em interação. Nesse sentido, não se
negligencia aqui o ethos de justiça social, essencial a qualquer aplicação do conceito. A
interseccionalidade em Comunicação serve, portanto, como um aparato para expor
injustiças representacionais e discursivas, propondo ferramentas de equidade.
Se, portanto, a interseccionalidade na Comunicação é um artifício para a busca
por igualdade social, inevitável se fundamentar como um processo comparativo. A
natureza comparativa da análise interseccional é evidente desde a sua concepção, já que
Crenshaw pensa a noção a partir do confronto entre ações e políticas para mulheres
negras, brancas, homens negros e brancos. Sendo assim, em Comunicação, o interesse de
pesquisa também reside nestas relações, compreendendo, por exemplo, por que
determinadas youtubers alcançam mais visibilidade que outras? Por que determinados
produtos midiáticos, como filmes, séries e peças de teatro obtêm mais retorno que outros?
Quais as diferenças representacionais encontradas em textos jornalísticos, campanhas
publicitárias e propagandas governamentais quando se realiza uma análise interseccional
dos grupos sociais ali em destaque? Há diferenças significativas na construção de
personagens fictícios na literatura e no entretenimento audiovisual quando estão
manifestados entrecruzamentos de avenidas de opressão nestes sujeitos? Quais os rastros
interseccionais que se mostram evidentes nestes processos de construção comunicativa e
comportamental?
Importante sinalizar que o conceito de interseccionalidade foi pensado para a
compreensão dos sujeitos e das suas realidades sociais, no entanto, pode-se afirmar que é
possível transpor estas definições conceituais também para análises de objetos. Entende-
se, portanto, que há nos objetos marcadores de subjetividades também impregnados de
estruturas de opressão interseccionais, mesmo que a eles não seja dada, de forma
imediata, uma percepção de autoria ou de posse. Objetos religiosos, vestimentas, artefatos
familiares, aparatos regionalizados etc. são importantes exemplos de como é plausível
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atribuir raça, gênero, classe e sexualidade a peças materiais e, por conseguinte, restringir
sua circulação em decorrência destas atribuições. Sendo assim, é possível realizar
questionamentos interseccionais em Comunicação, tanto para estudos de sujeitos quanto
de objetos, tanto para discursos quanto para espaços, debruçando-se sobre as marcas da
opressão encontradas em seus corpos e materialidades.
Dessa forma, o quadro metodológico proposto é uma tentativa de guiar estes
questionamentos, ao compreender que a análise interseccional em Comunicação necessita
de direcionamentos operacionais para dar conta das complexidades epistemológicas que
surgem quando há cruzamentos identitários na constituição dos sujeitos e das suas
dinâmicas comunicacionais. Reconhece-se, como primeiro fundamento, que estes
entrecruzamentos de experiências não podem ser considerados a partir da percepção de
adição, mas se baseiam na emergência de outro construto identitário que surge a partir
desta combinação. Para mulheres negras, por exemplo, toda a estrutura analítica precisa
ser repensada ou então não será adequada à compreensão das suas vivências. Ou seja, se
a experiência interseccional “é maior que a soma do racismo e do sexismo, qualquer
análise que não leve em conta a interseccionalidade não pode abordar suficientemente a
maneira particular à qual as mulheres negras estão subordinadas (CRENSHAW, 1989, p.
140)
.
As cores e o funcionamento da roleta interseccional
Entende-se a constituição do sujeito subalternizado, atravessado por diversas
avenidas de opressão, a partir da metáfora das cores. Ao tomar o azul, cor primária, como
matéria do racismo, por exemplo, e atribuir ao amarelo o construto do sexismo, mulheres
negras se constituem não como metade amarelo e metade azul, mas como a cor verde. Se
as políticas antirracistas se baseiam nas experiências de homens negros e as teorias
feministas se preocupam com as vivências das mulheres brancas, mulheres negras são um
construto subjetivo apartado, que sofre a fusão dos dois domínios de opressão, mas não é
contemplado por nenhum deles. A cor verde, portanto, é outro universo subjetivo, gerado
a partir das duas cores, fundamentado e constituído por elas, mas que reluz distinto,
singularizado. Ao pensar na ampla gama de cores para cada cruzamento de eixos de
“is greater than the sum of racism and sexism, any analysis that does not take intersectionality into
account cannot sufficiently address the particular manner in which black women are subordinated” (no
original)
13
opressão, é possível entender a complexidade da formação dos sujeitos subalternizados:
embora constituídos pela combinação de duas ou mais “cores de opressão”, estes sujeitos
formam uma cor particular, com demandas únicas e experiências singulares
.
Gênero, raça, classe, deficiência, sexualidade, peso, idade e
geolocalização, portanto, são alguns eixos fundamentais ou “cores primárias” para a
compreensão das subjetividades subalternizadas e das dinâmicas comunicacionais que
surgem sobre elas e a partir delas. Nesse sentido, entende-se que a pesquisa em
Comunicação precisa considerar não somente cada um destes eixos separadamente, como
os cruzamentos e combinações que são essenciais para a composição identitária
diversificada dos sujeitos. Ao considerar estas complexidades, é possível ampliar a gama
de perguntas coerentes para o objeto analisado, entendendo-o em sua heterogeneidade e
completude. Quais são os eixos de opressão que predominam em cada situação? Quais
aqueles que deixam rastros no discurso e no sujeito em análise? Quais cores de opressão
e quais combinações fundamentam o indivíduo em questão? Com o intuito de direcionar
pesquisadores para estas perguntas, propõe-se aqui uma ferramenta metodológica
necessária aos estudos em Comunicação: a roleta interseccional (quadro 1).
Propõe-se aqui a metáfora das cores para o entendimento da roleta interseccional apenas no que tange às
suas características elementares: cores primárias ou puras e cores secundárias, isto é, resultado de junção
de cores puras. Não há, aqui, atribuição de simbologia ou sentidos culturais a estas cores que estariam
relacionados às matrizes de opressão descritas. No entanto, não à toa foi atribuída cores primárias às
categorias raça e gênero, já que estas avenidas identitárias seriam a base para a formação do conceito de
interseccionalidade.
14
Quadro 1: Roleta interseccional como proposta metodológica para estudos em
Comunicação
Fonte: elaboração própria
A roleta interseccional é pensada em prol do direcionamento das perguntas e da
análise dos objetos de pesquisa em Comunicação. A vareta gira à procura do
atravessamento relevante para o sujeito ou situação pesquisada. A cada momento da
pesquisa, essa vareta deve ser acionada pelo pesquisador para que as categorias, se
relevantes, sejam iluminadas. A cada contato da vareta com as hastes, é papel do
pesquisador questionar: essa categoria é fundamental para o entendimento deste objeto?
De que forma essa categoria deixa rastros na materialidade comunicacional? Se não se
evidencia como relevante, quais os rastros também dessa ausência que devem ser
considerados na análise? Sem este giro questionador da roleta interseccional,
possivelmente alguns questionamentos podem ser esquecidos ou negligenciados.
A representação metafórica da roleta é um modo de visualizar tanto as interseções
dos eixos de opressão quanto os resultados que estas conexões trazem para a construção
do sujeito. Aliada à metáfora da combinação das cores, a roleta interseccional mostra que
que as diversas avenidas de opressão, quanto se encontram nos cruzamentos da existência
humana, produzem construtos subjetivos que ainda não estão sendo considerados em toda
a sua complexidade. Mais do que isso, a imagem da roleta, enquanto objeto já consolidado
no imaginário social, é intencional: roletas são associadas a jogos de azar, ao acaso,
amparadas pela imprevisibilidade. Dinâmicas de opressão, como aquelas que acometem
15
indivíduos no âmbito da sexualidade, gênero, raça, peso, idade, geolocalização,
deficiência e classe também são impostas aos indivíduos, que se veem encurralados,
cercados pela violência das suas desvantagens sociais. Não há escolha por viver em
nenhum destes eixos da roleta interseccional, assim como não há escolha no jogo da
roleta, embora, nos dois, o resultado possa ser mortal.
É preciso ressaltar que o objetivo fundamental da roleta interseccional pensada
aqui é fundamentalmente diferente da sua aplicação em outras áreas, como a Psicologia,
por exemplo. O interesse da roleta interseccional em Comunicação não é compreender as
interseções que compõem o sujeito, mas identificar aquelas que são mobilizadas, pelo
sujeito, seus interlocutores, audiência ou aqueles que o acionam na construção dos
enunciados, e que deixam marcas no discurso. Nesse sentido, possivelmente a linguagem
geolocalizada materializada pelos sotaques, por exemplo, pode ser extremamente
iluminada em produtos audiovisuais, mas passar relativamente despercebida em imagens
estáticas. É claro que o sujeito (representado na roleta pela circunferência central) é todo
atravessado pela roleta e toda ela, além da junção com outros fatores, vai ajudar na sua
constituição identitária. No entanto, a situação comunicacional não necessariamente
mobiliza todos os atravessamentos. É papel do pesquisador em Comunicação identificar,
seja com inspirações etnográficas ou a partir de debruçamentos textuais, quais destes
atravessamentos saltam aos olhos.
É claro que é possível pensar na roleta interseccional também para a análise dos
privilégios, o que seria interessante ver como um olhar incomum no campo da
Comunicação. No entanto, a roleta interseccional, vale ressaltar, tem como objetivo
fundamental expor injustiças. Se o estudo dos privilégios tiver como intencionalidade um
escrutínio comparativo das vantagens sociais de determinado grupo em detrimento de
outros, é possível resultar em dados importantes para corroborar com o propósito
essencial da interseccionalidade: a equidade social. Nesse caso, então, utiliza-se um
“negativo” da roleta interseccional, transformando as suas hastes, que antes
representavam eixos de opressão, em eixos de privilégios.
A pesquisa com base na roleta interseccional parece, em primeiro momento, uma
análise fragmentada das estruturas sociais, uma vez que a vareta só consegue tocar uma
haste por vez. No entanto, as hastes que se iluminam não se apagam a cada novo giro,
muito pelo contrário: sua luz, em contato com a luminosidade das outras hastes,
transforma a cor da circunferência, formando um novo sujeito. Sendo assim, se em uma
dada situação é evidente a marcação da mulher negra, as categorias gênero e raça estarão
16
acesas e forjarão sua constituição enquanto sujeito atravessado pela interseccionalidade
destas duas cores de opressão. Se há, ainda, no giro da roleta, outras cores que se
iluminam (como deficiência e classe), sua cor já não será verde, mas será aquela que é
produto da junção destes eixos primários. Desse modo, se o giro da roleta interseccional
é a primeira etapa da pesquisa, a construção do sujeito a partir das hastes iluminadas é a
segunda etapa.
Na segunda etapa da metodologia interseccional de pesquisa, faz-se necessário
pensar em questionamentos relevantes e específicos para cada haste iluminada e suas
conexões, ajudando a construir a silhueta do objeto de análise. Para cada haste, três
domínios fundamentais: a) Formação interseccional-discursiva; b) Ethos interseccional;
e c) Negociações interseccionais. Cada um dos domínios emerge de perspectivas
conceituais consolidadas em outras disciplinas, mas que já são amplamente empregadas
no campo da Comunicação. No entanto, se nestas origens a interseccionalidade não
adquiria o foco coerente com a sua importância, aqui estes conceitos são mobilizados e
ressignificados tendo a interseccionalidade como núcleo fundamental.
a. Formação interseccional-discursiva
A formação discursiva, segundo Michel Foucault (1987), é o sistema normativo-
social que rege os sujeitos em suas performances verbais e comportamentais, ou seja,
“conjunto de regras que permitem formá-los como objetos de um discurso e que
constituem, assim, suas condições de aparecimento histórico” (FOUCAULT, 1987, p.
53). Nesse sentido, admite-se que não há sujeito ou objeto deslocado de uma estrutura
restritiva, que define o que pode ou não ser dito, assim como nenhum dos dois está imune
aos discursos precedentes: “os sujeitos e objetos não existem a priori, são construídos
discursivamente sobre o que se fala sobre eles” (GIACOMONI e VARGAS, 2010, p.
122). Na Análise do Discurso, Pêcheux (1988) se apropria do conceito e confere outras
dimensões ao associá-lo à luta de classes. Na perspectiva de Pêcheux, a formação
discursiva vai ser subordinada à formação ideológica (determinada essencialmente pela
classe), restringindo, assim, o que pode e deve ser dito: “é nas formações discursivas que
opera o assujeitamento, a interpelação do sujeito como sujeito ideológico”
(CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 241).
Se a AD entende a formação discursiva como dependente dos direcionamentos de
classe (com a adoção da formação ideológica), entende-se aqui que há tantas formações
discursivas quanto há estruturas de opressão. Nesse sentido, a classe não se sobrepõe aos
17
outros eixos aqui descritos, mas cada um deles oferece constrangimentos próprios à
existência do sujeito. Na metodologia da roleta interseccional, descrever as formações
discursivas que regem cada eixo de opressão, portanto, é identificar quais são os
imperativos e quais são os silenciamentos aos quais os indivíduos, marcados pelas hastes
iluminadas, estão assujeitados.
Ou seja, se as hastes de gênero, raça e deficiência se iluminam, são perguntas
fundamentais: o que se espera da pessoa racializada em determinado contexto
comunicacional? Por outro lado, o que ela precisa silenciar? Quais são os rastros desses
imperativos e quais as marcas dos silenciamentos raciais na materialidade discursiva? E
o que se espera, no âmbito existencial, comportamental e interacional, da pessoa com
deficiência? Quais são seus “deveres” dentro deste eixo de opressão e quais enunciados
silencia como estratégia de resistência e autenticidade? O mesmo se repete para a haste
do gênero. Ao final destas identificações segmentadas, é crucial realizar a descrição final:
quais as negociações e estratégias identitárias, por exemplo, que mulheres indígenas com
deficiência realizam na interseccionalidade destas opressões?
b. Ethos interseccional
Provindo da retórica, o conceito de ethos resume a imagem de si que o indivíduo
tenta produzir nos discursos, independente dos atributos empíricos do enunciador. Ou
seja: é a silhueta imagética do sujeito construída no e pelo discurso, a partir de suas
estratégias de enunciação. Nesse sentido, a validação desta imagem pelos interlocutores
depende das coerções culturais e sociais de uma determinada época, ou seja, toda imagem
de si (ethos) é ancorada em estereótipos, isto é: “um arsenal de representações coletivas
que determinam, parcialmente, a apresentação de si e sua eficácia em uma determinada
cultura” (CHARAUDEAU E MAINGUENEAU, 2004, p. 221).
A noção de ethos, portanto, é diretamente dependente das formações discursivas
às quais o sujeito está submetido, uma vez que em qualquer enunciação, “o orador enuncia
uma informação, e ao mesmo tempo diz: eu sou isto, eu não sou aquilo” (Roland
BARTHES, 1970, p. 212). Nesse sentido, mesmo sem consciência, o enunciador
incorpora uma aparência no seu discurso a partir do ritmo, escolha das palavras,
argumentos, entonação etc. indicadora de determinados papeis sociais, classe, interesse,
raça, gênero etc. Sendo assim, a construção do ethos é uma competência social mais ou
menos bem sucedida, uma vez que está sujeita à validação dos outros; busca-se, a cada
enunciação, alcançar legitimidade: “é na qualidade de fonte de enunciação que ele se vê
18
revestido de determinadas características que, por ação reflexa, tornam essa enunciação
aceitável ou não (DUCROT, 1987, p. 201).
O conceito de ethos interseccional, portanto, é a tentativa de reconhecer quais as
construções identitárias legítimas em determinados eixos de opressão e de que forma os
sujeitos deixam rastros desta imagem de si nos seus discursos. Mais do que isso, é
relevante perceber não somente os estereótipos atribuídos a cada eixo que podem
constranger as liberdades identitárias dos indivíduos, como também compreender as
negociações, que acontecem nas interações e ressignificam os limites das suas
existências. Por exemplo, no contexto de idosos nordestinos: há uma imagem de si
definida para indivíduos a depender da sua geolocalização? Como esta limitação se traduz
na materialidade discursiva? Além disso, há um modo de falar, de se comportar, de vestir
e de andar que fundamenta as expectativas em torno das idades? De que forma as
representações negociam estes estereótipos? Ao final, como é fundamental nas análises
interseccionais: qual a imagem de si em circulação que conjuga os dois eixos de opressão
e de que forma o objeto analisado se comporta em relação a esta estrutura?
c. Negociações interseccionais
A noção de negociações interseccionais busca identificar, no seio das interações,
quais as nuances comunicacionais que definem as construções discursivas em meio a
determinadas formações interseccionais-discursivas e aos ethos interseccionais em
legitimação. Entende-se aqui, então, que os contatos sociais cotidianos são fonte
indispensável à construção dos sujeitos, isto é, não há uma essência anterior à interação.
A identidade, portanto, é “um processo em que o indivíduo está continuamente se
ajustando com antecedência à situação à qual pertence, e reagindo a ela (MEAD, 1969,
p. 200). Para o sujeito, portanto, o Outro é fundamental para a construção contínua de si,
uma vez que a identidade se constitui no contato social; “ele e seu corpo simplesmente
fornecem o cabide no qual algo de uma construção colaborativa será pendurado por algum
tempo” (GOFFMAN, 2002, p. 231).
Dessa forma, os sujeitos tanto negociam suas identidades a partir das legitimações
dos outros, como constroem noções de si com base nas identificações e diferenças. Isso
é, “as identidades podem funcionar, ao longo de toda a sua história, como pontos de
identificação e apego apenas por causa de sua capacidade para excluir, para deixar de
fora, para transformar o diferente em ‘exterior’, em abjeto” (HALL, 2009, p. 46). Nesse
processo de contínua dependência interacional, portanto, sujeitos subalternizados são
19
constrangidos pelas expectativas dos outros e pelos direcionamentos identitários
condizentes com os eixos de opressão dos quais participam. Suas corporalidades, de uma
forma ou de outra, deixam rastros daquilo que se é: “apesar de um indivíduo poder parar
de falar, não pode parar de se comunicar através da linguagem do corpo; é preciso dizer
ou a coisa certa ou a errada” (GOFFMAN, 2010, p. 45).
Desse modo, dentro de cada formação interseccional-discursiva, diante de cada
eixo de opressão, sujeitos negociam suas imagens de si, seus comportamentos e seus
discursos, numa tentativa de gerenciar as impressões causadas e fazer valer a sua
existência. Assim, é papel do pesquisador questionar: quais as nuances negociadas nos
discursos que rasuram as materialidades comunicacionais? De que forma acontecem os
constrangimentos, os mal-entendidos, as gafes interacionais? No caso, por exemplo, de
um sujeito gordo, homossexual, de classe baixa, quais as negociações percebidas como
forma de construção de resistência? O que é negociado em cada haste das opressões e de
que forma essas negociações se conjugam e se contrapõem na formação de um sujeito
único?
A metodologia da roleta interseccional é, assim, uma tentativa de propor um olhar
epistemológico mais complexo acerca dos sujeitos, dos objetos, dos espaços e das
materialidades comunicacionais, entendendo que a “superinclusão” pode levar a análises
restritas e a “subinclusão” a estudos equivocados e contraproducentes (CRENSHAW,
2002, p. 173-174). Desse modo, entende-se esta proposta também como um manifesto
científico, cujo fundamento primordial é reconhecer a interseccionalidade como
constitutiva de todo o processo analítico. Ou seja, entende-se aqui que qualquer esforço
metodológico deve ser interseccional: o primeiro passo é realizar o giro da roleta para o
próprio pesquisador. O segundo momento, então, é o giro para o objeto analisado. Dessa
forma, é possível deixar evidentes as limitações das interpretações de resultado e evitar,
portanto, as “opacidades das experiências” (BRAH, 1996, p. 21) que fundamentaram, por
muito tempo, o discurso da ciência.
Considerações finais
Este trabalho parte do pressuposto que as análises comunicacionais, tanto no
âmbito das dinâmicas interacionais entre sujeitos quanto dos seus dispositivos, espaços e
produtos, podem produzir resultados mais contundentes quando reconhecem a potência
dos cruzamentos interseccionais para a própria composição dos seus objetos. Nesse
20
sentido, propõe-se aqui uma metodologia própria, intitulada roleta interseccional, que
auxilia na busca por questionamentos relevantes para estudos em Comunicação.
O percurso metodológico da roleta interseccional prevê diversos giros tanto para
o pesquisador quanto para o objeto analisado, inserindo a problemática do locus de
enunciação científico como uma questão cara ao discurso da ciência contemporânea. Se
é importante pensar em modos de alcance mais aprofundados daquilo que é estudado, é
também fundamental localizar quem representa o sujeito que estuda, demarcando a
inevitável subjetividade de toda prática humana. Aqui, as subjetividades e as diferenças
não são rejeitadas, mas compreendidas enquanto potência para a construção do
conhecimento. É no reconhecimento destas subjetividades que reside uma aproximação
objetiva sobre a materialidade analítica.
Os giros da roleta interseccional, portanto, assim como a análise das formações
interseccionais-discursivas, das negociações e do ethos atrelados a cada haste iluminada
na pesquisa, são modos de tentar dar completude à análise comunicacional. Os resultados
de estudos que se direcionam metodologicamente para apenas um eixo de opressão, ou
até mesmo para múltiplos eixos separadamente, não dão conta da magnitude dos seus
objetos de análise. É preciso percorrer todo o trajeto metodológico, tanto dos giros da
roleta quanto da construção colorida dos sujeitos e das suas análises contextuais, para
compreender, de fato, as nuances subjetivas que deixam rastros no discurso e
fundamentam os indivíduos em todas as suas práticas sociais e comunicacionais.
Os estudos em comunicação, portanto, podem considerar a roleta interseccional
como uma representação visual didática para guiar suas análises qualitativas a respeito
dos sujeitos, dos objetos e dos processos comunicacionais. A roleta seria, então, um
estímulo a esforços de reconhecimento de variáveis causais para fenômenos da
comunicação, entendendo que desigualdades sociais podem fundamentar escolhas
discursivas, práticas interacionais e alcances de visibilidade midiática. Pensar sobre estes
fatores, que delimitam os contextos de produção e reconhecimento, é prática cara não
somente aos estudos comunicacionais contemporâneos, como também à construção de
potentes diálogos interdisciplinares. A roleta interseccional pode servir de base para o
destaque e compreensão das múltiplas variáveis que direcionam os fenômenos sociais,
muitas vezes silenciadas em relações de causa e efeito superficiais e descontextualizadas.
Entende-se, contudo, que a proposta metodológica não deve se encerrar neste
primeiro esforço aqui apresentado. A roleta interseccional é um primeiro passo para uma
tentativa de contribuir para o campo da Comunicação, dos Estudos Feministas e dos
21
Direitos Humanos, aguardando que pesquisas subsequentes possam reconhecer lacunas,
indicar novas perspectivas e sugerir caminhos. Espera-se, portanto, que as pesquisas e os
pesquisadores tenham aqui a inspiração elementar para a construção de frutos
epistemológicos relevantes para o estudo da interseccionalidade.
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Intersectional Roulette: methodological proposal for analyses in Communication
Abstract
Recognizing the relevance of the concept of intersectionality as a methodological
tool in the field of Law, this article proposes to articulate and deepen its value in
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studies in Communication. The intersectional method in Communication lacks its
own conceptual apparatus, in dialogue with its origins, so that it does not reduce its
analytical capacity to descriptive studies of the subjects, materialities and their
structures. It is intended, therefore, to build a methodological framework, called
“intersectional roulette”, admitting that the observance of the matrices of
oppression that cross the bodies and the subjects is fundamental for the
understanding of the communicational effects they engender.
Keywords: Intersectionality. Communication. Methodology. Feminism
Ruleta interseccional: propuesta metodológica para el análisis en comunicación
Resumen
Reconociendo la relevancia del concepto de interseccionalidad como herramienta
metodológica en el campo del Derecho, este artículo propone articular y
profundizar su valor en los estudios de Comunicación. El método interseccional en
Comunicación carece de su propio aparato conceptual, en diálogo con sus orígenes,
por lo que no reduce su capacidad analítica a los estudios descriptivos de temas,
materialidades y sus estructuras. Por lo tanto, se pretende construir un marco
metodológico, llamado "ruleta interseccional", admitiendo que la observancia de
las matrices de opresión que cruzan los cuerpos y los sujetos es fundamental para
la comprensión de los efectos comunicacionales que engendran.
Palabras clave: Interseccionalidad. Comunicación. Metodología. Feminismo
Fernanda Carrera
Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal
Fluminense. Professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade
Federal Fluminense e do Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPgEM/UFRN). Líder do grupo de
pesquisa LIDD - Laboratório de Identidades Digitais e Diversidade (UFRJ).
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
E-mail:
ORCID: //orcid.org/0000-0001-5024-0860
INFORMAÇÕES SOBRE O ARTIGO
Resultado de projeto de pesquisa: Não se aplica.
Fontes de financiamento: Não se aplica.
Considerações éticas: Não se aplica.
Declaração de conflito de interesses: Não se aplica.
Apresentação anterior: Não se aplica.
Agradecimentos/Contribuições adicionais: Não se aplica.