O sonho de fausto é de se comparar a deus

Fausto e Don Juan tornaram-se verdadeiros mitos literários ao longo do tempo. Ambos surgiram no Cristianismo, ou seja, não existem indícios dessas figuras na antiguidade, pois levando em consideração as semelhanças em suas construções, podemos dizer que são caracteres típicos da modernidade. Esses dois ícones da literatura são modernos porque estão numa constante busca de satisfação pessoal, de completude do ser.

De um lado, a representação de uma figura que não se importou em vender sua alma para conquistar poder e conhecimento das coisas. Do outro, aquele que buscou satisfazer seus próprios desejos carnais e egoístas sem pensar nas consequências que traria aos outros. Essas duas figuras marcadas pela rebeldia estão presentes como arquétipo, como pensamento ou como exemplo de transgressão de valores em muitas personagens de A comédia Humana de Balzac. Por esse motivo, abordamos especificamente, nesse tópico, como se articulou o mito de Fausto, para entendermos melhor as formas de pacto presentes na obra de Balzac. Em seguida, abordamos o mito de Don Juan, para chegarmos à variação balzaquiana dessa personagem.

A busca do homem pelo conhecimento e pelo poder é tema central de várias obras ao longo dos séculos, não apenas peças de teatro, mas também romances e contos, e a figura

52 As obras compostas entre 1829 e 1831 são frequentemente colocadas sob o signo de Satã: parece que, por um tempo pelo menos, a obsessão das atividades malditas o leva para o sonho da pureza mística. Antes de conceber a ideia dominante de A Comédia Humana, Balzac esboçou em umas trinta páginas, uma comédia do Diabo.

lendária de Fausto torna-se a mais representativa das personagens na história da literatura, ligada às forças demoníacas. Como abordamos no tópico anterior, a presença do diabo no período pós-Trento foi marcada pelos pactos e bruxarias, e alguns escritores partiram desse momento histórico para criar personagens dispostas a qualquer sacrifício pelo poder: “[...]

tout à l’opposé de celle de Don Juan, l’histoire de Faust s’est développée dans l’anonymat populaire, elle reflète surtout les supertitions de l’époque, démonologie, sorcellerie, pacte, etc”. (BRUNEL, 1999, p. 395). 53

Um dos primeiros Faustos que surge na história é o Jorge Fausto (1509); possivelmente foi a personagem que deu origem à lenda. Havia uma especulação sobre tal indivíduo ter concluído um curso superior em Teologia. Provavelmente ele nunca entrou em uma universidade, porém o que sabemos é que ele acabou herdando esse título de doutor:

É verdade que o livro de registros da Universidade de Heildelberg menciona em 1509 o fato de um tal “Johannes Faust ex Simern” ter obtido uma licenciatura em teologia (s, p. 86-87); mas nosso mágico foi conhecido desde o início como Jorge, e em 1507, segundo a carta de Tritheim, já andava se proclamando “o chefe dos nigromantes”. O mais provável é que Jorge Fausto tenha hoje o título de Doutor somente pelo fato de a história ter ratificado, na posteridade, um tratamento que lhe era dado por cortesia, embora na origem ele o houvesse usado para efeito de propaganda pessoal. (WATT, 1997, p. 24).

Percebemos a partir dessa informação, que não existem dados muito concretos a respeito do homem que deu origem a uma das lendas mais importantes da história da literatura. Todavia, sendo ou não Jorge Fausto o primeiro Fausto histórico, sabemos que a alegoria dessa figura representa muito mais que um doutor em Teologia que fez um pacto com o demônio. Fausto representa a vontade humana de conquistar o poder acima de tudo, o desejo da humanidade pelo conhecimento. Fausto pode ter sido criado como uma simbologia no fim do Renascimento, mas sua figura está tão ligada aos tempos atuais que podemos dizer que ele é contemporâneo:

Mas o Fausto era também uma encarnação das forças novas que impulsionavam a mudança – por exemplo, a ressurreição dos conhecimentos clássicos pelo humanismo renascentista, paralelamente à sua busca de uma ciência mágica –, e por isso conduzia em si mesmo alguns dos interesses da Reforma em relação aos estudos bíblicos e ao alargamento do âmbito do ensino universitário. (WATT, 1997, p. 26).

53 [...] bem oposta àquela de Don Juan, a história de Fausto se desenvolveu no anonimato popular, ela reflete sobretudo as superstições da época, demonologia, bruxaria, pacto, etc.

A alegoria dessa personagem foi tão marcante naquele momento que vários escritores resolveram dar-lhe uma vida literária. O Faustbuch, de Johann Spies, escrito provavelmente em 1587, foi uma extensa obra composta de mais de sessenta capítulos. Há de se destacar que no caso dessa narrativa, existe uma confirmação de que a personagem Johann Faustus era realmente um Doutor em Teologia, que acabou se entregando à nigromancia. Nessa narrativa, o desejo pelo conhecimento é explícito, o protagonista pretende decifrar os mais obscuros segredos da origem humana, e para isso, ele recorre a toda espécie de contato com as forças ocultas. E por cobiçar tanto o que estava além da simples sabedoria humana, Johann Faustus decide firmar o pacto:

Depois de vários encontros e prolongadas negociações, Fausto redigiu o contrato e o assinou com seu próprio sangue. O espírito demoníaco – Mefistófeles – compromete-se a “servir ao Fausto e obedecê-lo em tudo até o dia de sua morte; a dar-lhe “tudo que ele desejar”; e a responder a todas as suas perguntas, sem jamais fugir da verdade (HF, p. 17). Em troca, Fausto aceita que: “vinte e quatro anos após a data do presente documento”, se todos os meus desejos tiverem sido satisfeitos, o Diabo “poderá fazer o que quiser de mim, à sua maneira e conforme sua vontade, apossar-se do meu corpo, alma, carne, sangue e bens”. (WATT, 1997, p. 35)

A presença do espírito de Mefistófeles nas inúmeras versões de Fausto e a mesma forma de pacto podem ser os fatores fundamentais para que, seguidamente, outros escritores, como o próprio Balzac, tenham optado por essas figuras em seus romances. Mefistófeles é o tentador, aquele que propõe a negociação proibida pelas leis morais e divinas. O papel dessa figura é ganhar uma alma para o demônio e, assim, com suas artimanhas, ele consegue persuadir o homem de uma forma tão perspicaz que não há refúgio.

Em Faustbuch, o contrato do pacto ocorre com uma troca bem definida: Mefistófeles oferece tudo o que Fausto deseja e este já propõe o acordo de 24 anos até a consumação do pacto. Seria uma troca justa em virtude de todos os benefícios que Fausto teria. Todos os seus desejos poderão ser realizados, ele terá em suas mãos o que nenhum outro homem possui: a sabedoria sobre todas as coisas e o poder sobre elas.

Contudo, o pactuante não visualiza suas desgraças futuras, pois o que está em jogo é o pacto com o diabo, a troca da alma por dinheiro, poder e conhecimento pleno das coisas. Há nesse caso uma luta do bem – das forças divinas que tentam resgatar a alma – contra o mal – forças ocultas que desejam a queda da alma. Assim como Lucifer que desafiou a Deus e escolheu o caminho do mal, Mefistófeles surge como aquele que também desafia o divino para levar o homem a perder sua alma. No caso de Johann Faustus, logo no final de sua vida há um arrependimento, o que faz com que Mefistófeles entre em seu pensamento impedindo

que ele se entregue a Deus. Todavia, o doutor e professor em Teologia ainda consegue praticar uma boa ação. Mesmo sabendo que sua alma já estaria perdida, Johann Faustus aconselha seus alunos a não fazerem nenhuma espécie de pacto com as forças ocultas, para que assim possam preservar a alma.

Na abordagem que Thinès (1989) realiza a respeito do mito faustiano, ele nos apresenta a importância da manipulação do tentador e sua proximidade de Lúcifer, o anjo decaído, comparando o desejo de Fausto em ter poder com a revolta de Lúcifer contra Deus. Nessa representação, Thinès demonstra que o homem possui, mesmo que no inconsciente, esse desejo de ultrapassar a ordem entre criador e criatura:

L’ambiguïté de Mephisto à l’ordre de la représentation se manisfeste ici selon deux modes opposés et complémentaires. D’une part, il est l’émissaire investi des pouvoirs de son maître, dont il est représentant actif, capable d’initiatives qui dépassent par leur ampleur tous les pouvoirs de l’homme. En lui, les désirs démeusurés de Faust trouvent l’agent susceptible de violer à tout moment les lois de la nature. Celles-ci, nous le verrons, lui résistent toutefois sur un point, que les termes du pacte mettent clairement en évidence. D’autre part, Méphisto apparaît comme la conscience représentée de Lucifer et ce, une fois de plus, en un double sens : premièrement, parce qu’il est la face visible des ténèbres, l’incarnation de l’anti-divinité obscure, l’image palpable de l’invisible au sein de la contingence ; secondement, parce qu’il re-présente dans l’actualité de sa relation avec Faust la révolte immémoriale de Lucifer contre Dieu. (THINÈS, 1989, p.98). 54

Por tais motivos, é inegável que as consequências dessa relação entre homem e diabo podem contribuir para a condenação da alma humana e, assim, notamos que nos textos que se utilizam desses elementos há justamente uma moral cristã sendo apregoada. Primeiramente, porque há a possibilidade de conversão e renúncia do pacto e, depois, pelo fato de Fausto optar pelo ato de bondade para alertar seus seguidores sobre os malefícios de uma decisão precipitada:

O Faustbuch termina repetindo a moral de que “cada cristão deve aprender, mas principalmente aqueles cuja mente é orgulhosa, presunçosa, petulante e

54 A ambiguidade de Mephisto na ordem da representação se manifesta aqui segundo dois modos opostos e complementares. De um lado, ele é o emissário investido dos poderes de seu mestre, do qual ele é representante ativo, capaz de iniciativas que ultrapassam por sua amplitude todos os poderes do homem. Nele, os desejos desmesurados de Fausto encontram o agente susceptível de violar a todo o momento as leis da natureza. Estas, veremos, lhe resistem, todavia, em um ponto, que os termos do pacto colocam claramente em evidência. Por outro lado, Mephisto aparece como a consciência representada de Lúcifer e, uma vez mais, em duplo sentido: Primeiro, porque ele é a face visível das trevas, a encarnação da anti-divindade obscura, a imagem palpável do invisível no seio da contingência; segundo, porque ele re-presenta na atualidade de sua relação com Fausto a revolta imemoriável de Lúcifer contra Deus.

obstinada, a temer a Deus, a fugir da feitiçaria e de outras obras diabólicas, aquelas que Deus mais severamente proibiu”. (WATT, 1997, p. 37).

Entendemos que essa moral está vinculada a praticamente todas as versões faustianas. A questão da condenação é recorrente nessas narrativas em que a ordem é estabelecida somente com a renúncia ao pacto. Conduzido pelas leis da Igreja predominantes na época, o indivíduo passa a temer o que acontecerá com sua alma e prefere se redimir. Fausto não era ligado a nenhuma religião e, por isso, assume o pacto sem pensar nas consequências, mas depois percebe que está prestes a perder sua alma e sua vida.

Assim, a história do homem que pactuou com o demônio em troca de poder foi ganhando força ao longo do tempo, não apenas pela questão da condenação da alma, mas, sobretudo, porque esse indivíduo pertence à esfera da modernidade. Aqueles que não se conformam com o banal da vida e buscam sempre mais, desafiando até mesmo a ordem do sobrenatural correspondem a esse caractere moderno.

Nessa perspectiva, em meados do século XVII, o escritor Marlowe também deu sua contribuição para a perpetuação do mito faustiano. Na peça de Marlowe haverá igualmente o posicionamento de que é necessária a redenção. Nessa peça, há uma sugestão direta de que é essencial a volta para o estado primitivo em que Deus colocou o homem, ou seja, aquele que compactua com o diabo terá como fim a queda infernal, a morte da alma, mas aquele que, mesmo no final, volta-se para Deus e se arrepende, ganha a salvação:

No Faust Book o pacto com o Diabo expressa claramente um orgulho severo dos que não estão contentes “com aquela vocação para a qual Deus os havia chamado” (S, p. 142); o momento em que o texto de Marlowe mais se aproxima dessa advertência ortodoxa dirigida ao indivíduo que tenta melhorar sua própria na ordem social é quando o coro conclui a peça com uma reflexão, a de que a queda “infernal” do Fausto deveria servir para que a pessoa sábia fique de sobreaviso em relação ao tipo de conhecimento que ignora a lei, “cuja profundidade impele os temerários / a fazer mais do que as forças do céu consentem” (Epílogo, versos 7-8). (WATT, 1997, p. 48)

As histórias de Fausto apresentam uma moral punitiva, aquele que não segue o que é justo segundo as normas divinas ganhará o inferno como castigo supremo. Mesmo com as diferenças quanto à proposição de cada um dos enredos, os desfechos possuem semelhanças bem marcadas. Nota-se na peça de Marlowe que o coro é responsável pelo canto dessa moral, na maioria das versões esse procedimento se repete – o coro assume o papel das reflexões e introduz a moral.

Além disso, analisando as recorrências primeiras da necessidade de firmar o pacto, constata-se que: « Le thème de la volonté de puissance faustienne acquiert de la sorte une

dimension qui transcende les objectifs historiques concrets dont on n’a cessé d’affirmer qu’ils étaient les seuls que le pactiseur s’évertuait à porsuivre. »55 (THINÈS, 1989, p.11).

Os objetivos históricos estariam relacionados ao conhecimento, sobretudo sobre magia e mistérios sobre o céu e a terra. Associada a esses desejos, a vontade humana pelo poder prevalece, mas como se daria esse tão esperado poder? Fausto não receberia um poder capaz de fazer o que ele quer, pois isso poderia colocar em risco os planos do próprio Mefistófeles:

« [...] si Faust acquiert par le pacte un pouvoir quelconque, celui-ci est nécessairement mondain. [...] La volonté de puissance trouve donc dans sa limitation même de la durée mondaine, la condition essencielle de son accomplissement plénier.» 56 (THINÈS, 1989, p.

157). Então, o poder recebido estaria relacionado a aspectos bem simples, bem mundanos, que a qualquer momento poderiam ser desfeitos porque a vida humana é finita e, assim, os desejos realizados teriam uma duração rápida, mas satisfatória para aquele que deseja.

Logo, aqueles que assinam o pacto, mesmo alcançando uma realização imediata, efêmera e plena de suas vontades, perdem o que seria mais precioso e definitivo – a salvação da alma. Nesse sentido, a peça de Marlowe apresenta um indivíduo que pratica a magia e ainda assume um pacto com o demônio, o que era iminentemente terrível numa época em que se abominava qualquer tipo de relação com o mal. Contudo, segundo Ian Watt, o ponto central da peça é o individualismo da personagem que possui o objetivo único de conquistar o poder pleno sobre tudo e, por isso, acaba se condenando ao inferno criado por ele próprio:

Fausto é muito especialmente o mito intelectual; quantos terão sido aqueles que, depois do Fausto de Marlowe, e de diferentes maneiras, “prepararam suas mentes para alcançar a divindade”, tornando-se aptos a perceber as expectativas que brotam daquele livro? Nesse tocante, o Fausto de Marlowe pode continuar a ser visto como a imagem fundadora de um dos pressupostos básicos, ainda que irreal, do individualismo secular moderno. Esse individualismo sustentava algumas das aspirações transcendentais do Renascimento, e também da Reforma, mas não era capaz de encontrar nem de criar um mundo no qual elas pudessem realizar-se; só a arte mágica saberia fazê-lo. (WATT, 1997, p. 52).

Assim, o que permanece de mais essencial no mito faustiano é a queda do homem diante dos seus incontroláveis desejos e vontade de poder, essa necessidade de completude e a rebeldia diante das morais impostas foi o que possibilitou ser uma obra tão revisitada durante

55 O tema da vontade de poder faustiana adquire dessa forma uma dimensão que transcende os objetivos históricos concretos dos quais sempre se afirmou que eram os únicos que o pactuador se esforçava em perseguir. 56 Se Fausto adquire pelo pacto um poder qualquer, este é necessariamente mundano. [...] A vontade de poder encontra então em sua própria limitação da duração mundana, a condição essencial de sua realização plena.

séculos. Dentre as narrativas posteriores que desenvolveram essa temática, cabe destacar a de Goethe, dividida em duas partes – a mais célebre foi escrita em 1808.

O Fausto de Goethe é um poema narrativo de dimensões épicas, que também traz a história de um cientista que fez um pacto com Mefistófeles. Essa figura representa o anseio de ultrapassar a ordem, o desejo pelo conhecimento. A força e a emergência desses anseios são motivos essenciais para que o pacto seja firmado:

Goethe trabalhou no Fausto quase durante sessenta anos: [...] ou seja, quase todo o tempo que durou a sua carreira literária. Trata-se de uma circunstância única, que explica em boa medida tanto as dificuldades da obra quanto a variedade de tratamento que nela recebe a lenda faustiana. (WATT, 1997, 197).

O Fausto de Goethe, portanto, tem pouca semelhança com o Doutor Fausto de Marlowe. Não experimenta nenhum fascínio pela magia; não sente nenhum desejo de alcançar a condição de semi-deus que a magia pode proporcionar. (WATT, 1997, p. 199).

A obra de Goethe representa uma das mais importantes variações para a representação do mito de Fausto, de todas as versões é sem dúvida a mais lembrada pelos leitores e críticos. Uma das explicações seria o empenho do autor em fazer com que cada detalhe fosse colocado no drama. A peça de Goethe foi construída com um trabalho árduo, em virtude do desejo do escritor em fazer com que ela fosse única, perfeita em termos estéticos. O trabalho de uma vida só poderia ser consagrado com uma das obras-primas da Literatura.

O protagonista Fausto é um sujeito irônico que deseja mais do que poderia ter. O encontro com Mefistófeles ocorre nesse tom sarcástico em que a vida é leiloada pela ambição humana:

Mefistófeles: Como pode arrebatar-te tão calorosamente assim na tua oratória? Qualquer farrapo de papel sempre serve. Tu assinas com uma gotinha de sangue.

Fausto: Se isto te dá plena satisfação, cumprirei esta mera formalidade. Mefistófeles: Sangue é um suco todo especial. (GOETHE, 1964, p. 68).

A ironia diante das expressões usadas para firmar o pacto (“gotinha de sangue” que seria uma mera formalidade para eles e o sangue sendo considerado um “suco todo especial”) mostra que a personagem não estaria preocupada com as condições propostas pelo tentador. De modo totalmente blasfemo, tentador e pactuante brincam com a vida (sangue) e com o sagrado (pacto): « En signant le pacte que lui propose Méphisto – même sous la forme

l’exercice de sa volonté de puissance. »57 (THINÈS, 1989, p.158). Assinar o contrato que lhe

daria fácil acesso a todos os desejos mundanos, compilava com a condição de que a personagem também teria que assinar o seu fim. E pensando na articulação do pacto em Balzac, percebemos que o mesmo ocorre com Raphaël de Valentin em La peau de chagrin.

Assim, desejando ter conhecimento e realizar prazeres físicos, o cientista Fausto prefere condenar sua vida, pelo poder que vai possuir. Nessa narrativa, as questões relacionadas a Deus demonstram que Fausto gostaria de ser ouvido pelas forças celestiais, ele deseja buscar o que é divino, mas a sua fraqueza o impossibilita de ter esse contato e, por isso, o pacto com Mefistófeles torna-se o meio mais fácil, para que ele possa conquistar o que quer. Quando indagado por Margarida, sua amante, sobre sua crença em Deus, Fausto desconversa e prefere não responder diretamente qual é a sua fé58, trazendo uma resposta que

demonstra sua natureza ambivalente:

Margarida: Não tens ido há muito tempo à missa nem ao confessionário. Crês em Deus?

Fausto: Minha querida, quem ousaria dizer: Creio em Deus? Podes ao padre ou ao sábio perguntar e a sua resposta parecerá apenas uma zombaria a quem perguntou. (GOETHE, 1964, p. 135).

Margarida questiona Fausto sem saber que ele já havia assinado o pacto. Para ele, é indiferente a crença em alguma coisa, uma vez que a personagem já realizara um negócio obscuro, sem conhecer necessariamente as consequências. Margarida seria, pois, aquela que poderia resgatar a alma de Fausto pela sua fé. E é interessante notar que nessa primeira parte do Fausto de Goethe há toda uma relação em torno de Margarida e de Fausto, como se fosse um drama familiar. Eles são o centro da história.

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