Como montar uma tabela de comparação de doenças

  • Camilla Costa (@_camillacosta) e Cecilia Tombesi
  • Da BBC News Brasil em Londres

Será que vai ser possível reunir a família — ou ao menos parte dela — nas festas de fim de ano? Quando exatamente é seguro participar de um evento em meio à pandemia de covid-19?

Com os números de casos e mortes ainda crescendo em todo o mundo e a dificuldade de manter a população em isolamento social, um novo estudo tenta ajudar as pessoas avaliar o risco de cada situação.

Pesquisadores da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), nos Estados Unidos, criaram uma tabela que considera fatores como o uso de máscaras, o tempo de contato com outras pessoas, a ventilação do local, a quantidade de pessoas e até o que elas estão fazendo — falar, cantar, gritar ou permanecer em silêncio.

O artigo original foi publicado no periódico de saúde The BMJ.

"O risco de infecção é determinado por muitos fatores, e todos eles estão conectados", disse à BBC News Brasil Lydia Bourouiba, diretora do Laboratório de dinâmica de fluidos na transmissão de doenças do MIT e uma das autoras do estudo.

"Ainda não há nenhum estudo que determine o risco absoluto de cada atividade, mas, com essa tabela, queremos que as pessoas saibam avaliar o risco relativo de cada situação. Assim elas podem se adaptar."

Por exemplo, se o evento ao qual você foi convidado é um karaokê, em uma sala fechada onde as pessoas estarão gritando e cantando, o melhor a fazer é certificar-se de que poucas pessoas estarão presentes, e ficar o mínimo de tempo possível. Sem esquecer de usar a máscara.

Ou simplesmente sugerir uma reunião com os mesmos amigos em um local aberto, onde seja possível manter uma distância maior e sem música alta — para que não seja necessário gritar.

"Isso é importante porque, se você dá às pessoas uma só regra rigorosa, o que acaba acontecendo na maioria das vezes é que algumas não aplicam a regra, ou aplicam só durante algum tempo. É difícil pedir à população que fique em alerta máximo por meses", opina a pesquisadora.

No artigo, os pesquisadores argumentam que o distanciamento entre um e dois metros entre pessoas como forma de prevenir a infecção pelo Sars-Cov-2 é uma orientação simplista, porque se se baseia em estudos do século 19 sobre como vírus e bactérias se propagariam no ar a partir da fala, da tosse e dos espirros.

Mas isso não quer dizer que essa regra, usada na maioria dos espaços públicos e privados atualmente, deva ser ignorada. É justamente o contrário.

Pesquisas mais recentes mostram que vírus podem se espalhar em gotículas no ar por até seis a oito metros a depender da situação. Por isso, dois metros deve, em alguns casos, ser a distância mínima, não a máxima, a se manter de alguém.

"A regra dos dois metros não considerava o quadro total da exalação de partículas suspensas no ar e de como elas se movem. Hoje sabemos que não é só porque você mantém esses dois metros de distância que está seguro", diz Bourouiba.

Aí entram os outros fatores considerados na tabela, como o tempo que dura o evento — ou o tempo que você permanece nele, em contato com outras pessoas.

Mas o que exatamente seria um tempo curto ou longo? De acordo com a pesquisadora, ainda é difícil responder.

"Alguns órgãos de saúde têm considerado que de 10 a 15 minutos é um tempo curto e, acima disso, um tempo longo. Mas não há justificativa científica para embasar esses números. Por isso, decidimos não incluí-los na tabela", explica.

Da mesma forma, definir se um evento tem ocupação alta ou baixa não depende apenas de quantas pessoas há no local, segundo Bourouiba.

Também é importante saber se elas têm ar fresco suficiente para respirar e estão fora das zonas de respiração uma da outra — ou seja, estão a mais de 25 centímetros de distância da boca e do nariz de alguém que está respirando normalmente.

"Cada pessoa deve ter ao menos 10 a 15 litros de ar fresco por segundo. Nós não temos como calcular isso no dia a dia, mas é uma medida importante para os responsáveis pelos espaços de eventos, restaurantes, escritórios, etc. Eles precisam saber se seus espaços precisarão ser ampliados ou reformados", alerta.

O mais importante, segundo a pesquisadora, é garantir a circulação de ar limpo, de preferência que venha de fora: "Não é suficiente apenas mover o ar, como um ventilador ou um ar-condicionado fazem. É preciso trocá-lo, para diluir as partículas que nós exalamos no ar novo".

Por essa razão é preferível estar em espaços abertos ou com janelas que permitam a circulação do ar. E, mesmo assim, ainda é preciso prestar atenção em como ele circula.

"Se você abre uma janela em um restaurante, por exemplo, mas há uma mesa com clientes ali, o ar novo estará sempre passando por aquelas pessoas e levando possíveis patógenos a outras. Você tem que usar a ventilação natural tendo consciência do fluxo do ar", afirma a pesquisadora do MIT.

Considerar tantos fatores para fazer qualquer atividade, mesmo com a ajuda de uma tabela, é complexo, mas tem se mostrado necessário.

De acordo com os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Covid-19), do IBGE, o número de pessoas rigorosamente isoladas por causa da pandemia no Brasil caiu em cerca de 2 milhões entre a primeira e a segunda semanas de setembro.

Já os que afirmaram ter reduzido o contato, mas continuaram saindo ou recebendo visitas aumentou em 2,5 milhões. Atualmente, 83,2 milhões de brasileiros têm um comportamento flexível quanto ao distanciamento social.

O Brasil tem mais de 147 mil mortes e quase 5 milhões de casos registrados de covid-19. De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), os casos tiveram tendência de estabilidade em patamares altos durante o mês de setembro na média móvel de sete dias — foram registradas mais de 26,4 mil novas infecções por dia.

Segundo Lydia Bourouiba, é preciso ter alguns cuidados básicos em cada situação da tabela:

  • Risco baixo - Tente manter ao menos dois metros de distância de outras pessoas e usar máscara. "Não é porque você está a dois metros que pode tirar a máscara e não é porque está de máscara que pode chegar mais perto. Mas, se tiver que se aproximar rapidamente de alguém, não precisa entrar em pânico, não é o fim do mundo", diz.

  • Risco médio - Seja mais rígido com a regra dos dois metros de distância. Se possível, fique um pouco mais distante, a depender dos outros fatores na situação.

  • Risco alto - Dois metros deve ser a distância mínima a ser mantida de alguém, mas o ideal é ficar ainda mais afastado do que isso, e usando uma máscara de qualidade.

"Sabemos que é complicado, mas tentamos organizar isso de uma forma que possa ser compreendida por todos, desde a família que quer organizar um churrasco até o gerente de um escritório. Porque todos vamos ter que administrar essas situações", afirma a pesquisadora.

  • Clique para assinar o canal da BBC News Brasil no YouTube

Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!

Pule YouTube post, 1Legenda do vídeo, Alerta: Conteúdo de terceiros pode conter publicidade

Final de YouTube post, 1

Pule YouTube post, 2Legenda do vídeo, Alerta: Conteúdo de terceiros pode conter publicidade

Final de YouTube post, 2

Pule YouTube post, 3Legenda do vídeo, Alerta: Conteúdo de terceiros pode conter publicidade

Final de YouTube post, 3