Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos

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    reflexão filosófica? R: Porque pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? 1- Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? 2- Oque queremos pensar quando pensamos isto é qual é o conteúdo ou o sentido do pensamos, dizemos ou fazemos? 3- Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos…

  • 861 palavras | 4 páginas

    filosófica? Resposta: 1) Porque pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos ? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos? 2) O que queremos pensar o que pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou sentido do que pensamos, dizemos e fazemos? 3)Para que pensamos o que pensamos, dizermos o que…

  • 899 palavras | 4 páginas

    reflexão filosófica? 1.Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos? 2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos? 3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos,…

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    organizam a atitude filosófica? Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizemos o dizemos, fazemos o que fazemos? O que queremos pensar quando pensamos o que queremos dizer quando falamos o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos? Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos,…

  • 697 palavras | 3 páginas

    questões que organizam a reflexão filosófica?  Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos?  O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos?  Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos? 12.…

  • 626 palavras | 3 páginas

    grandes conjuntos de perguntas ou questões: Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? O que queremos pensar quando pensamos,o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos? Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos? Essas três questões…

  • 1266 palavras | 6 páginas

    conjuntos de questões: * Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos como pensamos, dizermos o que dizemos e fazermos o que fazemos? * O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos? * Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos,…

  • 8588 palavras | 35 páginas

    Nois , homens ; também pensamos em estar com alguém, em ter alguem para chamar de mô , môzin , princesa, flor, paixão , etc ! Também temos sentimentos ; também nos apaixonamos perdidamente, alguns são sensíveis, outros mais fechados, alguns põe o joelho no chão e pede pra Deus proteger e nunca tirar aquela mulher de seu caminho , uns se declaram, outros sentem calado, uns choram, outros dão risada , mas cada um se expressa de sua unica forma, ama dos seu próprio jeito . Mas todos os…

  • 1082 palavras | 5 páginas

    ou o próprio conhecimento. 7- 1) Por que pensamos o que pensamos,dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos,as razões e as causas para pensarmos o que pensamos,dizermos o que dizermos,fazermos o que fazemos? 2) O que queremos pensar quando pensamos,o que queremos dizer quando falamos,o que queremos fazer quando agimos? Isto é,qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos,dizemos ou fazemos? 3)Para que pensamos o que pensamos,dizemos o que dizemos,fazemos o…

  • 1159 palavras | 5 páginas

    de perguntas ou questões: 1. Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos e fazermos o que fazemos? 2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos? 3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos,…

A reflexão filosófica

A reflexão filosófica é o movimento pelo qual o pensamento volta-se para si mesmo como fonte daquilo que foi pensado. É a concentração mental em que o pensamento busca examinar, compreender e avaliar suas próprias ideias, vontades, desejos e sentimentos.

O exemplo mais conhecido da reflexão filosófica ou da volta do pensamento sobre si mesmo é o do filósofo francês René Descartes (1596-1650). Ele declara que só pode haver filosofia e ciência se pudermos provar que o espírito humano é capaz de conhecer a verdade. Por isso, coloca em dúvida tudo o que recebeu das opiniões de sua sociedade e de seus professores, bem como tudo o que percebe pelos cinco sentidos (as coisas e seu próprio corpo). Como não podemos garantir a existência daquilo que pode ser posto em dúvida, Descartes identifica duvidoso e falso. Assim, afirma ter encontrado a primeira verdade sobre a qual erguerá a filosofia, pois, ao duvidar de tudo, não pode duvidar de que está duvidando. Ora, a dúvida é uma maneira de pensar e, portanto, quem pensa não pode duvidar de que pensa. Por isso, fazendo essa volta do pensamento sobre si mesmo ou a reflexão, escreve ele:

Mas, logo em seguida, notei que, enquanto eu queria assim pensar que tudo era falso, era necessário que eu, que pensava, fosse alguma coisa. E notando que esta verdade, eu penso, logo existo, era tão firme e tão certa que todas as mais extravagantes suposições dos céticos não seriam capazes de abalar, julguei que podia aceitá-la como o primeiro princípio da filosofia que procurava.

DESCARTES, René. Discurso do método. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1962. p. 66.

Observação:

Ver ceticismo no Glossário.

Fim da observação.

LEGENDA: Reconstituição da face de René Descartes por Paul Richer, em 1913. O médico francês baseou-se em um retrato da época do filósofo para descobrir se poderia ser dele um crânio encontrado na Suécia. O procedimento, de certo modo, remete a uma questão cartesiana: como distinguir o duvidoso do falso?

FONTE: Reprodução/Doubleday Publishing Group

A reflexão filosófica é radical, pois vai à raiz do pensamento. Não somos, porém, somente seres pensantes. Somos também seres que agem no mundo, que se relacionam com os outros seres humanos, com os animais, as plantas, as coisas, os fatos e acontecimentos. Exprimimos essas relações tanto por meio da linguagem e dos gestos como por meio de ações, comportamentos e condutas.

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Pensamos, agimos e falamos. A reflexão filosófica se volta para compreender o que se passa em nós nessas relações que mantemos com a realidade circundante. Organiza-se em torno de três grandes conjuntos de questões:

1. Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos?

2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos e fazemos?

3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos?

Essas três questões têm como objetos de indagação o pensamento, a linguagem e a ação, e podem ser resumidas em "O que é pensar?", "O que é falar?" e "O que é agir?". Elas nos conduzem, necessariamente, à seguinte pergunta: o que pensamos, dizemos e fazemos em nossas crenças cotidianas constitui ou não um pensamento verdadeiro, uma linguagem coerente e uma ação dotada de sentido?

Como vimos, a atitude filosófica dirige-se ao mundo das coisas que nos rodeiam e aos seres humanos que nele vivem e com ele se relacionam. É um saber sobre a realidade exterior ao pensamento.

Já a reflexão filosófica se dirige ao pensamento, à linguagem e à ação. São perguntas sobre a capacidade e a finalidade de conhecer, falar e agir próprias dos seres humanos. É um saber sobre a realidade interior aos seres humanos.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora




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1. Escolha outra disciplina que você conheça, exponha que aspectos da realidade ela busca explicar e compare sua utilidade à da filosofia.

2. Pesquise um exemplo da aplicação dos procedimentos fundamentais da filosofia no trabalho de um biólogo.

LEGENDA: Bióloga pesquisa, em 2010, vestígios deixados por uma onça-pintada no Parque Nacional de Guatopo, na Venezuela.

FONTE: Ariana Cubillos/Associated Press/Glow Images

Em síntese

1. O que quer dizer a palavra crítica?

2. O que significa dizer que a filosofia se volta preferencialmente para os momentos de crise?

3. Por que se pergunta "Para que filosofia?", de acordo com o capítulo?

4. O que é e como é a reflexão filosófica? De que modo ela se diferencia da atitude filosófica?

5. Quais são os três conjuntos de questões que organizam a reflexão filosófica?




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Page 3

Diretoria editorial

Lidiane Vivaldini Olo

Gerência editorial

Luiz Tonolli

Editoria de Ciências Humanas

Heloisa Pimentel

Edição

André Albert, Eduardo Guimarães e Regina Gomes

Gerência de produção editorial

Ricardo de Gan Braga

Arte

Andréa Dellamagna (coord. de criação), Erik TS (progr. visual de capa e miolo), Claudio Faustino (coord. e edição), Thatiana Kalaes (assist.), Luiza Oliveira Massucato e Livia Vitta Ribeiro (diagram.)

Revisão

Hélia de Jesus Gonsaga (ger.), Rosângela Muricy (coord.), Ana Paula Chabaribery Malfa, Célia da Silva Carvalho, Claudia Virgilio, Gabriela Macedo de Andrade e Heloísa Schiavo; Brenda Morais e Gabriela Miragaia (estagiárias)

Iconografia

Sílvio Kligin (superv.), Denise Durand Kremer (coord.), Sara Plaça (pesquisa), Cesar Wolf e Fernanda Crevin (tratamento de imagem)



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Nossas crenças costumeiras

Em nossa vida cotidiana, afirmamos, negamos, desejamos, aceitamos ou recusamos coisas, pessoas, situações. Fazemos perguntas, como "Que horas são?", ou "Que dia é hoje?". Dizemos frases, como "Ele está sonhando", ou "Ela ficou maluca". Fazemos afirmações, como "Onde há fumaça há fogo", ou "Não saia na chuva para não se resfriar". Avaliamos coisas e pessoas, dizendo, por exemplo, "Esta casa é mais bonita do que a outra" e "Maria está mais jovem do que Glorinha".

Numa disputa, quando os ânimos estão exaltados, um dos oponentes pode gritar ao outro: "Mentiroso! Eu estava lá e não foi isso o que aconteceu", e alguém, querendo acalmar a briga, pode dizer: "Vamos pôr a cabeça no lugar, cada um seja bem objetivo e diga o que viu, porque assim todos poderão se entender".

Também é comum ouvirmos os pais e amigos dizerem que, quando o assunto é o namorado ou a namorada, não somos capazes de ver as coisas como elas são, que vemos o que ninguém vê e não vemos o que todo mundo está vendo. Dizem que somos "muito subjetivos". Ou, como diz o ditado, que "quem ama o feio, bonito lhe parece".

Frequentemente, quando aprovamos uma pessoa, o que ela diz, como age, dizemos que ela "é legal".

Vejamos um pouco mais de perto o que dizemos em nosso cotidiano.

Quando pergunto "Que horas são?" ou "Que dia é hoje?", minha expectativa é a de que alguém, tendo um relógio ou um calendário, me dê a resposta exata. Em que acredito quando faço a pergunta e aceito a resposta? Acredito que o tempo existe, que ele passa, que pode ser medido em horas e dias, que o que já passou é diferente de agora e o que virá também há de ser diferente deste momento, que o passado pode ser lembrado ou esquecido, e o futuro, desejado ou temido. Assim, uma simples pergunta contém, silenciosamente, várias crenças.

Por que crenças? Porque são coisas ou ideias em que acreditamos sem questionar, que aceitamos porque são óbvias, evidentes. Afinal, quem não sabe que ontem é diferente de amanhã, que o dia tem horas e que elas passam sem cessar?

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Quando digo "ele está sonhando" para me referir a alguém que está acordado e diz ou pensa alguma coisa que julgo impossível ou improvável, tenho igualmente muitas crenças silenciosas: acredito que sonhar é diferente de estar acordado; que, no sonho, o impossível e o improvável se apresentam como possível e provável; e também que o sonho se relaciona com o irreal, enquanto a vigília se relaciona com o que existe realmente. Acredito, portanto, que a realidade existe fora de mim e que posso percebê-la e conhecê-la tal como é; por isso, creio que sei diferenciar realidade de ilusão.

A frase "Ela ficou maluca" contém essas mesmas crenças e mais uma: a de que sabemos diferenciar a saúde mental da loucura; que a sanidade mental se chama razão, que a razão se refere a uma realidade comum a todos, e que maluca é a pessoa que perde a razão e inventa uma realidade existente só para ela.

Quando alguém diz "onde há fumaça há fogo" ou "não saia na chuva para não se resfriar", afirma silenciosamente muitas crenças: acredita que existem relações de causa e efeito entre as coisas; que, se há uma coisa, certamente houve uma causa para ela, ou que essa coisa é causa de alguma outra (o fogo é causa e a fumaça é seu efeito; a chuva é causa do resfriado ou o resfriado é efeito da chuva). Acreditamos, assim, que as coisas, os fatos, as situações se encadeiam em relações de causa e efeito que podem ser conhecidas e, até mesmo, controladas por nós.

Quando dizemos que uma casa é mais bonita do que a outra, ou que Maria está mais jovem do que Glorinha, acreditamos que as coisas, as pessoas, as situações, os fatos podem ser comparados e avaliados, julgados por sua qualidade (bonito, feio, bom, ruim, jovem, velho, engraçado, triste, limpo, sujo) ou por sua quantidade (muito, pouco, mais, menos, maior, menor). Cremos, assim, que as qualidades e as quantidades existem, que podemos conhecê-las e usá-las em nossa vida.

Se disséssemos, por exemplo, que "o Sol é maior do que o vemos", manifestaríamos a crença de que nossa percepção alcança as coisas de modos diferentes: às vezes tais como são em si mesmas (a folha deste livro, bem à nossa frente, é percebida como branca e, de fato, ela o é), outras vezes tais como nos parecem (o Sol, de fato, é maior do que o disco dourado que vemos ao longe). Assim, a percepção dependeria da distância, de nossas condições de visibilidade ou da localização e do movimento dos objetos. Por isso acreditamos que podemos ver as coisas diferentemente do que elas são, mas nem por isso diremos que estamos sonhando ou que ficamos malucos. Acreditamos, também, que essas coisas e nós ocupamos lugares no espaço e, portanto, cremos que este existe, pode ser diferenciado (perto, longe, alto, baixo) e medido (comprimento, largura, altura).

LEGENDA: Fase (1982), coreografia de Anne Teresa de Keersmaeker (1960-), apresentada em Londres, Inglaterra, em 2006. Acreditamos que nossa percepção é capaz de diferenciar objetos de suas sombras, que sombras são causadas pela incidência de luz sobre algo e que o formato e opacidade dessas sombras serão diferentes conforme a intensidade da luz e o ângulo em que esta incide.

FONTE: Tristram Kenton/Lebrecht Music and Arts/Diomedia



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Janela da alma

- Direção de Walter Carvalho e João Jardim. Brasil, 2002.

Ao reunir depoimentos de pessoas que têm algum problema ou deficiência visual, o documentário trata de questões como a apreensão da realidade e a saturação de imagens e aparências no mundo. Entre os entrevistados, estão o escritor português José Saramago (1922-2010), o músico brasileiro Hermeto Pascoal (1936-) e o fotógrafo franco-esloveno Eugen Bavcar (1946-), que é cego.

LEGENDA: O escritor português José Saramago em cena do documentário Janela da alma.

FONTE: Ravina Filmes/Europa Filmes

O turista

- Direção de Florian Henckel von Donnersmarck. Estados Unidos/França/Itália, 2010.

Viajando sozinho, o professor Frank Tupelo se encanta com a bela Elise Clifton-Ward. A princípio, porém, ela se envolve com Frank apenas porque um ex-amante lhe pediu para despistar policiais que o perseguem: o criminoso passou por cirurgias plásticas e deseja que creiam que aquele homem é ele. No entanto, a trama se torna muito mais complexa, e todos revelam não ser o que parecem.

LEGENDA: Elise (Angelina Jolie) e Frank (Johnny Depp), em cena de O turista (2010).

FONTE: Peter Mountain/Columbia/Everett Collection/Keystone Brasil




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A reflexão filosófica

A reflexão filosófica é o movimento pelo qual o pensamento volta-se para si mesmo como fonte daquilo que foi pensado. É a concentração mental em que o pensamento busca examinar, compreender e avaliar suas próprias ideias, vontades, desejos e sentimentos.

O exemplo mais conhecido da reflexão filosófica ou da volta do pensamento sobre si mesmo é o do filósofo francês René Descartes (1596-1650). Ele declara que só pode haver filosofia e ciência se pudermos provar que o espírito humano é capaz de conhecer a verdade. Por isso, coloca em dúvida tudo o que recebeu das opiniões de sua sociedade e de seus professores, bem como tudo o que percebe pelos cinco sentidos (as coisas e seu próprio corpo). Como não podemos garantir a existência daquilo que pode ser posto em dúvida, Descartes identifica duvidoso e falso. Assim, afirma ter encontrado a primeira verdade sobre a qual erguerá a filosofia, pois, ao duvidar de tudo, não pode duvidar de que está duvidando. Ora, a dúvida é uma maneira de pensar e, portanto, quem pensa não pode duvidar de que pensa. Por isso, fazendo essa volta do pensamento sobre si mesmo ou a reflexão, escreve ele:

Mas, logo em seguida, notei que, enquanto eu queria assim pensar que tudo era falso, era necessário que eu, que pensava, fosse alguma coisa. E notando que esta verdade, eu penso, logo existo, era tão firme e tão certa que todas as mais extravagantes suposições dos céticos não seriam capazes de abalar, julguei que podia aceitá-la como o primeiro princípio da filosofia que procurava.

DESCARTES, René. Discurso do método. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1962. p. 66.

Observação:

Ver ceticismo no Glossário.

Fim da observação.

LEGENDA: Reconstituição da face de René Descartes por Paul Richer, em 1913. O médico francês baseou-se em um retrato da época do filósofo para descobrir se poderia ser dele um crânio encontrado na Suécia. O procedimento, de certo modo, remete a uma questão cartesiana: como distinguir o duvidoso do falso?

FONTE: Reprodução/Doubleday Publishing Group

A reflexão filosófica é radical, pois vai à raiz do pensamento. Não somos, porém, somente seres pensantes. Somos também seres que agem no mundo, que se relacionam com os outros seres humanos, com os animais, as plantas, as coisas, os fatos e acontecimentos. Exprimimos essas relações tanto por meio da linguagem e dos gestos como por meio de ações, comportamentos e condutas.

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Pensamos, agimos e falamos. A reflexão filosófica se volta para compreender o que se passa em nós nessas relações que mantemos com a realidade circundante. Organiza-se em torno de três grandes conjuntos de questões:

1. Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos?

2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos e fazemos?

3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos?

Essas três questões têm como objetos de indagação o pensamento, a linguagem e a ação, e podem ser resumidas em "O que é pensar?", "O que é falar?" e "O que é agir?". Elas nos conduzem, necessariamente, à seguinte pergunta: o que pensamos, dizemos e fazemos em nossas crenças cotidianas constitui ou não um pensamento verdadeiro, uma linguagem coerente e uma ação dotada de sentido?

Como vimos, a atitude filosófica dirige-se ao mundo das coisas que nos rodeiam e aos seres humanos que nele vivem e com ele se relacionam. É um saber sobre a realidade exterior ao pensamento.

Já a reflexão filosófica se dirige ao pensamento, à linguagem e à ação. São perguntas sobre a capacidade e a finalidade de conhecer, falar e agir próprias dos seres humanos. É um saber sobre a realidade interior aos seres humanos.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora




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Filosofia: um pensamento sistemático

As indagações fundamentais da atitude filosófica e da reflexão filosófica não se realizam segundo as preferências e opiniões de cada um. A filosofia não é feita de "achismos" nem é pesquisa de opinião à maneira dos meios de comunicação de massa. As indagações filosóficas se realizam de modo sistemático.

Que significa isso? Significa dizer que a filosofia:

- trabalha com enunciados precisos e rigorosos;

- busca encadeamentos lógicos entre os enunciados;

- utiliza conceitos ou ideias obtidos por procedimentos de demonstração e prova;

- exige a fundamentação racional do que é enunciado e pensado.

Somente assim a reflexão filosófica pode fazer com que nossas crenças e opiniões alcancem uma visão crítica de si mesmas. Não se trata de dizer "eu acho que", mas de poder afirmar "eu penso que".

Glossário:

sistema: palavra de origem grega; significa 'um todo cujas partes estão ligadas por relações de concordância interna'. No caso do pensamento, significa um conjunto de ideias internamente articuladas e relacionadas de forma coerente, graças a princípios comuns ou a certas regras e normas de argumentação e demonstração.

Fim do glossário.

O conhecimento filosófico é um trabalho intelectual. É sistemático porque não se contenta em obter respostas para as questões que se apresentam, mas exige que as próprias questões sejam válidas e que as respostas sejam verdadeiras, estejam relacionadas entre si, esclareçam umas às outras, formem conjuntos coerentes de ideias e significações, sejam provadas e demonstradas racionalmente.

Quando alguém diz "Esta é a minha filosofia" ou "Isso é a filosofia de fulana ou de fulano" ou, ainda, "Esta é a filosofia da empresa", engana-se e não se engana ao mesmo tempo. Engana-se, pois imagina que, para "ter uma filosofia", basta possuir um conjunto de ideias e princípios mais ou menos coerentes sobre todas as coisas e pessoas. E não se engana porque, ainda que confusamente, percebe nas ideias e nos princípios uma característica que o leva a dizer que são "uma filosofia". Qual característica? A ligação necessária entre certas ideias e entre certos comportamentos, bem como as relações necessárias entre essas ideias e esses comportamentos. Ou seja, pressente-se que a filosofia opera sistematicamente, com coerência e lógica.



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6. Por que a filosofia é um pensamento sistemático?

7. Explique por que a atividade filosófica é uma análise, uma reflexão e uma crítica.

8. A filosofia tem utilidade? Se sim, qual? Explore o que o texto apresenta e articule-o com a sua posição.

Indicações

Ilha das Flores

- Direção de Jorge Furtado. Brasil, 1989.

Neste curta-metragem, uma ação acidental - jogar fora um tomate comprado - tem consequências não previstas e revela-se muito mais complexa do que aparenta. Por meio de uma sequência sistemática de afirmações racionalmente fundamentadas, o filme expõe mecanismos e problemas da sociedade contemporânea.

LEGENDA: Detalhe do cartaz do filme Ilha das Flores, de Jorge Furtado.

FONTE: Reprodução/Casa de Cinema de Porto Alegre




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3. Com relação à organização social e política: os gregos inventaram não apenas a ciência ou a filosofia, mas também a política. As demais sociedades conheciam e praticavam a autoridade e o governo, mas não a política propriamente dita, porque não separavam o poder político de duas outras formas de autoridade: o poder privado do chefe de família e o poder religioso do sacerdote ou mago. Ou seja, nas sociedades não gregas, o poder e o governo eram exercidos como autoridade absoluta da vontade pessoal e arbitrária de um só homem ou de um pequeno grupo de homens, que possuíam o poder militar, religioso e econômico e decidiam sobre tudo, sem consultar ou se justificar a ninguém.

política: palavra originada do grego pólis, que significa 'cidade organizada por leis e instituições'.

Pode-se dizer que os gregos inventaram a política porque: a) tomavam as decisões com base em discussões e debates públicos e as adotavam ou revogavam por voto em assembleias públicas; b) estabeleceram instituições públicas (tribunais, assembleias, separação entre autoridade do chefe de família e autoridade pública, entre autoridade político-militar e autoridade religiosa); c) sobretudo, criaram a ideia da lei e da justiça como expressões da vontade coletiva pública, e não como imposição da vontade de um só ou de um grupo, em nome de divindades.



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3. A noção de discussão pública das opiniões e ideias. A política estimula um pensamento e um discurso públicos, que sejam ensinados, transmitidos, comunicados e discutidos, e não formulados por seitas de iniciados em mistérios sagrados. A ideia de um pensamento que todos podem compreender, discutir e transmitir é fundamental para a filosofia.

LEGENDA: Concepção artística de como teria sido a cidade de Corinto no século V a.C. A racionalidade na Grécia antiga se manifestava também na arquitetura e no planejamento urbano: a linearidade e a simetria são critérios para a organização do espaço urbano.

FONTE: De Agostini Picture/Getty Images




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Estamira

- Direção de Marcos Prado. Brasil, 2006.

Estamira mora e cata lixo em um aterro sanitário na região metropolitana do Rio de Janeiro. Considerada louca por uns, esquizofrênica por outros, mistura em seus relatos explicações formuladas por sua mitologia particular e contestações às explicações míticas ou não racionais do restante da sociedade.

LEGENDA: Capa do DVD Estamira, documentário de Marcos Prado.

FONTE: Zazen Produções Audiovisuais/Riofilme

O mundo de Sofia

- Escrito por Jostein Gaarder. Companhia das Letras, 2011.

Neste romance, Sofia começa a receber cartas com perguntas misteriosas e surpreendentes. Logo descobre que o remetente é um professor de Filosofia, com quem começa a descobrir os fundamentos e a história dessa disciplina. No entanto, a jovem passa a receber também misteriosos cartões-postais de outro remetente, Albert Knag. O que ele deseja com essa correspondência?

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CAPÍTULO 4: Períodos e campos de investigação da filosofia grega

FONTE: Ana Dantas/Acervo da artista




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método: palavra composta do prefixo grego met ('em direção a') e da palavra grega odós ('caminho'). Método significa 'tomar o bom caminho ou o caminho correto para pensar'.

Fim do glossário.

- A filosofia se volta para as questões humanas no plano da ação, dos comportamentos, das ideias, das crenças, dos valores. Ao buscar a definição das virtudes morais (do indivíduo) e das virtudes políticas (do cidadão), a filosofia toma como objeto central a ética e a política. Cabe a ela encontrar a definição, o conceito ou a essência dessas virtudes, para além da variedade das opiniões.

- Sócrates e Platão introduzem a separação radical entre, de um lado, a opinião e as imagens das coisas (trazidas pelos órgãos dos sentidos, pelos hábitos, pelas tradições, pelos interesses) e, de outro lado, os conceitos ou as ideias. As ideias se referem à essência invisível e verdadeira das coisas e só podem ser alcançadas pelo pensamento puro, que afasta os dados sensoriais, os hábitos, os preconceitos, as opiniões.

Diferentemente dos sofistas, Sócrates e Platão veem as opiniões e as percepções sensoriais como fonte de erro, mentira e falsidade. Elas serviriam apenas para produzir argumentos de persuasão, e não pensamentos verdadeiros.

- A reflexão e o trabalho do pensamento são tomados como uma purificação intelectual que permite ao espírito humano conhecer a verdade invisível, imutável, universal e necessária.

São essas ideias que, de maneira alegórica ou simbólica, encontramos no Mito da Caverna, apresentado no Capítulo 1. Nele, Platão estabelece uma distinção decisiva para toda a história da filosofia e das ciências: a diferença entre o sensível e o inteligível.

O sensível são as imagens das coisas que percebemos por meio da experiência sensorial ou dos órgãos dos sentidos e pela linguagem baseada nesses dados. Por se basear em como as coisas nos aparecem e nos parecem, o sensível não alcança a realidade ou a essência delas. As imagens sensíveis formam a mera opinião - a doxa -, variável de pessoa para pessoa e de situação para situação.

O inteligível é o conhecimento verdadeiro que alcançamos exclusivamente pelo pensamento. São as ideias imateriais de todos os seres ou as essências reais e verdadeiras das coisas. Para Platão, a filosofia é o esforço do pensamento para abandonar o sensível e passar ao inteligível.

LEGENDA: Esculturas de Platão e Sócrates ladeiam a entrada da Academia de Atenas, que se encontrava em reforma em 2015.

FONTE: Yannis Behrakis/Reuters/Latinstock




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Em síntese

1. Liste os principais períodos da filosofia grega, relacionando-os à ideia central de cada um deles.

2. O que é kinésis ou o devir? Por que essa ideia é central no pensamento pré-socrático?

3. Que ensinamentos dos sofistas Sócrates combatia? O que ele propunha em contrapartida?

4. Explique, com suas palavras, o que Sócrates pretendia ao buscar a essência e o conceito das coisas.

5. Sócrates incomodou muitos atenienses e acabou sendo condenado à morte.

a) Por que isso aconteceu?

b) Busque na história um exemplo de outro indivíduo ou movimento perseguido por causas semelhantes.

6. Por que Platão distinguiu entre o sensível e o inteligível? Qual a relação dessa distinção com o Mito da Caverna, que vimos no Capítulo 1?

7. Qual é a classificação das ciências feita por Aristóteles?

8. Tomando como base a classificação aristotélica dos campos da investigação filosófica, como poderiam ser categorizadas a Química e a Agronomia? Justifique.

9. Quais são as principais características do período helenístico?

Indicações

Alexandre



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Page 14

1. os que julgavam fé e razão irreconciliáveis e a fé superior à razão (diziam eles: "Creio porque absurdo");

2. os que julgavam fé e razão conciliáveis, mas subordinavam a razão à fé (diziam: "Creio para compreender");

3. os que julgavam razão e fé irreconciliáveis, mas afirmavam que cada uma delas tem seu campo próprio de conhecimento. Por isso, razão e fé não devem se misturar (a razão se refere a tudo o que concerne à vida temporal das pessoas no mundo; a fé, a tudo o que se refere à salvação da alma e à vida eterna futura).

Filosofia medieval (do século VIII ao século XIV)

Abrange pensadores europeus, muçulmanos e judeus. É o período em que a Igreja romana dominava a Europa, ungia e coroava reis, organizava Cruzadas à chamada Terra Santa e criava, à volta das catedrais, as primeiras universidades ou escolas. A partir do século XII, por ter sido ensinada nas escolas, a filosofia medieval também é conhecida com o nome de escolástica.

LEGENDA: Santa Catarina de Siena (1347-1380), filósofa e teóloga escolástica, em pintura de Domenico Beccafumi de c. 1515. Pinacoteca Nacional de Siena, na Itália.

FONTE: Reprodução/Pinacoteca Nacional de Siena, Toscana, Itália.

A filosofia medieval teve como influências principais Platão (427 a.C.-347 a.C.) e Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.). Porém, os medievais conheciam Platão interpretado pelo filósofo Plotino (205-270), ou seja, o neoplatonismo, e o Aristóteles conservado e traduzido pelos pensadores muçulmanos, particularmente Avicena (980-1037) e Averróis (1126-1198). Essas traduções árabes também foram muito usadas por filósofos judeus como Maimônides (1138-1204), Gersônides (1288-1344) e Crescas (c. 1340-c. 1411), que pacificamente viveram em terras sob domínio muçulmano.

Conservando e discutindo os mesmos problemas que a patrística, a filosofia medieval acrescentou outros. Assim, deu origem à teologia no pensamento cristão, judaico e muçulmano, isto é, à explicação racional das verdades da fé.




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ABC da Astronomia - Heliocentrismo

- Disponível em: //tvescola.mec.gov.br/tve/video/abc-da-astronomia-heliocentrismo. Acesso em: 13 dez. 2015.

Este vídeo apresenta um momento decisivo da história da ciência, entre os séculos XVI e XVII, propiciado pelo pensamento filosófico, e que nele teve muitas repercussões: a ideia de que era a Terra que girava em torno do Sol, e não o contrário.

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CAPÍTULO 6: A transformação da filosofia na contemporaneidade

FONTE: STR News/Reuters/Latinstock

MODERNIDADE EM CRISE

O acidente ocorrido em 1986 em um reator da usina nuclear de Chernobyl simboliza a crise de dois importantes aspectos da modernidade. Por um lado, a crença no progresso proporcionado pela razão e pelos produtos científico-tecnológicos dela originados; por outro, a aposta em ideais políticos revolucionários. A promessa de que a tecnologia caminharia para a perfeição e ofereceria conforto crescente se revelou frágil. Já a promessa de uma sociedade mais justa e igualitária por meio do socialismo também se mostrou sujeita a desvios - as tentativas, por parte da União Soviética, de esconder as graves consequências do acidente foram uma de muitas manifestações dos problemas enfrentados pelo regime. Na fotografia de 2006, as ruínas da cidade de Pripyat, na atual Ucrânia, próximo de onde se localizava a usina.



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cognitivo: palavra originada do latim cognoscere, 'conhecer'. No caso, trata-se dos processos mentais que permitem o conhecimento.

Fim do glossário.

Isso significa: a) que tudo o que pode ser conhecido deve poder ser representado por um conceito ou por uma ideia clara e distinta, demonstrável e necessária, formulada pelo pensamento; b) que a natureza, a sociedade e a política podem ser inteiramente conhecidas pelo sujeito do conhecimento, porque são racionais em si mesmas e propensas a serem representadas pelas ideias do sujeito do conhecimento.

3. Essa concepção da realidade como racional e plenamente captável pelas ideias e conceitos preparou a terceira grande mudança teórica moderna. A natureza, a partir de Galileu (1564-1642), é concebida como um sistema ordenado de causas e efeitos cuja estrutura profunda e invisível é matemática. O "livro do mundo", diz Galileu, "está escrito em caracteres matemáticos, e para lê-lo é preciso conhecer matemática".

Essa ideia deu origem à ciência moderna, para a qual todos os fatos da realidade podem ser conhecidos pelas relações necessárias de causa e efeito mecânicos ou de movimento que os produzem, os conservam ou os destroem. Adotando o ponto de vista da mecânica, a ciência moderna acredita que o movimento segue leis universais necessárias que podem ser explicadas e representadas matematicamente.

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LEGENDA: Os pensadores modernos consideraram que a natureza possuía uma estrutura matemática e que a matemática é a forma perfeita do conhecimento, modelo para a filosofia. Esse lugar dado à matemática pode ser observado nos jardins do Palácio de Versalhes, na França, concebidos no século XVII como perfeição geométrica. Foto de 2013.

FONTE: Toucan Wings/Wikimedia Commons

A realidade é um sistema de causalidades racionais que podem ser conhecidas e transformadas pelo homem. Nascem, assim, a ideia de experimentação científica (são criados os laboratórios) e o ideal tecnológico. Ou seja, cria-se a expectativa de que o ser humano, conhecendo os movimentos das coisas, poderá dominar tecnicamente a natureza, graças à invenção de máquinas.

Existe também a convicção de que a razão humana é capaz de conhecer a origem, as causas e os efeitos das paixões e das emoções humanas. A vontade orientada pela razão permite governá-las e dominá-las, de sorte que a vida ética pode ser plenamente racional.

A mesma convicção orienta o racionalismo político, isto é, a ideia de que a razão é capaz de definir para cada sociedade qual o melhor regime político e como mantê-lo racionalmente.

Os principais filósofos desse período foram: Francis Bacon (1561-1626), Galileu, Hobbes (1588-1679), Gassendi (1592-1655), Descartes (1596-1650), Pascal (1623-1679), Espinosa (1632-1677), Locke (1632-1704), Malebranche (1638-1715), Leibniz (1646-1716), Newton (1643-1727), Berkeley (1685-1753).

Filosofia da Ilustração ou Iluminismo (meados do século XVIII ao início do século XIX)

Esse período também crê nos poderes da razão, chamada de As Luzes (por isso o nome Iluminismo). O Iluminismo afirma que:

- pela razão, o homem pode lutar contra a tirania e conquistar a liberdade e a felicidade social e política;

- a razão é capaz de aperfeiçoamento e progresso, e o homem é um ser perfectível. A perfectibilidade consiste em libertar-se da superstição, do medo e dos preconceitos religiosos, sociais e morais, graças ao avanço das ciências, das artes e da moral;

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- o aperfeiçoamento da razão se realiza pelo progresso das civilizações, que vão das mais atrasadas (também chamadas "primitivas" ou "selvagens") às mais adiantadas e perfeitas (na visão da maioria de seus filósofos, as da Europa ocidental);

- há diferença entre natureza e civilização: a natureza é o reino da necessidade, das leis naturais universais e imutáveis, enquanto a civilização é o reino da liberdade e da finalidade proposta pela vontade livre dos próprios homens em seu aperfeiçoamento moral, técnico e político.

Na natureza, as coisas e os acontecimentos não podem ser diferentes do que são; na civilização, os fatos e os acontecimentos podem ser diferentes do que são porque a vontade humana pode escolher entre alternativas possíveis.

Nesse período há grande interesse pelas ciências que operam com a ideia de transformação progressiva ou de evolução, em especial a biologia. Há igualmente grande interesse e preocupação com as artes, na medida em que elas seriam a expressão por excelência do grau de progresso de uma civilização.

LEGENDA: Folha de rosto do primeiro tomo da Enciclopédia, ou Dicionário das ciências, das artes e dos ofícios (1751-1772), organizada por Diderot e D'Alembert. Os filósofos do Iluminismo francês consideraram possível escrever uma obra que contivesse todas as grandes realizações humanas no pensamento, na moral, na política, nas artes e nas técnicas, e as diferenças entre civilizações.

FONTE: Reprodução/Biblioteca da Universidade de Chicago, EUA.

Data também desse período o interesse pelas bases econômicas da vida social e política. Na reflexão sobre a origem e a forma das riquezas das nações, cria-se uma controvérsia sobre qual é a fonte de maior importância: a agricultura (corrente fisiocrata, de physis, a natureza cultivada pela agricultura) ou o comércio (corrente mercantilista, de mercado).

Os principais filósofos do período foram: Voltaire (1694-1778), Hume (1711-1776), Rousseau (1712-1778), Diderot (1713-1784), D'Alembert (1717-1783), Kant (1724-1804), Fichte (1762-1814) e Schelling (1775-1854).

Boxe complementar:



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A cultura

No século XIX, a filosofia descobre a cultura como o modo próprio e específico da existência dos seres humanos. Os animais são seres naturais; os humanos, seres culturais. A natureza é governada por leis necessárias de causa e efeito; a cultura é a criação humana, o exercício da linguagem e da liberdade.

Por meio do trabalho, os humanos são capazes de transformar a natureza e usá-la para uma vida propriamente humana. Por meio da linguagem, são capazes de comunicar-se e sobretudo de dar permanência e continuidade às experiências humanas. A cultura é a formação coletiva de instituições (como a linguagem, o trabalho, a família, a sociedade, a ética e a política), ideias, símbolos, normas, regras e valores. Isso permite a uma sociedade definir para si mesma o bom e o mau, o belo e o feio, o justo e o injusto, o verdadeiro e o falso, o certo e o errado, o puro e o impuro, o possível e o impossível, o inevitável e o casual, o sagrado e o profano, o espaço (o próximo e o distante) e o tempo (o passado, o presente e o futuro), instituir as crenças e definir a relação com a morte.

A cultura se realiza porque os humanos são capazes de linguagem, trabalho e relação com o tempo. A cultura se manifesta como vida social, como criação das obras de pensamento e de arte, como vida religiosa, vida ética e vida política.

LEGENDA: Celebração do Dia de Finados em Oaxaca, no México, em 2015. Cada cultura cria, a seu modo, sua linguagem, seus mitos e suas crenças, suas obras de pensamento e de arte.

FONTE: Kobby Dagan/Shutterstock

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Para a filosofia do século XIX, de acordo com sua ideia de progresso da humanidade, haveria uma única grande cultura em desenvolvimento, da qual as diferentes culturas seriam fases ou etapas.

Para outros, chamados filósofos românticos, as culturas não formavam uma sequência universal progressiva, mas eram culturas particulares, nacionais. Assim, cabia à filosofia desvendar o "espírito de um povo" conhecendo as origens e as raízes de cada cultura. Para esses filósofos, o mais importante de uma cultura não se encontraria em seu futuro (no seu progresso), mas no seu passado (nas tradições e no folclore nacional).

No entanto, no século XX, ao afirmar que a história é descontínua, a filosofia também afirma que não há "a cultura", mas culturas diferentes. A filosofia contemporânea também rejeita a ideia romântica de que a pluralidade de culturas e as diferenças entre elas se devem à existência da nação, pois a própria ideia de nação é uma criação cultural (foi uma ideia proposta pelas culturas francesa e alemã do século XIX). Cada cultura inventa seu modo de relacionar-se com o espaço e o tempo, de criar sua linguagem, de elaborar seus mitos e suas crenças, de organizar o trabalho e as relações sociais e morais, de criar as obras de pensamento e de arte. Cada uma, em decorrência das condições históricas, geográficas e políticas em que se forma, tem seu modo próprio de organizar o poder e a autoridade, de produzir seus valores.

Em resumo, contra a filosofia da cultura universal, a filosofia do século XX negou que houvesse uma única cultura em progresso e afirmou a existência da pluralidade cultural. Contra a filosofia romântica das culturas nacionais como expressão do "espírito do povo", a filosofia do século XX negou que a nacionalidade fosse causa das culturas (ao contrário: as nacionalidades são efeitos culturais temporários) e afirmou que cada cultura se relaciona com outras e encontra dentro de si seus modos de transformação.

LEGENDA: Indígena do povo Yawalapiti filma cerimônia do Kuarup no Parque Nacional do Xingu, em Gaúcha do Norte (MT), 2012. Cada cultura se relaciona com outras e encontra dentro de si seus modos de transformação.

FONTE: Rogério Reis/Pulsar Imagens




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História e progresso

Como vimos no capítulo anterior, a filosofia moderna experimentou grande otimismo no uso da razão para que o ser humano possa conhecer verdadeiramente a si mesmo e a realidade e garantir para si a liberdade, a felicidade e o aperfeiçoamento.

O século XIX é, na filosofia, o século da descoberta da história ou da historicidade do ser humano, da sociedade, das ciências e das artes. Isso não significa que anteriormente não se escrevessem histórias, porém estas eram tomadas como um aspecto da vida humana entre outros. A mudança de perspectiva ocorre particularmente quando o filósofo alemão Hegel (1770-1831) afirma que a história é a realidade: para ele, a razão, a verdade e os seres humanos são essencial e necessariamente históricos.

Essa concepção levou à ideia de progresso, isto é, de que os seres humanos, as sociedades, as ciências, as artes e as técnicas acumulam conhecimento e práticas, aperfeiçoando-se cada vez mais. Com o progresso, surge a ideia de que o presente é superior e melhor do que o passado, e o futuro será melhor e superior ao presente.

Essa visão otimista também foi desenvolvida na França pelo filósofo Auguste Comte (1798-1857). Fundador da corrente filosófica denominada positivismo, Comte atribuía o progresso ao desenvolvimento das ciências positivas (isto é, sem relação com mitologias, religiões e construções metafísicas). As ciências permitiriam aos seres humanos "saber para prever e prever para prover", de modo que o desenvolvimento social se faria pelo aumento do conhecimento científico e do controle científico da sociedade. É positivista a ideia de "ordem e progresso", que viria a fazer parte da bandeira do Brasil republicano.

No entanto, no século XX, a mesma afirmação de que os seres humanos, a razão e a sociedade são históricos levou à ideia de que a história é descontínua e não progressiva. Por essa perspectiva, cada sociedade tem sua história própria, em vez de ser apenas uma etapa numa história universal das civilizações, como julgara a filosofia do século XIX.

A ideia de progresso passou a ser criticada porque foi usada para legitimar colonialismos e imperialismos - os mais "adiantados" teriam o direito de dominar os mais "atrasados". Passou a ser criticada também a ideia de progresso das ciências e das técnicas, por dois motivos:

1. Pelo entendimento de que os conhecimentos e as práticas têm sentido e valor próprios em cada época e para cada sociedade. Como esses sentidos e valores desaparecem numa época seguinte ou são diferentes numa outra sociedade, não se pode falar em transformação acumulativa e progressiva da humanidade.

2. Pela avaliação do uso da ciência e da técnica pelo nazismo e no episódio do lançamento das bombas atômicas sobre o Japão pelas Forças Armadas dos Estados Unidos. Casos como esses levaram ao questionamento do otimismo racionalista. Essa crítica prosseguiu no final do século passado e continua até hoje com os movimentos ecológicos, que apontam os riscos ao planeta trazidos pelo uso indiscriminado das ciências e das técnicas.

LEGENDA: Cenário da cidade japonesa de Hiroxima, devastada após a bomba lançada pelos Estados Unidos, em 1945. No século XX, a filosofia passou a desconfiar do otimismo científico-tecnológico.

FONTE: Reprodução/Biblioteca do Congresso, Washington, EUA.




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Consequências do pensamento iluminista

- Combate à tirania e busca pela instituição da democracia: as ideias do Iluminismo foram decisivas, por exemplo, para a Revolução Francesa de 1789.

- Crença na possibilidade do uso de meios próprios à civilização para contornar e mesmo vencer as condições previamente dadas pela natureza: o progresso tecnológico seria acelerado com a Revolução Industrial.

- Dominação de outros povos: se, por um lado, cresceu a busca pela liberdade no interior dos países europeus, por outro, usou-se a ideia de "progresso das civilizações" para justificar a dominação de povos africanos e asiáticos.

LEGENDA: Nesta charge de 1882, John Bull, personagem-símbolo da Inglaterra, é representado como um polvo que abraça territórios ao redor do mundo.

FONTE: Coleção Granger/Glow Images

- Crença na evolução: os seres se transformariam em melhores e mais perfeitos.

- Elaboração de teorias econômicas: a economia é uma ciência que explica a origem e as formas da riqueza.

Fim do complemento.

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Filosofia contemporânea

Abrange o pensamento que vai de meados do século XIX aos nossos dias. Esse período, por ser o mais próximo de nós, parece o mais complexo de definir: as diferenças entre as várias posições filosóficas nos parecem muito grandes, pois as estamos vendo surgir diante de nós.

Para facilitar uma visão mais geral do período, faremos, no próximo capítulo, uma contraposição entre as principais ideias do século XIX e as do século XX.

Conexões

Esta atividade trabalha com conteúdos de Filosofia e Sociologia.

Uma das linhas de pensamento da Renascença propunha o ideal do homem como centro do universo. Segundo essa linha, por meio tanto dos conhecimentos como da política, das técnicas e das artes, ele poderia ser o arquiteto de seu próprio destino. Esse ideal, que chegou até nossos dias, tinha como base a razão e a liberdade da vontade.

LEGENDA: A roda da fortuna (c. 1460), xilogravura de autor desconhecido. Inspiração para Maquiavel, a imagem da roda da fortuna - que, ao girar, pode conduzir alguém do alto para baixo - originou-se na Antiguidade e tornou-se popular no período medieval.

FONTE: Biblioteca Britânica, Londres, Inglaterra/The Bridgeman Art Library/Keystone

Para afirmar que o homem faz seu próprio destino, Maquiavel propôs a famosa distinção entre a fortuna (a boa e a má sorte, o acaso) e a virtù (a livre vontade corajosa e prudente). Vejamos o que escreve numa passagem de seu livro O príncipe:

Não ignoro que muitos são e foram de opinião de que as coisas desse mundo são governadas pela sorte [fortuna] e por Deus e que os homens prudentes não se lhes podem opor, e até não têm remédio algum contra elas. Por isso se poderia julgar que não devemos nos incomodar demais com as coisas e deixar-nos governar pela sorte. [...] entretanto, já que nossa livre vontade não desapareceu, julgo possível ser verdade que a fortuna [sorte] seja juiz de metade de nossas ações, mas também deixa em nosso poder a outra metade, ou quase. Comparo a fortuna a um desses rios impetuosos que, quando irritados, alagam as planícies, arrasam as árvores e as casas: todos fogem deles, mas cedem ao seu poder, sem conseguir detê-los em parte alguma. Mesmo assim, nada impede que, voltando a calma, os homens tomem providências, construam barreiras e diques, de modo que quando a cheia se repetir, o rio corra por um canal ou sua força se torne menos livre e prejudicial. O mesmo acontece com a sorte, que mostra sua força onde não encontra uma virtù bem ordenada, pronta a lhe resistir, e volta o seu ímpeto para onde sabe que não foram erguidos diques ou barreiras para dominá-la.

MAQUIAVEL. O príncipe. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 119-120.

1. Em grupo ou individualmente, escolha(m) uma atividade do mundo contemporâneo em que você(s) identifique(m) a presença da razão e da vontade livre. Em seguida, elabore(m) um breve comentário sobre ela e sobre como a razão e a vontade a influenciam.

2. As ideias de razão e de vontade livre influenciaram o pensamento ideológico daqueles que propagam a meritocracia, ou seja, que acreditam que uma vida bem-sucedida depende única e exclusivamente do empenho do indivíduo. Em que aspectos a ideia de fortuna e virtù se aproxima e em que aspectos nega a possibilidade da meritocracia? Busque dar exemplos concretos.



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Leituras filosóficas

O saber e a iluminação divina

Nosso saber consta de coisas que vemos e coisas em que acreditamos; das primeiras, somos testemunhas diretas, das segundas, temos o testemunho idôneo de outros que nos fazem crer porque, por meio de palavras e escritos, nos oferecem sinais dessas coisas que não vemos. Podemos com razão dizer que há saber quando cremos em algo com certeza e dizemos que vemos com a mente essas coisas nas quais cremos, ainda que não estejam presentes aos nossos órgãos dos sentidos [...]. Realmente, a fé vê com a mente [...]. Por isso o apóstolo Pedro diz: "Aquele em quem agora crês, não o vês"; e disse o Senhor: "Bem-aventurados os que não viram e creram". [...] Terás, assim, reconhecido a diferença entre ver com os olhos do corpo e com os olhos da mente [...]. Crer se realiza com a mente e vê com a mente e as coisas em que com essa fé cremos distam do olhar de nossos olhos. Por isso vejo a minha fé, mas não posso ver a tua, assim como tu vês a tua fé e não podes ver a minha, pois ninguém sabe o que se passa no espírito que está em cada homem até que venha o Senhor e ilumine os segredos das trevas e manifeste os pensamentos do coração para que cada um possa ver não somente os seus, mas também os alheios.

SANTO AGOSTINHO. Carta a Paulina. In: FERNÁNDEZ, Clemente (Org.). Los filósofos medievales. Selección de textos. Madri: Editorial Católica, 1979. p. 493-494. Texto traduzido.

LEGENDA: Santo Agostinho, em representação na fachada da catedral de Lichfield, Inglaterra.

FONTE: A. C. Jones/Shutterstock

- Após a leitura do trecho, responda, por escrito, às seguintes questões:

a) Quais são as fontes do saber, de acordo com o autor?

b) Agostinho afirma: "Podemos com razão dizer que há saber quando cremos em algo com certeza e dizemos que vemos com a mente essas coisas nas quais cremos, ainda que não estejam presentes aos nossos órgãos dos sentidos". Em que aspectos esse trecho se aproxima e em que aspectos se distancia do que vimos sobre o pensamento de Sócrates e Platão no Capítulo 4?

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Outra característica marcante da escolástica foi o método por ela inventado para expor as ideias filosóficas, conhecido como disputa: apresentava-se uma tese, que devia ser refutada ou defendida com argumentos tirados da Bíblia, de Aristóteles, de Platão ou de Padres da Igreja.

Assim, uma ideia era considerada uma tese verdadeira ou falsa dependendo da força e da qualidade dos argumentos encontrados nos vários autores. Por causa desse método de disputa, costuma-se dizer que, na Idade Média, o pensamento estava subordinado ao princípio da autoridade. Isto é, uma ideia era considerada verdadeira se tivesse apoio nos argumentos de uma autoridade reconhecida na época.

Filosofia da Renascença (séculos XIV e XV)

É marcada pela descoberta, na Europa ocidental, das obras de Platão e de outras obras de Aristóteles, desconhecidas na Idade Média. Nessa época, muitos também se dedicam a recuperar obras de autores e artistas gregos e romanos e a imitá-los. Por isso o nome Renascimento, isto é, o retorno do pensamento da Antiguidade ocidental. Na filosofia, destacam-se os nomes dos florentinos Marsílio Ficino (1433-1499) e Maquiavel (1469-1527) e do napolitano Giordano Bruno (1548-1600), do inglês Thomas Morus (1478-1535), dos franceses Montaigne (1533-1592) e Bodin (1530-1596), e do holandês Erasmo (1466-1536).

São três as grandes linhas de pensamento que predominavam na Renascença:

1. Aquela proveniente da leitura de três diálogos de Platão (Banquete, Fédon, Fedro), das obras dos filósofos neoplatônicos e da descoberta dos livros de hermetismo ou de magia natural. Supunha-se que estes últimos seriam egípcios e teriam sido ditados por deuses a seus filhos humanos séculos antes de Moisés e de Platão.

Surgida na cidade de Florença (na atual Itália), essa linha de pensamento concebia a natureza como um grande ser vivo, dotado de uma alma universal (a Alma do Mundo) e feito de laços e vínculos secretos de simpatia e antipatia entre todas as coisas, tanto terrestres quanto celestes. O homem, como parte da natureza, poderia agir sobre o mundo por meio de conhecimentos e práticas que operam com essas ligações secretas, isto é, por meio da magia natural, da alquimia e da astrologia.

2. Aquela originária dos pensadores florentinos que valorizavam a vida ativa (a política) e defendiam a liberdade das cidades italianas contra o poderio dos papas e dos imperadores. Esses pensadores recuperavam a ideia de república livre presente nas obras dos grandes autores políticos da Roma antiga, como Cícero (c. 106 a.C.-43 a.C.), Tito Lívio (59 a.C.-17 d.C.) e Tácito (55-120), bem como nos escritos de historiadores e juristas clássicos.

3. Aquela que propunha o ideal do homem como artesão ou arquiteto de seu próprio destino. Isso ocorreria tanto por meio dos conhecimentos (astrologia, magia, alquimia) como por meio da política (o ideal republicano), das técnicas (medicina, arquitetura, engenharia, navegação) e das artes (pintura, escultura, poesia, teatro).

Percebe-se, assim, por que se costuma falar no humanismo como traço predominante da Renascença, uma vez que nela o ser humano é colocado como centro do Universo, defendido em sua liberdade e em seu poder criador e transformador. Enquanto o pensamento medieval tinha seu centro em Deus - teocentrismo - o do Renascimento tinha seu centro no homem - antropocentrismo.

LEGENDA: Em um de seus mais famosos desenhos (c. 1490), Leonardo da Vinci partiu das proporções anatômicas ideais segundo o arquiteto romano Vitrúvio (século I a.C.) para chegar à ideia de que o corpo masculino é matematicamente perfeito pelas proporções racionais entre suas partes. Galeria da Academia, em Veneza, na Itália.

FONTE: Leonardo da vincI/Gallerie dell'Accademia, Veneza

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A intensa atividade teórica e prática dessa época foi alimentada pelas grandes viagens marítimas, que levavam os europeus a conhecer novos mares, novos céus, novas terras e novas gentes, permitindo-lhes ter uma visão crítica de sua própria sociedade. Essa efervescência cultural e política levou a críticas profundas à Igreja romana, que culminaram na Reforma protestante.

Filosofia moderna (do século XVII a meados do século XVIII)

Nesse período, conhecido como o Grande Racionalismo Clássico, foi preciso enfrentar o pessimismo teórico que reinava desde o fim do século XVI. Dominava o ceticismo, a atitude filosófica que duvida da capacidade da razão humana para conhecer a realidade exterior e o ser humano.

Com as guerras de religião decorrentes da Reforma protestante, os encontros dos europeus com povos que desconheciam e as disputas filosóficas e teológicas, o sábio já não podia admitir que a razão humana é capaz de conhecimento verdadeiro nem que a verdade é universal e necessária, isto é, a mesma em todo tempo e lugar. Ao contrário, diante da multiplicidade de opiniões em luta, o sábio tornou-se cético.

Para restaurar o ideal filosófico da possibilidade do conhecimento racional verdadeiro e universal, a filosofia moderna propõe três mudanças teóricas principais:

1. O surgimento do sujeito do conhecimento: em vez de começar pelas coisas a serem conhecidas, sobre as quais só cabem dúvidas e desconfianças, a filosofia deve começar pela reflexão. Ou seja, aquele que conhece (o sujeito do conhecimento) volta-se para si mesmo para saber se é capaz de conhecimento verdadeiro e, se o for, sob quais condições ele é capaz disso. Somente depois de conhecer-se a si mesmo como capaz de conhecimento verdadeiro é que o sujeito se volta para as coisas a conhecer (os objetos do conhecimento).

Boxe complementar:



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As ciências e as técnicas

LEGENDA: Tirinha do personagem Calvin, do cartunista Bill Watterson.

FONTE: Calvin & Hobbes, Bill Watterson © 1987 Watterson / Dist. by Universal Uclick

No século XIX, a filosofia afirmava a confiança plena e total no saber científico e na tecnologia para dominar e controlar a natureza em favor da sociedade e dos indivíduos:

- a Física e a Química, por exemplo, dominando e controlando os processos naturais, aumentariam a capacidade da agricultura e da indústria, o que traria abundância e conforto para todos;

- uma nova ciência, a Sociologia, ofereceria um saber seguro e definitivo sobre o modo de funcionamento das sociedades. Isso permitiria aos seres humanos que organizassem racionalmente o social de modo a evitar revoluções, revoltas e desigualdades;

- outra nova ciência, a Psicologia, ensinaria definitivamente como é e como funciona a psique humana, quais as causas das emoções e dos comportamentos e os meios de controlá-los, de modo que seria possível livrar-nos das angústias, do medo, da loucura;

- seria possível também uma Pedagogia baseada nos conhecimentos científicos. Ela permitiria não só adaptar perfeitamente as crianças às exigências da sociedade, como também educá-las segundo suas vocações e potencialidades psicológicas.

No século XX, contudo, a filosofia passou a desconfiar do otimismo científico-tecnológico do século anterior em virtude de vários acontecimentos: as duas guerras mundiais, o bombardeio de Hiroxima e Nagasaki, o genocídio praticado nos campos de concentração nazistas, o totalitarismo stalinista, as guerras da Coreia, do Vietnã, do Oriente Médio, do Afeganistão, as invasões russas da Hungria, da Polônia e da Tchecoslováquia, as ditaduras sangrentas da América Latina e da África, a devastação de mares, florestas e terras, a poluição do ar, os perigos do consumo de alimentos e remédios cancerígenos, o aumento de distúrbios e sofrimentos mentais, os problemas éticos e políticos surgidos com o desenvolvimento da neurociência e da engenharia genética, etc.

Além disso, as ciências e as técnicas foram incorporadas ao chamado complexo industrial-militar das grandes potências econômicas, que financiam as pesquisas e definem o que deve ser pesquisado e como serão utilizados os resultados. Esse complexo, com poder de vida e morte sobre o planeta, não está submetido a governos nem a associações públicas: ele opera secretamente, segundo seus próprios interesses, desencadeando guerras, ditaduras e violências em toda parte.

Diante desses fatos, um grupo de filósofos alemães, conhecido como Escola de Frankfurt, elaborou a chamada Teoria Crítica. Essa concepção distingue duas formas da razão: a razão instrumental e a razão crítica.

A razão instrumental é a razão técnico-científica, que faz das ciências e das técnicas um meio de intimidação, medo, terror e desespero. A razão crítica, ao contrário, analisa e interpreta os limites e os perigos do pensamento instrumental. Para a razão crítica, as mudanças sociais, políticas e culturais só se realizarão se tiverem como finalidade a emancipação dos humanos, e não as ideias de domínio técnico-científico sobre a natureza, a sociedade e a cultura.



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Em síntese

1. A filosofia está à margem da história ou intimamente ligada a ela? Por quê?

2. A patrística tentou conciliar a religião cristã com ideias da filosofia greco-romana, em especial nas relações entre fé e razão. Para você, essa proposta era coerente? Por quê?

3. Quais eram os grandes temas da filosofia medieval?

4. Resuma as três grandes linhas da filosofia da Renascença e explique por que exprimem o humanismo renascentista.

5. Por que o surgimento do sujeito do conhecimento foi importante para que se superasse o ceticismo na filosofia moderna?

6. De acordo com o texto, como era concebida a natureza na filosofia moderna? Por que essa concepção leva às ideias de experimentação científica e de tecnologia?

7. Consulte a linha do tempo, no final do livro, e identifique os temas abordados por filósofos do período moderno que se relacionem com o que você leu sobre o racionalismo.

8. Por que a filosofia do século XVIII foi denominada As Luzes ou Iluminismo?

9. Quais os principais temas do pensamento iluminista?

10. Consulte a linha do tempo, no final do livro, e identifique os temas abordados por filósofos do período iluminista que se relacionem especificamente com o que você leu sobre o período.

Indicações




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Ponto de partida da filosofia em diferentes épocas

- Filosofia antiga: Natureza.

- Patrística e escolástica: Deus.

- Renascimento: Homem.

- Filosofia moderna: capacidade da razão humana para conhecer.

Fim do complemento.

O ponto de partida é, portanto, o sujeito do conhecimento como consciência de si reflexiva. O sujeito do conhecimento é o intelecto ou a inteligência que, juntamente com a vontade, existe no interior de uma substância espiritual, a alma. A alma é uma substância completamente diferente de uma outra substância, a corpórea, que constitui a natureza do nosso corpo e dos corpos exteriores.

Por isso, para vencer o ceticismo, a filosofia precisa responder às perguntas: "Como a razão ou o entendimento pode conhecer os corpos ou as coisas, que são diferentes dele?"; "Como o espírito pode conhecer a matéria?"; "Como o sujeito espiritual pode conhecer os objetos corporais, o seu próprio corpo e os demais corpos da natureza?".

2. A resposta a essas perguntas constituiu a segunda grande mudança teórica, que diz respeito ao objeto do conhecimento. Para os modernos, as coisas exteriores (a natureza, as instituições sociais e políticas) são conhecidas quando o sujeito do conhecimento as representa intelectualmente. Isso ocorre quando o sujeito as apreende como ideias que dependem apenas das operações cognitivas que ele realiza.

Glossário:



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Os ideais políticos revolucionários

No século XIX, em decorrência do otimismo trazido pelas ideias da razão e do progresso, a filosofia apostou em ideais políticos revolucionários como o anarquismo, o socialismo e o comunismo. Esses ideais criariam, graças à ação política consciente dos explorados e oprimidos, uma sociedade nova.

No entanto, o século XX viu a ascensão dos chamados regimes totalitários (fascismo, nazismo, stalinismo, maoismo) e o fortalecimento das sociedades autoritárias ou ditatoriais (como as da América Latina, das Filipinas e da África). Então, a filosofia também passou a desconfiar do otimismo revolucionário e das utopias e a indagar se os seres humanos, os explorados e dominados serão capazes de criar e manter uma sociedade nova, justa e feliz.

O século XX também viu o crescimento das chamadas burocracias, que dominam as organizações estatais, empresariais, político-partidárias, escolares, hospitalares. Isso levou a filosofia a indagar como os seres humanos poderiam derrubar esse imenso poderio que, secretamente, determina sua vida cotidiana desde o nascimento até a morte.

LEGENDA: Tirinha do cartunista André Dahmer. A forma burocrática dominou diferentes tipos de organização dentro da sociedade.

FONTE: André Dahmer/Acervo do artista



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Alexandria

- Direção de Alejandro Amenábar. Espanha, 2009.

O filme aborda os conflitos entre fé e razão no período em que o cristianismo começa a se disseminar pelo Império Romano. Além de desafiar a opressão às mulheres, a filósofa Hipátia de Alexandria se vê no meio de uma disputa entre religião e filosofia, na qual a intransigência religiosa leva a lutas entre cristãos e judeus e entre cristãos e filósofos pagãos.

LEGENDA: Cena do filme Alexandria, de Alejandro Amenábar, protagonizado por Rachel Weisz.

FONTE: Xavi Giménez/Mod Produções

A tempestade

- Escrito por William Shakespeare, ilustrado e adaptado por Lillo Parra e Jefferson Costa. Nemo, 2012.

Adaptação em quadrinhos para a peça homônima. Após ser deposto por seu próprio irmão e acabar exilado em uma ilha, o duque de Milão planeja sua vingança por meio da magia. O desenrolar da trama mostra os conflitos entre os três aspectos da alma, divisão feita por Platão e retomada por muitos pensadores renascentistas, com a racionalidade triunfando ao final.

FONTE: Reprodução/Ed. Nemo




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De olho na atualidade

1. Você assistiu aos filmes da tetralogia Jogos vorazes? Caso tenha assistido, comente oralmente a análise com seus colegas.

2. Com base na leitura do texto e do capítulo, escreva uma dissertação relacionando democracia, esperança e as formas de poder e controle que as ameaçam na atualidade.

Respostas pessoais.

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Boxe complementar:

O preconceito contra a política

Qualquer discurso sobre a política em nossa época deve começar pelos preconceitos que todos nós, que não somos políticos profissionais, temos contra a política. Nossos preconceitos comuns são, eles próprios, políticos em sentido amplo. Eles não provêm da arrogância dos ilustrados nem do cinismo dos que viram demais e compreenderam de menos. Uma vez que brotam no nosso próprio pensamento, não podemos ignorá-los; e, dado que se referem a realidades inegáveis e refletem fielmente a nossa situação presente precisamente em seus aspectos políticos, não podemos silenciá-los com argumentos. Tais preconceitos não são, porém, juízos. Eles indicam que nos deparamos com uma situação na qual não sabemos, pelo menos não ainda, conduzir-nos politicamente. O perigo é a política vir a desaparecer inteiramente do mundo. Os preconceitos invadem nosso pensamento; jogam o bebê fora junto com a água do banho, confundem a política com aquilo que levaria ao seu próprio fim e apresentam essa catástrofe como algo que é inerente à natureza das coisas e, portanto, inevitável.

Por trás dos nossos preconceitos atuais contra a política estão a esperança e o medo: o medo de que a humanidade se autodestrua por meio da política e dos meios de força que tem hoje à sua disposição; e a esperança, ligada a esse medo, de que a humanidade recobre a razão e livre o mundo não de si própria, mas da política. Um meio de fazê-lo seria a criação de um governo mundial que transformasse o Estado numa máquina administrativa, resolvesse burocraticamente os conflitos políticos e substituísse os exércitos por forças policiais. Essa esperança é, evidentemente, pura utopia enquanto a política for definida no sentido usual, ou seja, como relação entre dominadores e dominados. Tal ponto de vista levaria não à abolição da política, mas a um despotismo de proporções colossais no qual o abismo que separa os governantes dos governados seria gigantesco a ponto de tornar impossível qualquer espécie de rebelião, para não dizer qualquer forma de controle dos governados sobre os governantes. O fato de nenhum indivíduo - nenhum déspota, per se - poder ser identificado nesse governo mundial não mudaria de forma alguma o seu caráter despótico. O governo burocrático, o governo anônimo do burocrata, não é menos despótico porque "ninguém" o exerce. Ao contrário, é ainda mais assustador porque não se pode dirigir a palavra a esse "ninguém" nem reivindicar o que quer que seja.

Mas, se política significa um domínio global em que as pessoas aparecem antes de tudo como seres atuantes que conferem aos assuntos humanos uma permanência que de outra forma não teriam, então essa esperança não é nem um pouco utópica. Há inúmeras situações na história, embora jamais numa escala global, em que a participação ativa das pessoas foi alijada - na forma de tiranias hoje aparentemente obsoletas que soltam as rédeas da vontade de um único homem, ou do totalitarismo moderno, em que os seres humanos são escravizados a serviço de pretensas "forças históricas" e processos superiores e impessoais. A natureza dessa forma de dominação, que num sentido profundo é verdadeiramente apolítica, evidencia-se precisamente na dinâmica que ela mesma gera e que lhe é peculiar; uma dinâmica em que tudo e todos que ontem eram considerados "grandes" podem e devem - para que o movimento conserve o seu impulso - ser hoje relegados ao esquecimento. Não é alívio suficiente para as nossas preocupações sermos compelidos a observar como, nas democracias de massa, por um lado, uma impotência similar se espalha por assim dizer espontaneamente e sem necessidade de terror e, por outro, um processo análogo, autoalimentado, de consumo e esquecimento cria raízes, ainda que no mundo livre, onde não há terror, tais fenômenos se limitem às esferas da economia e da política no sentido restrito da palavra.

ARENDT, Hannah. A promessa da política. Organizado por Jerome Kohn. Tradução de Pedro Jorgensen Jr. Rio de Janeiro: Difel, 2008. p. 148-150.

Fim do complemento. FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora

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